[Des]Aprender / Scott Matthew

Chama-se “Unlearned”, porque Scott Matthew quis que as pessoas esquecessem as canções originais para melhor compreenderem estas novas versões. Ainda que se reconheçam as palavras, a forma de cantar do músico australiano faz-nos perceber que este é um mundo onde vamos ter de escutar para aprender.

O seu mais recente trabalho chama-se “Unlearned”. Disse que era como se retirasse o apreendido da cabeça; é preciso esquecer a habitual forma de fazer as coisas, para se poder reaprender uma nova maneira. Teve de desaprender alguma coisa para fazer este trabalho?
O processo de reinterpretar as canções e a forma de as fazer implicou algum desaprender da minha parte. Depois das canções ‘despidas’ dos seus arranjos originais e encontrados novos arranjos, gravá-las foi quase como fazer o meu álbum anterior. Mas este processo de desaprender é também para o ouvinte.

É por isso que estas canções soam como novas? Até diferentes das habituais covers?
Algumas ficaram muito diferentes, outras são quase como que uma homenagem a algumas destas grandes canções. Mas o ouvinte tem sempre de abandonar a ideia preconcebida relativamente a um destes artistas e a estas canções.

É habitual incluir covers no alinhamento dos seus concertos. Isso foi uma das razões que o levou a fazer este trabalho?
Sempre quis fazer um álbum só de covers, mas sentia que precisava de esperar pelo momento certo. Ou seja, depois de provar que seria capaz de fazer o meu próprio trabalho de originais. E, sim, alguma destas canções foram já tocadas em concertos, porque estas músicas são, de alguma forma, uma espécie de registo no tempo das minhas influências, porque eram tocadas pelos meus pais e agora pelos mais jovens.

Foi difícil escolher apenas estas 14 – mais 4 disponíveis no álbum digital?
Comecei com uma lista bem grande mas, obviamente, não era possível gravá-los a todos. Com o tempo e ao longo dos ensaios, fomos percebendo que algumas destas canções eram mais sólidas: mais bem-formuldas e reais. Começamos por trabalhar essas canções antes de entrar em estúdio, mas os arranjos posteriores acabaram por alterar a forma de as tocar e cantar. Novas ideias foram sendo acrescentadas e outras retiradas.

Qual foi a mais difícil de trabalhar? Houve alguma altura em que pensou: “Gostava de cantar esta como no original”?
Não, porque nunca tive a intenção de imitar o original. As mais difíceis, para mim, foram as canções mais minimalistas, porque precisavam de ter uma vocalização muito forte, quase perfeita, porque havia muito pouco que pudesse ‘disfarçar’ as falhas. Eu só queria fazer a melhor vocalização e interpretação, atendendo às circunstâncias, e não considerando o original.

Referiu numa entrevista que as três canções da sua vida eram: “Well In Wonder”, de The Smiths; “In This Hole”, de Cat Power; e “Like Someone in Love”, a versão de Chet Baker. No entanto, nenhuma delas faz parte deste álbum.
Escolhi uma canção do Morrisey – “There’s a Place in Hell For Me and My Friends” – porque é uma canção muito especial para um amigo meu. Cat Power já tinha feito uma cover da sua própria canção e a Björk cantou Chet Baker… Mas gostava muito de cantar jazz no futuro.

Apesar dos diferentes backgrounds destes artistas e da diversidade das canções, conseguiu fazer um álbum que soa a Scott Matthew, como se fosse a primeira vez que elas fossem tocadas. Foi difícil criar novos arranjos para transmitir esta originalidade?
Não, o processo foi muito orgânico. Ajudou muito o facto de os meus amigos serem músicos o que facilitou, e muito, todo estes processo. Por isso, acabou por não precisarmos de muito tempo para o fazer.

Descreve-se a si próprio como um “fazedor de ruído calmo”. Mas ruído parece uma coisa negativa…
Percebo o que está a dizer. Quando se descreve algo como ruidosa, não é de uma forma prazerosa. Mas acho que a palavra ‘calma’ faz toda a diferença. Ao afirmar isto, queria dissipar algum tipo de superioridade que poderiam colar naquilo que faço. Fazer música para mim é algo que vem de dentro e não acho que me torne melhor do que os outros ou que seja assim tão profundo. No fundo é um ruído calmo. •