Há 24 anos lançava o seu álbum de estreia com os “Entre Aspas”. Hoje, em 2014, lança todo um “Dia Novo”. Nome de novo álbum e de canção homónima assente num poema de José Luís Peixoto. Viviane está, de novo, no ar.
Em Viviane, neste “Dia Novo” não há margem para qualquer dúvida, é música de raízes bem portuguesas, de matriz nos acordes e arranjos nossos. Ou não andasse a guitarra portuguesa a preencher composições mais travos do fado a dar o mote, e tudo se confirma logo no começo, na música que abre as hostes, em “Do Chiado até ao Cais” que é uma viagem por Lisboa, nas palavras cantadas, pela guitarra conduzida. Vamos ao chiado, ao Cais do Sodré, passamos no Largo Camões, olhamos a Estrela, seguimos Belém, o Rossio, acenamos ao Marquês e quiçá a São Bento, e há encontros com Pessoa, Bocage e Eça. É mergulhar na cultura portuguesa, para que se saiba em que mar estamos. “A plenos pulmões” rumamos para “Dia Novo” que é poesia musicada numa junção perfeita da letra de José Luís Peixoto à voz de Viviane, para no assobio começar o “Recomeçar” de quem parte, na esperança de voltar, deixando cá o seu coração, com esta doce música na mala, o aflorar de um tema atual – emigração – “escrevi este tema porque sou filha de emigrantes e sinto este fenómeno à flor da pele. É dramática a separação da família e das pessoas de quem mais gostamos” (Viviane). E já no “Pomar” (do Pierre Aderne, pois a letra é de sua mão) chega-nos uma surpresa no álbum: “Con toda a palabra“. Uma versão da música da imensa Lhasa de Sela que primeiro estranha-se, pois é música que sempre temos na voz de rouquidão doce e baixa de Lhasa, e depois entranha-se porque Viviane revive a música de forma única, muito sua, numa versão que está longe de ser uma colagem é sim uma palabra, agora, com sons portugueses no ar.
“Trajei-me de branco” porque “Vai mole a manhã“, manhã que tem o som envolvente de um baixo, uma música bem carregada de uma certa sensualidade de ritmo boémio pois a noite foi longa e em que do horizonte desaponta o dia. Estamos a meio deste dia novo e já podemos confirmar que a identidade deste dia é genuinamente portuguesa, é coeso, e a guitarra portuguesa uma constante. “Era a voz que salvava“, com voar até ao México inspirada numa história verdadeira de um fã, no outro lado do Atlântico. Para a paz, eu quero a paz de “A Outra” sempre com ritmo bem demarcado que nos faz, inconscientemente, mover o corpo ao sabor do movimento das notas tocadas e mais uma nova interpretação de uma música de outro autor; agora é Marcelo Camelo, de Los Hermanos, a ser bem visitado por Viviane. À beira do fim do álbum há um “Poema do viúvo jovem” e… chega-nos a única música não cantada na língua de Camões: “Comment te dire adieu“, de Jack Gold, Arnold Galand e Serge Gainsbourg. Neste encerrar do álbum Viviane relembra a sua juventude em França, a região onde cresceu na Provence do sul, e reinterpreta uma versão atual de “Comment te dire adieu” de Serge Gainsbourg, baseada na composição original de Françoise Hardy, de 1968.
“Dia Novo” é um álbum de sonoridade homogénea, seguro de si, carregado de música bem estruturada (quer na melodia quer nos instrumentos) e ritmada, lírica sentida e tudo culmina na voz inconfundível de Viviane, também ela bem segura, amadurecida, no ponto equilibrado para dias novos nos palcos com este novo álbum. Por fim, nota para a edição física do álbum com design muito bem conseguido no retrato de Viviane e na forma como reflete a sonoridade de ritmo sereno do álbum. É álbum a ter de ouvir, é música portuguesa de valor. Bons sons nacionais!
Músicos de “Dia Novo”: Viviane (voz); Tó Viegas (guitarra portuguesa, guitarra acústica, cavaquinho); Rui Freire (bateria); Sónia Cabrita (bateria); Arturo Serra (vibrafone); Xico Santos (contrabaixo); Ruca Rebordão (percussões); Ricardo Parreira (guitarra portuguesa); Bernardo Couto (guitarra portuguesa); Ricardo Martins (guitarra portuguesa); Pedro Gil (guitarra elétrica). Convidados especiais: Zé Eduardo em “Con toda palabra”, “Dia Novo”, “Do Chiado até ao Cais”, “Comment te dire adieu”; Luís Varatojo em “Trajei-me de branco”; Custódio Castelo em “Pomar” e “Recomeçar”; Filipe Valentim em “Era uma voz que salvava”, “Dia Novo”. •