Se foi no Chiado, no Retiro da Severa, que Amália iniciou a sua carreira, foi também no Chiado o começo de uma das mais extraordinárias relações artísticas da história do disco: a de Amália com a Valentim de Carvalho.
Em Março de 1952 Amália vai a Londres, aos estúdios da Electric and Musical Industries Ltd (EMI), na famosa Abbey Road, gravar aqueles que se acreditavam ser, até hoje, os primeiros registos da grande voz do Fado para a editora. Porém, a história revela-se ser outra: “Entretanto, ao descobrir uma prova em acetato com a data de Junho de 1951, confirmei o que o ouvido há muito me dizia: as primeiras bobines da Rua Nova do Almada eram anteriores às gravações londrinas. Foi também no Chiado, numa sala (mais tarde dita da alta fidelidade) do segundo andar da loja da Valentim de Carvalho, que nesse Junho de 1951 se deu o encontro entre a voz de Amália e Hugo Ribeiro, o técnico de som da casa. A diferença de qualidade, mesmo depois do natural envelhecimento das fitas, entre estas gravações e as de Londres é assinalável“, Frederico Santiago (FS). E dizia a própria Amália que “O Hugo Ribeiro é que grava aquela que eu acho que é a minha voz, aquela que eu oiço”. Descobertas preciosas, para a precisão da história de Amália e do Fado.
A Valentim de Carvalhos, desde sempre, não escondeu “a paixão que os ligava à arte de Amália, aliada ao engenho para ultrapassar as dificuldades técnicas, levou Hugo Ribeiro e Rui Valentim de Carvalho a superar os resultados conseguidos em todos os outros estúdios“, FS. Hugo Ribeiro criou no Chiado a distância exacta entre o microfone e a voz de Amália, para que a Voz soasse comme il faut. Imediatamente, nesse primeiro ano, o resultado foi e é notável, quer do ponto de vista técnico como artístico, e até para vós, ouvintes, sentirão o que se fala aqui. Nessas gravações Amália não só grava alguns dos seus “clássicos” de então, como oferece registos algo exóticos no seu repertório. “Rui Valentim de Carvalho possibilitou o uso ilimitado das bobines e a sua preservação, deixando-nos momentos extraordinários que em normais circunstâncias teriam sido apagados. Entre estes registos, alguns viram a sua única edição nos discos de 78 rpm da época; outros seriam apenas editados em 1989 na caixa comemorativa dos 50 anos de carreira de Amália (hoje indisponível); outros, ainda, nunca chegariam a sair, muito provavelmente por duplicarem temas regravados mais tarde” (FS).
Esta edição – a ser editada a 24 de novembro – que, para os amantes do Fado e da maior Voz do Fado é obrigatória, reúne pela primeira vez as gravações de Amália na Loja do Chiado, e inclui alguns inéditos de estúdio, além de numerosas versões nunca publicadas. A ter, a ouvir, a sentir a Voz. •
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