A pretexto do evento lisboeta dedicado a tão venerada substância alimentar, a decorrer entre 9 e 12 de Fevereiro, no Campo Pequeno, acompanhamos a Presidente do Cacau Clube de Portugal, Odete Estêvão, num roteiro guloso pela capital portuguesa com o intuito de dar a conhecer uma mão cheia de espaços diferentes.
Mestres da Hungria e de Inglaterra
O chocolate negro está a reunir cada vez mais apreciadores
Sob uma chuva copiosa, percorremos a Avenida de Roma, em Lisboa, com destino à Socolate, de Bernardo e Armanda Nunes, uma pequena loja com chocolates e tabletes d’além fronteiras e gelados artesanais feitos por um casal italiano que residem em Portugal. As portas estão abertas em Alvalade desde o dia 4 de Abril de 2016, mas a primeira loja foi no Alto dos Moinhos. Tudo porque “somos ambos loucos por chocolate”, confessou Armanda Nunes e como “queríamos ter algo diferente, fomos aos países das marcas que estão aqui, Hungria e Inglaterra”. Da Hungria vem o ChocoMe, “que vimos à venda em Paris e achámos o conceito giríssimo”. A base é feita pelo célebre chocolate da marca francesa Valrhona, rematado com fruta desidratada e “é feito à mão”, acrescentou. Há-os em tablete e em bombom e ambos estão guardados em elegantes caixas que apetece levar para casa, uma a uma.
De terras de Sua Majestade vem, por sua vez, o Artisan du Chocolat, cujas tabletes e os bombons estão em elegantes caixas, conceito que levou Bernardo e Armanda Nunes a irem directamente a Inglaterra, de onde provém também a Conscious – “estes contam a história de uma mãe que se dedicou a fazer chocolates sem açúcar nem lactose” – e o Montezuma’s, a mais recente aposta da Socolate, a visitar de Segunda a Sábado, das 11 às 19 horas, e ao Domingo, das 11 às 14 horas.
Praline ou bombom?
Bombons feitos a partir de chocolate negro, de leite, branco. Quem prova?
Sem mais delongas, prosseguimos viagem até à Leonidas. De origem belga, mas fundada pelo empresário grego Leonidas Kestekides, a marca foi trazida em Portugal pelas mãos de Ricardo Puga, em finais de 2015 (leia o artigo aqui) e, desde então, não mais parou, contando já com quatro espaços em Lisboa e outro tanto na cidade do Porto, um em Espinho, um na Guarda, e um em Coimbra.
Ainda que os bombons continuam a ser bombons, o certo é que para os belgas aqueles são pralines. Mas nada de confundir com o praliné, a pasta de amêndoa e caramelo commumente usada na confeitaria francesa, a qual pode também ser saboreada aqui, entre muitas outras variedades de recheios cobertos de chocolate que compõem duas mãos cheias – e mais houvesse – de bombons todos os dias, das 9.30 às 19.30 horas.
Onde o éclair é uma arte
A delicadeza e o detalhe conquistam o olhar. Os sabores seduzem o palato
Mesmo com o tempo a não dar tréguas, o roteiro pela cidade prosseguiu até ao berço da L’Éclair Patisserie Française, no Saldanha, onde nasceu em 2014. Idealizada pelo jovem visionário Matthieu Croiger, lusodescendente que viveu em Paris e conta com currículo recheado de hotéis de cinco estrelas, a sociedade desta gulosa confeitaria é partilhada por João Henriques, o chef pasteleiro de descendência portuguesa que, neste momento, continua com a colecção de Outono/Inverno. Nas tendências da estação consta o éclair de chocolate com 64 por cento de cacau com a griffe da Valrhona. “Já fizemos com o de 70 por cento e o de 80 por cento, mas mudamos várias vezes o éclair de chocolate negro. E também fazemos macarrons de chocolate com 66 por cento de cacau”, declarou Matthieu Croiger. Uma mudança que incita à prova de diferentes tipos de chocolate amargo “e propõe novas experiências às pessoas”. Mesmo assim são os adultos mais velhos que preferem os produtos feitos a partir de chocolate negro. Em contrapartida, os mais jovens optam pelos que são feitos com chocolate de leite.
Matthieu Croiger e o chef João Henriques, da L’Éclair
Ou seja, “quanto mais amargo, maior é a aceitação por parte dos mais velhos”, enfatizou Matthieu Croiger, para quem esta conduta “tem a ver com a educação, a aprendizagem, e o facto de os mais velhos terem mais memória”, continuou, dando o exemplo do que fazia enquanto, ainda muito jovem, estudava na escola de hotelaria que frequentou em França, onde eram incitados a ir para a floresta descobrir diferentes cheiros, “para educar o palato e abrir portas ao conhecimento”. São estas as razões que levaram a dupla Matthieu Croiger e João Henriques a seguir a exigência da pastelaria francesa posta à prova de Segunda a Sexta, entre as 7.30 e as 20 horas, e de Sábado a Domingo, das 9.30 às 19 horas. Porém, caso o desejo pelo chocolate – e pelos demais éclairs da L’Éclair – seja um imperativo maior, saiba que há L’Éclair no Mercado da Ribeira, desde 2016, e “mais um no futuro”, revelou Matthieu Croiger.
O design também se come
A variedade enche os olhos de quem entra na tão badalada Equador
Rumo ao Chiado, o próximo destino é a Chocolataria Equador, onde Concha Valente, a directora deste espaço em Lisboa, aguarda a nossa visita. No mesmo instante em que entramos somos convidados embarcar numa viagem entre o Hemisfério Sul e o Equador e, assim, conhecer as iguarias de chocolate de origens distintas. Desde as tabletes lisas com 80 por cento de chocolate, chocolate de leite ou de chocolate branco às que, com a mesma base, têm ganache ou recheio de Vinho do Porto, de ginga, de flor de sal e caramelo – o trio que lidera a lista dos mais vendidos –, de gengibre, de caril, de menta, entre outros, “dos sabores mais exóticos ao mais habitual”, explicou Concha Valente.
O design é um dos pontos-chave da chocolataria nascida no Norte
Há ainda os snacks, os produtos criados em parceria com uma marca de Vinho do Porto e uma outra de café, e as “tabletes grand cru, monocastas” prosseguiu a anfitriã, proferindo a origem de cada uma – “São Tomé, Madagáscar e Venezuela”. Na vitrine dos bombons sobressaem uma imensa variedade de formas, cores e sabores – estes são 12. “A base é chocolate com 60 por cento de cacau e existem aqui uma grande diversidade de ganaches, sendo a de cassis e violeta e a de yuzu as mais apreciadas.” Na sala ao fundo estão os cacos, pedaços de chocolate vendidos a peso, e as canecas com os petit ballon, prontos para fazer chocolate quente, convergindo numa imensidão de escolhas criadas pelo mestre chocolateiro Miguel Tendim, da fábrica em Leça do Balio, e implementadas por esta marca portuguesa fundada pela dupla Teresa Almeida, escultora, e Celestino Fonseca, designer gráfico e, por conseguinte, o autor de tão cuidadas embalagens que envolvem cada produto a (re)descobrir todos os dias, entre as 11 e as 20 horas.
Para um final refrescante
Descubra os dois sabores de chocolate na Gelato Davvero
A última paragem foi, por sua vez, interpretada como um desvio para uma gelataria, a Gelato Davvero. De portas abertas desde Julho de 2015, o espaço continua nas mãos dos vizinhos de longa data, em Roma, Filippo Licitra e Ricardo Farabegoli, a dupla que conquistou o público da linha de Cascais, com a loja em Cacilhas – e outra em Aveiro – com os seus gelados, mesmo durante Inverno, estação do ano em que os pedidos “têm vindo a crescer”, comentou Ricardo Farabegoli em conversa com a Mutante.
Sobre o chocolate, produto que nos levou a entrar nesta rota, ambos utilizam três tipos de origem venezuelana da já mui referida marca francesa – o guanaja, com 70 por cento de cacau; araguani, com 72 por cento de cacau; e caraque, com 56 por cento de cacau – a finalidade deste é para fazer os pedaços de stracciatella.
Curisoso/a? Recomenda-se a ida para uma manhã ou uma tarde, ou final de almoço descontraído, de Terça a Quinta, das 12.45 às 22 horas, à Sexta e ao Sábado, até às 00 horas, e ao Domingo, até às 20, pois há muitos outros sabores para conhecer, como o de figo ou o de manjericão, além das opções sem glúten que, na Primavera, entrarão no Centro Cultural de Belém.
Mas, afinal, o que é o chocolate?
Odete Estêvão, a cicerone e mentora da rota do chocolate
“O ‘chocolate’ é uma proteína vegetal.” As palavras são de Odete Estêvão, fundadora e Presidente do Cacau Clube de Portugal, nutricionista por vocação, chocolatière por paixão e organizadora do evento Chocolate em Lisboa que nesta 4.ª edição, agendada para entre 9 e 12 de Fevereiro, no Campo Pequeno, irá potenciar a curiosidade de muitos, graças à presença de uma multiplicidade de marcas e produtores do Peru, da Venezuela, de França, da Bélgica, da Áustria, da Itália, de Espanha, do Vietname, de Madagáscar, do Brasil, da Suíça, entre outros, a somar aos chococookings e workshops marcados para os quatro dias.
Por sua vez, a manteiga de cacau é “uma gordura óptima para o coração”. E logo se seguiu a explicação: “Quando a semente é colocada na prensa sai uma pasta meio líquida, uma substância magra que dá uma cor castanha, a cor do chocolate, que tem ente 10 a 30 por cento de manteiga de cacau. Quanto é moída é cacau em pó.”
Não obstante, mediante um chocolate de boa qualidade é preciso saber se, “na origem, a semente foi produzida em boas condições” e qual foi a temperatura utilizada no momento da torra, uma vez que “quando a semente de cacau é torrada a 140°, 160° C, pode tornar-se cancerígena”. Por esse motivo, Odete Estêvão recomenda o chamado chocolate cru cuja semente é submetida a uma torra que não ultrapassa os 40° C.
Porém, “quando se é purista”, o chocolate é composto por pasta de cacau, açúcar, e manteiga de cacau, porque “para ser chocolate tem de ter, pelo menos, um grama de açúcar”, sublinhou.
Sobre a origem, a Presidente do Cacau Clube de Portugal referiu as diferenças. Deste modo, o chocolate feito a partir da semente oriunda de Madagáscar, que “tem um dos paladares mais frutados”, razão pela qual “está no top no que toca ao aroma e à genética”. Quanto ao da Venezuela, “as plantações são muito boas e bem cuidadas”, o que resulta num bom produto, assim como o que provém da Papua Nova Guiné, do Equador, da Costa do Marfim, da Nigéria e da Tanzânia.
Por sua vez, a designação chocolates – assim, no plural – significa, segundo Odete Estêvão, os bombons e “saber comprar um bombom é uma arte”, a qual é muito comum entre os franceses, reflectindo a exigência da técnica aplicada à cozinha daquele país. No contexto, Odete Estêvão advertiu para a validade dos bombons, a qual deve ser, preferencialmente, de dois meses ou menos. “Um francês não toca num bombom que não seja fresco”, enfatizou acrescentando que a validade “deveria ser de três semanas”.
Ainda assim muito ficou por explorar neste universo do chocolate, a descobrir e conhecer no Campo Pequeno. O valor do bilhete é de 2€ para crianças dos 6 aos 11 anos e de 4€ para o público a partir dos 12 anos (as crianças com idade igual ou inferior a 5 anos usufruem de entrada livre).