Rodeado por uma nuvem de palavras, fazia o vinho, tinto, rodopiar suavemente no copo, olhando-o com admiração.
– Embora não tivesse muito tempo, ainda hoje me lembro desse dia. Estávamos a 7 de Junho de 2016. No porto de Aveiro, o azul do céu ofuscava os meus olhos. O colossal navio bacalhoeiro espelhava os traços ténues do vai e vem das águas que não ousavam balançar a embarcação que acabava de acolher três mil garrafas deste Deus dos Mares do Douro, um vinho sério, que em novo se tornou “adulto”. Assim – profere o homem pausadamente, sentado na poltrona da sala com vista para o eterno Atlântico e com uma expressão de orgulho no rosto enquanto olhava, atento, para o copo com vinho dentro –, grande!
E continuou olhando, em simultâneo, para a lua cheia que está prestes a despedir-se:
– O destino estava-lhe traçado: Navegou em alto mar por 81 dias, a bordo do Coimbra até ao porto piscatório St. John’s, no Canadá, onde estão os Grandes Bancos da Terra Nova. Durante esta viagem marítima foram percorridas mais de 10 mil milhas!
– Mas a ideia foi de quem avô? – pergunta o neto complacente perante um tamanho orgulho e com o mesmo sentimento de satisfação por ouvir a velha estória como se fosse a primeira vez.
– O sonho pertencia a três homens – diz desviando o olhar do copo para os olhos negros, grandes e brilhantes da criança que está à sua frente e lhe mostra um sorriso franco e meigo –, mas parece que o desafio foi apresentado pelo Clube de Oficiais da Marinha Mercante, tendo sido logo aceite! Ao que parece, os três homens gostam de desafios. E dos bons, a avaliar pelo vinho! Foi então recriado o chamado “vinho da volta”. Ainda te recordas do que se trata? – pergunta saboreando-o como se de uma relíquia se tratasse.
– Sim, avô, já me explicaste – e sorri, mantendo a mesma atenção à estória.
– O objectivo era que, com o balanço provocado pelas ondas e pelo tempo que demorou a travessia marítima, o vinho envelhecesse antes do tempo. Foi assim que o vinho estagiou. Por isso, foi baptizado de Poseidon, Lua Cheia em Vinhas Velhas Poseidon 2014, um tinto DOC [Denominação de Origem Controlada] feito a partir de uvas de vinhas velhas do Douro. Em breve chegará a remessa de outras três mil garrafas do mesmo lote, o Andreza Grande Reserva Tinto 2014 que, neste momento, viaja em alto mar e, no fim, dará corpo ao Poseidon.
De repente, a porta da sala abre-se e um rosto menos marcado pelo tempo espreita, levando consigo um colheita secreta bem ao gosto do ancião:
– Feliz Dia do Pai! – diz, ao mesmo tempo, que abre os braços em direcção ao homem mais velho que se erguia da poltrona com a vivacidade de um adolescente ao ouvir tão gratificantes palavras.
– Feliz Dia do Pai! – repete o mais novo assim que vê o pai para, logo de seguida, e com seus pequenos braços, envolver em grande, pai e avô.
Agradecemos à Lua Cheia em Vinhas Velhas o apoio na realização desta história sobre o Deus do Mar.