A História, o património e a cultura. A Natureza e a street art. Tudo andará numa roda viva de 25 de Março a 2 de Abril, numa das freguesias mais volúveis às portas da capital portuguesa, o Lumiar.
A empena cromática de Felipe Pantone junto ao estúdios da Tóbis
“Trabalhar o bairro como uma marca”. As palavras são de Xana Nunes, a mentora do LisbonWeek, e traduzem o propósito do evento multidisciplinar que, para a 4.ª edição, eleva o Lumiar a epicentro ao longo de dez dias, no âmbito o desfecho das celebrações dos 750 anos desta freguesia lisboeta. Assim, entre 25 de Março e 2 de Abril, o limiar da capital portuguesa protagoniza acções multidisciplinares, desde o abrir de portas de palcos da História entre palácios, conventos e igrejas, e quintas senhoriais, ao circuito de arte urbana preenchido por intervenções artísticas in situ, passando por passeios pela Natureza, pela eclética sétima arte, por serões musicais, exposições, por uma mesa redonda e pela celebração Hindu.
Iniciemos o roteiro do LisbonWeek de 2017 com os olhos postos no museu de arte urbana ao ar livre, a qual tem vindo uma crescente admiração por parte do público em geral, como o trasbalho de Alexandre Farto, a.k.a. Vhils, que deixou o seu cunho artístico nas telas de pedra da fachada da nova sede e Centro de Inovação e Competitividade da GS1 Portugal, no Campus do Lumiar, e cuja arquitectura conta com a assinatura de Pedro Appleton, do atelier Promontório.
Do lado oposto da freguesia, está patente o mural de Vanessa Teodoro, a.k.a. The Super Van, na Azinhaga da Cidade, muito inspirado na banda desenhada e nas máscaras africanas, divertido e consistente.
Já no âmbito do LisbonWeek, e em linha recta para Nascente está a obra de arte de Francisco Vidal que, com latas de spray e tintas acrílicas – as “armas” da “cultura ‘marginal’” da década de 1990’ –, deu nova vida à fachada de um prédio da Alameda da Música, na Alta de Lisboa, através de um jogo entre cores frias e quentes nascido de um workshop feito com crianças e jovens do Centro Social da Musgueira, em Lisboa, apoiado pela Galeria Lumiar Cité. “A minha vocação começou nas paredes” confessou Francisco Vidal para quem a “pedagogia da pintura e do desenho” é relevante face à igualdade e à inclusão sociais.
A dois passos dali encontra-se a intervenção de Rui Alexandre Ferreira a.k.a. RAF que, regressado à Rotunda dos Corvos, faz a reinterpretação da pintura artística que deixara em 2013 no muro com quase mil metros para, agora, criar o efeito visual dos corvos a levitar através da abordagem dimensional e mais colorida a par com inscrição da frase do Brasão das Armas da capital, “Mui nobre e sempre leal cidade de Lisboa”.
Os “Estúpidos”, de Robet Panda, preparam-se para fazer parte deste evento multidisciplinar
Por sua vez, na Praça Bernardino Machado, é notório o conjunto de padrões coloridos combinados com elementos geométricos do espano-argentino Felipe Pantone, os quais nos remetem para o início da emissão televisiva de tempos idos na empena de um prédio com 45 metros de altura. A linguagem abstracta faz a ponte para os antigos estúdios da Tobis, na mesma praça e, ao mesmo tempo, a advertência do artista para “os perigos do excesso de informação”, afirmou Ana Margarida Cruz, representante da Galeria de Arte Urbana (GAU) de Lisboa, enquanto os nossos olhos contemplavam o mural de Ricardo Guerreiro que, desde Abril de 2015, se encontra à vista de todos, dando a conhecer, através do seu traço, as oito décadas do cinema português desenhados nas traseiras do ICA – Instituto do Cinema e do Audiovisual.
De volta ao roteiro do LisbonWeek, há que passar no Jardim de Telheiras onde dois “Estúpidos” estão de pedra e cal. Falamos, claro está, das criaturas a que Robet Panda, a.k.a. Panda to Transe, deu cor e corpo.
Terminemos o percurso cultural, mas não antes mencionarmos que o autocarro das visitas guiadas do LisbonWeek dá boleia ao registo artístico de Diogo Machado, a.k.a. Add Fuel. Demarcado pela reinterpretação da azulejaria tradicional portuguesa, o autor inspirou-se, desta feita, nos padrões típicos da arte de bem azulejar do Lumiar fazendo, uma vez mais, a ponte entre o tradicional e o contemporâneo, dando movimento ao processo criativo de um museu ao ar livre.
De olhos postos na História e no património
A arte azulejar é o testemunho da História em quintas seculares do Lumiar
O mesmo meio de transporte é pretexto para não perder as visitas guiadas aos três percursos desenhados pelo Professor José Sarmento Matos que, desde a primeira edição do LisbonWeek, tem dado a conhecer espaços e lugares ora esquecidos, ora desconhecidos.
Dentro do contexto histórico e patrimonial, e com a constante colaboração da historiadora Inês Pais, há palácios de veraneio a visitar, como o Palácio Angeja-Palmela, que acolhe o Museu Nacional do Traje e da Moda, ou o Palácio Monteiro-Mor ou Museu Nacional do Traje e da Dança – façamos, aqui, um breve desvio para uma pausa no jParque Botânico Monteiro-Mor, com mais de 250 espécies botânicas, um excelente mote para uma caminhada guiada ao som das pelas palavras de um poema de Almeida Garret.
No roteiro das igrejas e conventos, ambos os historiadores terão a chave que abrirá portas da Igreja de São João Baptista, datada do século XIII e a mais antiga do Lumiar, assim como da Ermida de São Sebastião, do século XVI, ou do Mosteiro de Santa Maria, ou da Igreja de Nossa Senhora das Portas do Céu, esta em Telheiras.
Outro dos focos temáticos da LisbonWeek é as quintas, lugares da História outrora protagonistas do cenário bucólico que se vivia na freguesia que delimita a cidade de Lisboa, rica em solos férteis e, por conseguinte, cravejada de campos agrícolas e de uma zona destinada à caça. De então, perduram a mui conhecida Quinta das Conchas e a vizinha Quinta dos Liláses, a Quinta dos Azulejos – cujo palacete apresenta uma fachada revestida de azulejos da extinta Real Fábrica do Rato, em Lisboa – ou a Quinta de Nossa Senhora do Carmo.
“No fundo, desbloqueamos as burocracias para proporcionar as visitas”, afirma Xana Nunes acerca de um dos objectivos da LisbonWeek que, de certo, teria público interessado em percorrer estes roteiros caso houvesse quórum para continuar um trabalho, de certo, muito enriquecedor para muitos.
Uma mão cheia de artes e cultura
O rapper português Estraca esteve à luz da máquina fotográfica de Rui Aguiar
No alinhamento do programa, haverá música, do jazz ao fado, no Salão Nobre da Junta de Freguesia do Lumiar, e uma exposição composta por trabalhos dos fotógratfos Carlos Ramos, Rui Aguiar e Luís Mileu, o trio que se inspirou nas gentes e na “Luz do Bairro”, na Galeria Liminare, ambos no n.º 56 da Alameda Linhas de Torres, em Lisboa.
Como não poderia deixar de ser, está tudo a postos para uma sessão de cinema na vetusta Tóbis que, a 25 de Março, convida a (re)ver as versões originais de “A Canção de Lisboa” e de “O Leão da Estrela”, ambos produzidos pelo estúdio português dedicado à sétima arte, a somar a dois ciclos de curtas e longas-metragens, a exibir de 27 de Março a 2 de Abril, na Biblioteca Orlando Ribeiro, em Telheiras, sendo todas as sessões gratuitas mediante disponibilidade dos espaços.
Além das boas sonoridades, da fotografia e do cinema, há mais arte pública para anotar na agenda, desta vez sob o mote “Salva os Oceanos”, a qual irá “mergulhar” a Quinta das Conchas numa mostra que envolveu a dedicação e o empenho de mais de duas mil crianças das instituições de ensino do Lumiar, a somar ao trio de propostas associadas à moda e ao teatro no Museu do Teatro e da Dança: “Vestir hoje o Teatro e a Dança – Novos criadores portugueses nos palcos de Lisboa”, a visitar a partir de 28 de Marlo; “Entre-Acto Modernista: o Teatro e a Dança na obra de António Soares”, patente entre 25 de Março e 1 de Maio; e “Peças em Peças – Do figurar e do Trajar”, para ver até 30 de Maio.
Aos amantes da cultura Hindu e curiosos a respeito de uma gastronomia tão exótica, o LisbonWeek sugere o templo Radha Krishna, no Lumiar que, sob o pretexto de ser o maior templo Hindu da Península Ibérica propõe, para o fim-de-semana de 1 e 2 de Abril, uma viagem ao universo indiano, com workshops de dança, yoga, chai e gastronomia.
Por fim, e como não poderia deixar de faltar, está agendado, para as 18 horas, de 29 de Março, um debate sobre urbanismo conduzido pelo Arquiteto Manuel Salgado, Vereador do Urbanismo da Câmara Municipal de Lisboa, para falar sobre o projeto da Musgueira e da Alta de Lisboa, bem como o plano de urbanização de Telheiras da década de 1970, no Jardim de Inverno da Quinta dos Lilases. À conversa estarão Pedro Delgado Alves, Presidente da Junta de Freguesia do Lumiar, Sérgio Sintra, da Santa Casa da Misericórdia, o Arquiteto José Veludo e Gonçalo Antunes, autor do livro “Da Musgueira à Alta de Lisboa”. A entrada gratuita, mas carece de reserva.
Sobre os bilhetes do LisbonWeek, os quais se encontram à venda na ticketline,há a possibilidade de os adquirir individualmente (entre 7€ e 10€) para cada uma das atividades ou de optar pelo Passaporte LisbonWeek (25€), que inclui as visitas guiadas aos paalácios, às igrejas e conventos e à quintas, além de uma quarta experiência à escolha – um circuito de arte urbana ou o percurso no Parque Botânico do Monteiro-Mor.
Agora é agendar e ir! •
+ LisbonWeek
Legenda da foto de entrada: Remate do mural da autoria de Francisco Vidal / © Patrícia Serrado
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