Às voltas com a lã sem perder o fio à meada na Covilhã / Puralã Wool Valley Hotel & Spa

A arte de estirar à fieira é um património vivo desta cidade da Beira Interior, uma sucessão de registos ligados à história dos lanifícios, à street art que preenche os vazios do seu centro histórico, à feitura do vinho na Beira Interior e a um hotel onde a matéria-prima local é rainha.

O mural inspirado na indústria têxtil e na Revolução Industrial da autoria de Fátima Pereira Nina

A história da indústria têxtil é homenageada no renovado Puralã Wool Valley Hotel & Spa, do grupo Natura IMB Hotels, com o monumental tear representado na parte exterior da entrada do edifício, o iniciar de um fio condutor que anda às voltas com a lã homenageada no mural disposto na ala da restauração e lazer, e composto por oito painéis da autoria de Fátima Pereira Nina, artista nascida na Covilhã e estilista de profissão.

A lã é a matéria-prima predominante em muitos dos detalhes decorativos do hotel

Nos quartos, um fino tronco de madeira, disposto à parede da cabeceira da cama, sustenta fios de lã, a mesma matéria-prima predominante nas almofadas decorativas e nas peças disponíveis para compra no lobby, onde objectos outrora de fábricas e lojas de tecidos reportam para tempos idos e, em simultâneo, acicatam a curiosidade dos mais novos ávidos de querer saber, por exemplo, “porque eram as máquinas registadoras assim?”

A comida da terra e as escolhas saudáveis

Os estilos industrial e rústico combinam-se no mesmo espaço partilhado pelo lazer e a restauração

Entre o industrial e o rústico diz-se do conceito implementado no bar bistrô e no restaurante, dois espaços contíguos num open space dominados pela madeira reutilizada – e partilhados com pequenas “salas de estar” aconchegantes.

O creme de castanha e aipo com raviolis de trufa e cogumelos shitake pelo chef Hélder Bernardino

O primeiro está nas mãos de Carlos Andrade, o barman e um grande curioso no que aos vinhos diz respeito, enquanto o segundo é da responsabilidade do chef Hélder Bernardino, dotado de conhecimento e prática na chamada confort food, cheia de sabor, inspirada em pratos regionais, bem como em cozinhas de outras paragens – como o creme de castanha e aipo com raviolis de trufa e cogumelos shitake, os filetes de polvo assado com arroza de amêijoas e berbigão ou o angus de Idanha(-a-Nova) na tábua com batata rústica e salata de abacate, tomate e queijo de cabra curado –, mas tão apetecível nos dias frios que, a avaliar pelos termómetros, vieram para ficar.

O angus de Idanha na tábua com batata rústica e salata de abacate, tomate e queijo de cabra curado é outro dos pratos da carta

No restaurante há duas opções a ter em conta: o buffet e a carta. Em qualquer uma delas estão os queijos e os enchidos, e o vinho da região, assim como a “escolha saudável” com a chancela da nutricionista Odete Oliveira que, todas as semanas, idealiza um prato e uma sobremesa saudáveis para o buffet e um alinhamento de sugestões de comida macrobiótica, vegetariana e ovolactovegetariana (dieta vegetariana que permite a inclusão de ovo e leite, e seus derivados), e sobremesa crudívora (feita à base de alimentos crus).

Para além disso, quem desejar fazer um programa especial de alimentação ou continuar a fazê-lo mesmo longe de casa, basta informar o hotel aquando da reserva. “Com a confirmação do cliente, é feito um programa alimentar adequado e, assim, garantir uma estadia ainda mais agradável”, afirma Ana Morais, directora comercial do grupo Natura IMB Hotels. Com o intuito de assegurar o serviço personalizado, “a dr.a Odete Oliveira contacta o cliente para falar sobre esta questão e para acertar os detalhes associados à alimentação”, esclarece.

Bacalhau assado na telha com migas e batata assada do restaurante da Casa de Campo

Mas alheemo-nos ao desvelo à mesa, desta vez, na Casa de Campo, onde a cozinha do chef António Mendes é protagonizada, sobretudo, pela comida tradicional confeccionada em forno de lenha e pelas sobremesas regionais, a começar nas papas de carolo e na tigelada beirã.

A Casa de Campo, erigida no meio da Natureza e complementada por um complexo desportivo destinado a quem tanto aprecia o desporto ao ar livre,  pertence ao grupo hoteleiro Natura IMB Hotels.

Entre vinhas nos termos do distrito de Castelo Branco

Nesta propriedade de 200 hectares há vinhas com 86 anos

Porque a gastronomia combina comida e vinho à boa mesa portuguesa, é de convir falar sobre o legado de deus Baco, com a bússola apontada para Este. Na “mira” da agulha magnética deste instrumento destinado à medição dos pontos cardeais está uma propriedade com 150 hectares de vinha localizada no sopé da encosta Sul da Serra da Estrela, em Belmonte, na fronteira entre o distrito de Castelo Branco e da Guarda, daí o nome: Quinta dos Termos.

João Carvalho é o proprietário da Quinta dos Termos desde 1993

Ao todo são cerca de 200 hectares sinuosos e vincados por uma paisagem natural dominada pelo granito que, desde 1993, estão nas mãos de João Carvalho, engenheiro têxtil de formação, CEO na Fitecom, em Tortosendo e, outrora, docente na Universidade da Beira Interior (UBI).

Quinta dos Termos Reserva branco 2016 feito a partir das castas portuguesas Fonte da Cal, Síria, Arinto e Verdelho

Considerado “o maior produtor particular de vinhos DOC da Beira Interior”, João Carvalho sublinha a existência de quatro hectares de vinhas velhas, datadas de 1931 e de um laboratório vivo criado in loco, com campos de clones de videiras para estudo e ensaio. Já na lista de castas, há um total de 18 tintas e seis brancas, aqui com destaque para a Fonte da Cal, casta autóctone da Beira Interior recuperada em 1997 e com a primeira colheita registada do ano de 2003. Ainda acerca das castas regionais, há espaço para a Rufete, a Marufo ou a Síria, para além da Touriga Nacional, do Alfrocheiro, da Jaen, da Tinta Roriz, da Tinto Cão ou das internacionais, como a Syrah ou a Riesling, entre outras.

A respeito do trabalho de campo, João Carvalho enfatiza a importância da produção integrada, onde a intervenção de herbicidas e pesticidas na vinha é nula, e sublinha o papel da ecologia, quer na vinha, quer na adega – aqui o destaque vai para a utilização das leveduras indígenas e a capacidade de armazenagem traduzida em dois milhões de litros. Por ano, a produção da Quinta dos Termos é de 800 garrafas.

Na história, permanece a data de aquisição feita pelo pai de João Carvalho, Alexandre Carvalho: 1945. Enquanto para o futuro somam-se as boas novas no circuito de visitas guiadas pela vinha e pela adega, além de, pelo menos, uma estreia no portefólio vínico, para a época natalícia de 2018: um espumante Blanc de Noir da Quinta dos Termos.

New Hand Lab: Quando do velho se faz novo

Dobadoura: Máquina que tem como finalidade dobar os fios de lã

Design de moda, de multimédia e de produto, música, fotografia, cinema, artes plásticas, pintura. A criatividade impera New Hand Lab – Fábrica António Estrela  I Júlio Afonso, projecto físico e interdisciplinar criado em 2013 na antiga unidade fabril de lanifícios datada da década de 50 do século XIX, mesmo ao lado da Ribeira da Carpinteira, na cidade Covilhã, a qual em 2009 foi obrigada a parar as máquinas.

Ana Almeida, a criadora dos 12 protagonistas das lendas das 12 aldeias históricas de Portugal, e Francisco Afonso, o anfitrião

Além de laboratório vivo entregue ao mundo transversal das artes, é também um lugar mágico para a imaginação dos mais novos. Para quem não sabe, é aqui que a artista Ana Almeida dá vida a seis bonecas e seis bonecos feitos a partir de lã e inspirados em lendas de 12 aldeias históricas de Portugal, para o projecto Histórias Criativas by Ana Almeida e o livro “Lendas da tua História”, da autoria de Rosário Alçada Araújo. Uma lufada de ar fresco no imaginário infantil – e no dos adultos – complementado por tantos outros ofícios que, todos os dias, dão corpo a esta fábrica classificada de monumento de interesse público.

Os padrões criados pelo desenhador Júlio Afonso, o último proprietário da fábrica que acolhe a New Hand Lab e pai de Francisco Afonso

Durante a visita guiada, Francisco Afonso, filho de Júlio Afonso, homem com um papel preponderante no trabalho criativo inerente ao design de tecidos e tweeds desta fábrica, fez questão de mostrar o espólio reunido num armazém de produtos acabados. Numa outra sala, um arquivador com 60 anos de história, no qual “não há um único padrão repetido”, assegura Francisco Afonso exemplificando com amostras do trabalho de seu pai e exibindo “a caneta especial” com a qual Júlio Afonso desenhava cada padrão.

Petrus, o projecto feito com lã pelas mãos de Ana Almeida

Na parte mais antiga da fábrica está a loja, onde estão disponíveis para compra trabalhos dos artistas acolhidos na New Hand Lab, contígua à qual estão à mostra vestígios de uma outra unidade fabril, datada do século XVII, sobre a qual foi construída esta fábrica, que continua a dar corpo a um fio condutor entre diversas acções ligadas às artes e onde as máquinas que, a qualquer momento, podem retomar os trabalhos de laboração – porque “ainda mantém o alvará de fábrica”, segundo Francisco Afonso – foram fabricadas na Covilhã.

E da Wool Fest se fez a street art

“Fio Condutor” é a intervenção do artista urbano português Regg Salgado feita por ocasião do Encontro Nacional de Estudantes de Design organizado em parceria com o Wool – Festival de Arte Urbana da Covilhã

A arte urbana é já um ex-líbris no centro histórico da cidade graças ao Wool – Festival de Arte Urbana da Covilhã, projecto criado pelos irmãos Lara e Pedro Seixo Rodrigues em homenagem à primordial importância da indústria dos lanifícios na Covilhã.

A imagem de um pastor com uma ovelha às costas, junto à Igreja de Santa Maria, está assinada pela ARM Collective

Porém, a explicação para a palavra wool vai mais longe. É um jogo entre “lã” em inglês e wall, muro em português, além de que é uma palavra cuja fonética é semelhante à primeira. Por essa razão, as paredes e os muros são, desde 2011, a tela de artistas urbanos portugueses e internacionais. Objectivo? Despertar a comunidade para a arte contemporânea exposta num “museu” ao ar livre, a qual permite dotar de estética edifícios entre outros espaços abandonados. Segundo Pedro Seixo Rodrigues “as pessoas passaram a ter uma maior auto-estima em relação a estas zonas da cidade”.

Pedro Seixo Rodrigues é um dos fundadores deste festival de arte urbana cujo epicentro está na Covilhã

Resultado? A criação de um roteiro ao longo do qual são visitadas intervenções executadas in loco e com abordagens diferentes sobre a temática de acordo com o trabalho de cada artista sem perder o fio à meada na companhia de Lara ou Pedro Seixo Rodrigues.

Na lista constam alguns nomes do circuito ligado à arte urbana, como os portugueses Bordalo II, Vhils, Add Fuel, Mr. Dheo, Regg Salgado, Tamara Alves, HalfStudio e ARM Collective, os catalães BTOY e KRAM, Inside Out Project do artista francês JR ou o argentino Bosoletti.

No fim, não deixe de passar pel’ A Tentadora, uma loja que é um atelier e um pequeno cowork onde vale a pena entrar e avivar memórias da infância.

E depois? Bom, depois regresse ao Puralã Wool Valley Hotel & Spa para experimentar um dos rituais estimulantes feitos com produtos endógenos da Serra da Estrela no Natura Club & Spa, o duche vichy ou uma das piscinas (interior ou exterior), jacuzzi, sauna e hamam. O melhor remédio para relaxar depois de uma caminhada a solo, a dois, com os amigos ou em família pela cidade da Covilhã. Sugestões não faltam de acordo com os roteiros programados pelo hotel, para umas férias descontraídas.

É fazer as mala e ir. Boa viagem! •

Puralã Wool Valley Hotel & Spa
© Fotografia: João Pedro Rato
Legenda da foto de entrada: A representação do tear vista à noite à entrada do Puralã Wool Valley Hotel & Spa

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