No Musée Maillol, em Paris e até ao dia 20 de Janeiro de 2019, pode admirar Alberto Giacometti em diálogo musical com escultores seus contemporâneos, e mais.
Durante sensivelmente quatro meses, uma vez que abriu ao público no dia 14 de Setembro deste ano, Alberto Giacometti estará em diálogo com Rodin, Bourdelle, Maillol, Despiau, Brancusi, Laurens, Lipchitz, Zadkine e Richier. Onde? No Musée Maillol, portanto, em Paris. Propõe-se uma releitura da sua obra, então, colocando-a a par da dos grandes escultores clássicos e modernos da sua época.
Giacometti é, sempre será, parece-me, uma presença desamparada na paisagem da escultura, e da arte por inerência. Na verdade, se começarmos pelo fim desta exposição, uma quase última sala, e aquela em que é chamado Auguste Rodin com o seu São João Baptista, vemos através do confronto que é feito com o Homem que Caminha de Giacometti, uma diferença abismal. Claro que, tal como Alberto Giacometti vinca, nenhuma escultura substitui outra: existe uma incomensurabilidade que advém da obra de arte colocar questões, ser uma interrogação e uma tentativa de resposta. Todavia, creio poder afirmar-se que o escultor suíço e que fez de Paris a cidade-útero, concretamente o atelier onde trabalhava obsessivamente, de onde não sentia necessidade de afastar-se, é mesmo uma presença muito subtil. Subtileza exterior e palpitação interior, intensa.
Mais do que me deter em questões formais, as quais a exposição expõe de forma didáctica e clara, indo da figuração “tradicional”, passando pela tentação da abstracção, à margem do surrealismo, e o retorno definitivo à figuração; gostaria de insistir em três realidades bastante caras a Alberto Giacometti: a mulher, a cabeça e o casal, este aliás presente desde cedo no seu percurso. Por outro lado, julgo ser ainda de realçar a escala: é sempre a do mínimo, do extremamente pequeno, mesmo quando as suas vibrantes esculturas alcançam uma outra envergadura.
Efectivamente, a exposição inicia-se com uma galeria de “cabeças”, da autoria de Maillol e de Giacometti, as deste dos primórdios do seu labor. Bojudas, não poderá afirmar-se que prenunciam propriamente as suas figuras desesperadamente adelgaçadas e nevrálgicas, aquelas em que, no final, se detectam tão belamente as suas impressões digitais. Mas enuncia-se desde logo a sua fixação positiva na questão da identidade. Pois não afirma o escultor a dada altura, como se pode aliás ler num dos textos de parede da exposição: “Mas a aventura, a grande aventura, é a de ver surgir qualquer coisa de desconhecida a cada dia, no mesmo rosto. Isso vale por todas as viagens em torno do mundo”?
Entretanto, ao estabelecer o paralelismo com as vanguardas, e mesmo quando Henri Laurens é chamado à colacção através de uma escultura em pedra polícroma, verifica-se uma disparidade “temática”, ainda que em termos formais se afirmem similitudes: ou seja, Laurens detém-se nos objectos, Giacometti nos sujeitos. Assim, o escultor que é nesta exposição a peça central apresenta um “casal”: donde se deduz a sua inquirição acerca do humano. Não que Alberto Giacometti não tenha divagado pelos “objectos”; no entanto, o seu móbil, a sua derradeira busca, inscreve-se no sopro, do humano. O que se comprova desde o início, portanto.
Ao insistir no casal, Giacometti leva-nos até à relação tendo como fissura a diferença sexual. Por outro lado, a persistência da mulher na sua deriva, alerta-nos para a questão da alteridade. Unindo os dois movimentos, podemos concluir que o escultor sempre se colocou no abismo do “resto”, tanto que a fixação em torno das “cabeças” compactua com o pensamento, sem se deter na metamorfose da matéria. Curiosamente, as obras da sua fase final são ditas desmaterializadas, o que parece ir ao encontro do repúdio de tal metamorfose. Todavia, sintetizam as suas impressões digitais, repito: como que transferem para o bronze, material sobretudo eleito, uma correspondência interior de sensações.
Entre a sua Floresta e Os Burgueses de Calais, de Rodin, aliás, o artista sensualista, estabelece-se uma queda de arranha-céus! Rodin na terra e Giacometti no céu. Ou será no inferno? Também podemos na verdade ver as figuras de Giacometti como salpicos de pingos de chuva ou como estalagmites: o Inverno.
Para ver, então, no Musée Maillol até dia 20 de Janeiro de 2019, localizado na Rue de Grenelle, nº 61, em Paris, repito.