Patente no Vitra Design Museum, uma exposição que é uma aula de história política, social, religiosa… uma aula sobre o poder no acto de sentar e como o design lhe é indissociável. “Seats of Power” é para colocar na sua agenda.
A exposição “Seats of Power” demonstra o quão próxima a história das cadeiras e o acto de sentar é do sentido de poder, e sempre foi associado a uma das formas de expressão de poder e do poder. As origens da cadeira moderna, que hoje nos é um objecto tão comum, pode ser rastreada até aos idos tronos da antiguidade. Durante um bem longo período, as cadeiras estavam reservadas aos governantes e aos altos dignitários da sociedade. Algo a que só se assiste a uma mudança com o surgir de uma classe burguesa, nos tempos modernos. Com o advento de produção industrial de mobiliário, no século XIX, as cadeiras finalmente tornaram-se acessíveis a uma maior e mais ampla população; porém, a sua ligação com o status e o poder permanece evidente até os dias de hoje.
© Eirik Johnson, Interior of the Glass House by Philipp Johnson in New Canaan, USA, with Mies van der Rohe’s Barcelona Chair (1929), 2006
A apresentação de “Seats of Power” no Vitra Schaudepot trabalha este tema com uma apresentação de cerca de 20 peças, do espólio do museu, ilustrando como as abordagens a políticas, sociais e o poder económico continuam a encontrar parte da sua expressão em cadeiras e no acto de sentar. Uma história cultural das cadeiras modernas emerge assim: dos princípios autoritários e patriarcais aos valores igualitários e participativos; dos bastidores da política e do financiamento aos parlamentos democráticos, e aos designers que almejam uma redistribuição de poder(es) com novos designs de cadeias.
As peças mais antigas, em exibição, atestam a ligação entre esta peça de mobiliário e concepções mais tradicionais de poder político e religioso. Um exemplo é a Chaise de Garde, criado pelo gabinete da Corte Belga Jean-Joseph Chapuis, por volta de 1802. Encomendada por Napoleão Bonaparte para a renovação do Castelo de Laeken perto de Bruxelas, a cadeira baseia-se em modos de sentar da Roma Antiga. Um dos objectos mais recente é o trono papal projetado para o Papa João Paulo II, para a sua visita a Zagreb, em 1994. O alto e rectilíneo espaldar, com uma postura de assento rigidamente formal exigida pela forma do trono, permanece como um símbolo do poder tradicional, até hoje.
© Luca Zanier, UN Security Council, New York, 2008
A exposição ilustra, também, como o processo de democratização em muitos países ocidentais levou a projetos de cadeiras e posturas no sentar que reflectem valores como flexibilidade, transparência e direitos de igualdade. Durante o lendário debate televisivo entre John F. Kennedy e Richard Nixon, em 1960, por exemplo, os candidatos sentaram-se na cadeira de Hans J. Wegner “JH501” (1949/50); um modelo de madeira onde o design moderno e discreto representava os ideais de um estilo político mais modesto, com base nas suas raízes. Da Holanda, o design de Hella Jongerius levou este conceito mais além com a sua “East River Chair” (2013/14), concebido para a sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova Iorque. Estofada com um tecido colorido, com um espaldar baixo e braços integrados a cadeira transmite uma sensação de abertura e pluralidade. As pernas posteriores estão equipadas com rodas, como se cadeira dissesse: a mudança é mais importante do que aderir aos valores tradicionais. A poltrona de Jongerius chamou a atenção quando foi usada por Angela Merkel, Christine Lagarde e Ivanka Trump, durante um painel de discussão na Women20 Summit, em Berlim.
© Strüwing Jørgen, Seating area with copies of Arne Jacobsen‘s Egg-Chair (1957/58) in groups in the lobby of the SAS Royal Hotel, Copenhagen, 1960
Além da presença no domínio político, a expressão de poder e o status de cadeiras também tem sido sujeito a uma evolução contínua dos valores sociais. No século XIX, por exemplo, as cadeiras de baloiço e outros móveis de lazer ficaram na moda porque provaram a capacidade do seu proprietário de proporcionar a si mesmo o prazer da inatividade, do ócio. Um representante deste grupo é a “Adjustable Chair” (1870/71) criada pelo designer americano George Wilson, cujas várias características mecânicas revelam um claro fascínio pela surgir da sociedade industrial moderna.
No século XX, muitos clássicos do design ofereciam um conforto maior como forma de expressão de influência e autoridade, exemplo disso são: a Cadeira de Ludwig Mies van der Rohe, para o Pavilhão Alemão da Exposição Internacional de 1929, em Barcelona; de Charles e Ray Eames’s a “Lounge Chair” (1943 – 56), ou a “Egg Chair” de Arne Jacobsen (1957/58), que foi originalmente concebida para o átrio espaçoso de um hotel de luxo em Copenhaga, para criar áreas protegidas para conversas, sem perturbações. Designs icónicos foram também usados em filmes e séries de televisão para preparar o palco para os seus protagonistas: em “The Spy Who Loved Med”, o inimigo de James Bond sentou-se na “Elda Chair” (1963) do designer italiano Joe Colombo, enquanto Spock, o inesquecível personagem da mítica série Star Trek, estava sentado na escultural “Ribbon Chair” (1965), do designer francês Pierre Paulin.
Uma abordagem contrária à ligação entre o poder e as cadeiras é vista nos esforços de designers como Enzo Mari, que criou uma cadeira “DIY” completamente despretensiosa como parte de sua coleção Autoprogettazione (1974). Desde 2016, o grupo CUCULA tem oferecido oportunidades de trabalho e sociais aos refugiados, permitindo-lhes construir em série estas cadeiras na sua oficina de Berlim: neste caso, o design não funcionam como uma expressão de poder, na forma de prestígio ou luxo, mas como um meio de autodeterminação, de independência.
© Verena Brüning, The Team of Embassador-Chair (Original design Enzo Mari 1974) at CUCULA, Berlin, 2015
A exposição “Seats of Power” é ainda complementada com fotografias marcantes de vários interiores nas quais podemos ver estas “cadeiras de poder” em uso. Estas imagens incluem uma sala estilo Império de um Palácio Real em Bruxelas, bem como a icónica “Glass House” de Philip Johnson (1949), em New Canaan, Connecticut (EUA), que estabeleceu o International Style como o estilo preferido por bancos e escritórios de advogados, décadas seguintes. Outras fotografias, que retratam alguns centros de poder de hoje, desde a Assembleia Geral da ONU, em Nova York, a salas de conferências como a da Chancelaria Federal Alemã, em Berlim, e da sede da FIFA, em Genebra. Cada um desses interiores – coloridos e multiculturais, honrados e subestimados, ou autoritários e intimidantes – ilustra como os conceitos de poder mudam ao longo do tempo e o papel decisivo do design em transmiti-los.
Se tiver oportunidade, rume nesta viagem até o Vitra Design Museum, na Alemanha. Uma exposição que é uma viagem na história, no seu todo, patente até ao dia 17 de Fevereiro de 2019. •