Determinado, criativo e definitivamente “cool”, é assim que pode ser descrito o produtor de 27 anos. Formado entre Lisboa, Londres, Bruxelas e Florianópolis, Henrique “Henri” Costa Santos não só soma cargos de gestão, produção e programação cultural, como também é o fundador da Safari Produções, estrutura cultural nascida em Cascais, que tem como objetivo a promoção das artes e da cultura, aliada à consciencialização ambiental.
A Mutante esteve à conversa com Henri Costa Santos, que refrescantemente “hands-on”, tem procurado redefinir os conceitos de ativismo cultural, através dos quais ressalva o quão importante é o envolvimento cívico por parte de todos.
Henri, como é que surgiu o teu interesse pela cultura e produção de espetáculo?
Agora estou do lado da produção e da gestão, mas o meu primeiro contacto com o mundo do espetáculo foi em cima do palco. Estudei flauta transversal e música clássica no Conservatório, depois passei pelo Hot Clube Portugal, onde estudei jazz e tive alguns projetos musicais, bandas e uma participação em orquestra, de onde resultou um par de concertos. Foi assim, e vindo de uma família onde a música é uma linguagem muito presente, que ganhei amor ao mundo das artes e do espetáculo.
Aos 18 anos organizei o meu primeiro festival – o Festival Coolcheia – em parceria com a Câmara Municipal de Cascais, que teve lugar no Parque de Palmela, com bandas emergentes e artistas de Cascais. Foram dois dias intensos, que me fizeram perceber que era exatamente isto que queria fazer: juntar e estimular pessoas em momentos excitantes, emocionantes e interessantes do ponto de vista artístico.
Tens uma vasta experiência com festivais; és produtor executivo no “Festival Todos” e manager no “BOOM Festival”. O que é que te incentivou a fundar a Safari Produções?
A Safari é uma associação recém-nascida dedicada a promover iniciativas culturais com uma vertente ambiental na linha de Cascais, e foi fruto de uma vontade coletiva, minha e das pessoas que me rodeiam, de abanar a comunidade.
Foi esta vontade que me levou a concorrer a um concurso promovido pelo governo, financiado pelo Portugal 2020 / União Europeia, com cerca de 200 outros projetos nacionais. Acabei por ser selecionado em 2018, o que me permitiu por a Safari em andamento e arrancar com o projeto.
Quantas pessoas é que trabalham na Safari?
A resposta a essa questão pode deixar pistas sobre a essência “safariana”. A Safari é um projeto associativo e colaborativo, ou seja, apesar de ser apresentada como “Safari Produções”, é uma associação cujo principal objetivo é gerar movimento comunitário, que procura envolver pessoas. Como tal, não tem só pessoas efetivas, parte dos órgãos de direção, sócios, etc., como também um outro grupo de pessoas sem vínculo formal, que veste a causa e se junta em cada edição. A Safari acaba assim por ser não se resumir a uma equipa fechada ou exclusiva, mas também a um coletivo diverso e, de momento, aceleradamente em mutação e expansão.
A Safari tem uma cidade/região foco ou trabalha por Portugal inteiro?
A Safari tem um vínculo com Cascais que não tem com mais lugar nenhum e é lá que continuamos interessados em trabalhar. A associação foi fundada através de um desejo de explorar a (bio)diversidade humana, e Cascais é o exemplo perfeito disso, já que representa um “microclima” no qual vivem pessoas de todos os estilos, de todas as gerações, e com interesses diversos entre si – o que acaba por dialogar em pleno com a diversidade paisagística do território. Apesar de ser uma vila, Cascais tem uma grande dimensão multicultural muito interessante, e é nesse contexto que a Safari acaba por se inspirar. E claro, também é em Cascais que temos tido apoio por parte da Câmara Municipal e instituições locais.
No entanto, não é só em Cascais que trabalhamos. No final de 2019 começámos a produzir eventos em Bruxelas, naquele que foi o primeiro movimento de internacionalização. Até à data desenvolvemos dois projetos; duas grandes festas com o objetivo de promover o universo e música lusófonos na Bélgica, que correram bastante bem. Desenhámos uma colaboração entre a Safari e a Rádio Frappè, uma estação de rádio Bruxelense com origem em Maastricht, que vai continuar no futuro. Para além disto, também criámos uma curadoria de uma janela programática o ano passado, no festival “FOLIO – Festival Literário Internacional de Óbidos”, chamada “Cavalo de Tróia”, com o Hugo Mamede, da Editora Figura d’Urso, e também temos recebido convites por parte de autarquias e espaços de espetáculos em várias zonas do país, que queremos por em prática assim que possível.
Com que género de projetos e/ou artistas é que colaboras na sua maioria?
Ainda não temos artistas regulares, até porque o projeto é bastante recente e está em fase de crescimento. Um dos nossos objetivos principais é lançar novos artistas e lançámos uma open call exclusivamente para esse fim que superou todas as expectativas: recebemos mais de 300 propostas artísticas vindas de todo o lado do país, nas mais diversas áreas, como música, teatro, dança, fotografia, circo e artes plásticas e visuais.
Atualmente, estamos a pensar num ciclo de eventos, para os quais queremos convidar parte desses artistas que enviaram candidaturas, muitas delas fantásticas. Também queremos trazer mais um carácter performativo à “Planta Party”. No futuro, pretendemos criar um projeto que envolva e dê espaço a novas vozes, celebrando desta forma a tal biodiversidade multicultural e artística.
A Safari junta cultura com ambiente. Porque é que decidiste juntar estes dois conceitos e como é que achas que a arte contribui para a promoção da consciência ambiental?
Na minha perspetiva, a cultura e as artes são o veículo mais poderoso na criação de uma sociedade com valores. Faz sentido que a cultura se alie às principais e mais urgentes causas da nossa geração, pelo que é essencial que cultura e ambiente andem lado a lado. Não só por um ponto de vista conceptual, através de conceções estéticas muito ligadas à natureza na sua força, como os ecossistemas e biodiversidade, nas quais a Safari baseia o seu conceito e propostas artísticas, como através de uma ligação mais funcional, baseada na sensibilização. A cultura tem um papel essencial na promoção da consciencialização, social, ambiental, das pessoas, que, mais informadas, inspiradas e conscientes, serão mais ativas no meio em que vivem.
Quais é que consideras serem as principais responsabilidades de um artista na sociedade?
Um artista tem vários papéis na sociedade, associados a pelo menos duas grandes dimensões da arte. Uma, é a dimensão intrínseca, que é a dimensão pura da criatividade e da expressão que recorre a linguagens múltiplas – a música, o movimento, a cor – que não precisa de justificação, porque é uma questão inerente à existência humana: a expressão e a partilha dessa expressão. A busca espontânea pela criação, pela beleza e pela harmonia é um impulso natural. A segunda, é uma dimensão que tem que ver com a responsabilidade de transmissão de valores e com o papel que o artista ou criador tem enquanto líder de opinião na sociedade. O artista é uma pessoa que está exposta e que tem um papel de influência, que deve, se achar que sim, utilizar para se associar a causas, sentimentos e valores importantes para alguém.
A Safari produz concertos, festas, exposições, entre outros, e um dos seus mais recentes eventos foi a “Planta Party”. Podes-me falar um bocadinho mais sobre o seu conceito?
A “Planta Party” é uma festa de entrada livre curada por nós que funciona da seguinte maneira: por cada bebida consumida no bar, plantamos uma árvore no Parque Natural de Sintra-Cascais. É um projeto novo e original nosso. Desde Dezembro, já organizámos três edições, sendo que a última foi em Março, e a ideia é aliar música, copos e pessoas em torno da defesa do clima, de forma a tornar “cool” a causa ambiental, enquanto geramos, todos, ganhos concretos para o meio ambiente com a plantação de árvores. Das primeiras duas festas resultaram 450 árvores, que já foram plantadas. As da terceira estão a ser contabilizadas. Com a quarta edição, esperamos vir a ter mais de 1000 árvores plantadas.
A “Planta Party” procura promover o ativismo enquanto um modo de vida necessário e apelativo, já que há frequentemente uma ideia errada e pouco “estética” do ativista. Às vezes parece haver uma ideia de que quem é “cool” não quer saber, ou não se envolve em causas, mas não. É ao contrário. Há formas diferentes de nos unirmos e de lutarmos pelas causas nas quais acreditamos. É essencial ser consciente para ser “cool”.
O que é que consideras que é necessário ser melhor desenvolvido em Portugal em termos artísticos e ambientais?
Considero ser importante mencionar que se têm feito coisas fantásticas em Portugal. Há projetos culturais únicos à escala mundial, há muitos movimentos novos de interligação entre causas artísticas, culturais e outras causas sociais, e as questões ambientais têm ganho terreno, muito em parte devido à mobilização internacional a que se tem assistido nos últimos tempos. Essa mobilização acontece em parte graças ao mediatismo de figuras como, por exemplo, a Greta Thunberg, e tem gerado duas reações distintas; uma de rejeição instantânea e outra de apoio. Apesar de esse apoio ser muitas vezes superficial, a sensibilização ambiental faz-se gradualmente, ou seja, a sensibilização é uma coisa constante, como a educação, que não acontece de um momento para o outro.
Um dos nossos próximos projetos prende-se, aliás, exatamente com a questão da educação. Estamos a organizar uma série de aulas que vão ser facultadas pelos membros da equipa em parceria com a Cascais Ambiente, nas escolas básicas e secundárias do concelho de Cascais, em que vão ser postas em prática conversas com os alunos sobre o clima. E também queremos passar da teoria à prática; um dos nossos objetivos é envolver os alunos e professores nas nossas sessões de plantação pós – “Planta Party”.
Em que é que estas a trabalhar atualmente?
Estou a acabar a tese de mestrado, na área de gestão cultural, que defendo em Junho, a arrancar a produção do “Festival Todos” e a antecipar o “Boom Festival”, que é já em Julho. Continuo a trabalhar nos próximos eventos da Safari – “Planta Party” em Lisboa e em Bruxelas, com a Radio Frappè. Estou, com o Hugo Mamede, a pensar no próximo ciclo “Cavalo de Tróia” e a encontrar cada vez mais um enorme prazer na escrita, e ainda estou com ideias para um novo projeto de investigação a começar no final deste ano, vamos ver.