Regresso depois de alguns anos em silêncio a estas crónicas na Mutante Magazine. Regresso porque é o momento certo para o fazer, e escrever sobre cinema, e o que nos atormente, nos absorve, nos rodeia, a pandemia alterou os nosso hábitos sociais, dos contactos, mas o cinema, sempre conseguiu contornar estes obstáculos.
Existem muitos filmes que abordam, ataques virais, pandemias, ataques biológicos, não é de agora que muitos cineastas abordaram este tema de catástrofe.
Através de filmes dos anos 30, 40, 50 e posteriormente, foram sendo abordados pelos cineastas as mais diversas pragas e pandemias que nos afectaram enquanto comunidade global.
Muitos não deverão se recordar de filmes deste período do cinema série B, em que os cineastas abordaram a varíola, lepra, ataques biológicos, todos eles com o tom de cinema noir de baixo orçamento, mas tendo sempre como fundo o virus a pandemia a cidade e o pânico causado, por esse monstro invisível.
Recordo este clássico dos anos 50 um noir pandémico centralizado em Nova Iorque, The Killer That Stalked New York, pelo nome somos induzidos em erro, pensando nós enquanto espectadores, que é somente um filme de gangsters, não estariamos mais errados com esta permissa, realizado por Earl Mcevoy e baseado num artigo escrito na revista Cosmopolitan por Milton Lehman, a protagonista a actriz Evelyn Keyes é uma contrabandista de diamantes que regressa a Nova Iorque depois de ter viajado de Cuba.
Ao chegar sente-se doente, e é ajudada por um policia que a leva a uma clínica, lá o médico faz o diagnóstico errado e a protagonista regressa a casa não sabendo que está infectada com varíola.
O número de infectados com varíola começa a crescer na cidade e as autoridades locais decidem vacinar a população para evitar uma epidemia, mas rapidamente ficam sem as vacinas, provocando o pânico e histeria na cidade .
Esta é a sinopse do filme, a realidade é visivel, não obstante existir uma vacina, o pânico é causado por esta não ser suficiente para todos , e também por um mau diagnóstico… onde é que nós já vimos isto , temos as vacinas uns tomam em detrimento de outros , temos os meios que são usados de forma errada e pouco clara, e temos o pânico gerado pela comunicação social, tudo isto vivemos no presente.
O filme é actual, aqueles que continuam a negar a existência de uma pandemia, poderiam relembrar-se de situações ocorridas no passado, o esquecimento e a amnésia faz parte de nós, mas uma amnésia diria quase global é uma outra pandemia, essa que nem com vacinas irá ser erradicada.
Temos o cinema para nos contar estas histórias, temos o cinema para nos apresentar factos reais, temos o cinema como fio condutor de informação sobre este tema e outros, temos o cinema para nos confrontar com o real e o que é ficção.
Não podemos dissociar estas alusões, a humanidade sempre viveu com epidemias, pandemias, vírus, bactérias, as pessoas esquecem-se porque faz bem esquecer não recordar episódios horrendos da história da humanidade, mas o cinema existe para este questionar, porque nós seremos sempre o fio condutor de qualquer vírus ou bactéria.
O cinema pandémico, esse cinema de catástrofe, viral, conta-nos as histórias de inumeráveis batalhas travadas contra um inimigo invisível, os negacionistas também são personagens cinematográficas, essas mesmas personagens que muitas vezes acabam por colapsar perante a sua negação da evidência, e os outros… os outros somos todos nós que cá vivemos, eu, tu, nós… e não nos livramos desta existência em comum nem de epidemias nem pandemias, os outros são somente outros… no cinema os outros são aqueles que em silêncio ou com voz activa chamam-nos à razão… e essa razão no cinema como na vida é sobreviver!