Produção, Criatividade, Palcos. Qual o futuro da cena musical? / Toni Fortuna

Tédio Boys, M’as Foice, Mancines, D3ö… Mr. Toni Fortuna. Detentor destes ilustres projectos no seu portfólio, para quem segue a música independente e alternativa bem de perto, desde há muito, é nome obrigatório. Conimbricense de gema, a sua música extravasa os limites da sua cidade matriz e das nossas fronteiras físicas.

É inevitável falar de Paulo Furtado, Sérgio Cardoso, Carlos (Kaló) Mendes ou Victor Torpedo, quando queremos falar dos inícios de Toni Fortuna na cena musical; ou não fosse ele um dos míticos Tédio Boys que, para quem como nós Mutantes teve a sorte de os ver tocar ao vivo e a cores, em Coimbra, marcaram para sempre e são inesquecíveis para a memória visual, física e auditiva, pela sua importância na história do rock(abilly) nacional.
Mais recentemente, Mancines e D3ö são os dois projectos onde podemos ver um Toni Fortuna ainda mais músico, com um trabalho de bitola bem calibrada e que não desilude, edição após edição, em cada um dos projectos – tão díspares na estética e tão consistentes -, ou melhor dizendo, em todos os projectos que se envolve, na música, onde a sua dedicação é a 100% e onde a sua identidade nunca desvanece.
É com Toni que hoje mergulhamos nestes últimos pandémicos meses da nossa tão recente memória.

Se te pedisse para escolheres uma nota musical ou frequência hertziana ou um valor em decibéis para resumir estes últimos 12 meses, qual seria e porquê?
(TF):
Eu escolheria a nota Sol (G) por ter sido uma das coisas que mais falta senti nestes últimos 12 meses.

Houve tranquilidade e disponibilidade – física e mental – para pôr em prática o que anteriormente te era quase impossível, como tirar projectos da gaveta ou reorganizar-te?
(TF):
Curiosamente, a questão de ficar em casa não implicou deixar de trabalhar, e por isso acabei por ter ainda mais trabalho, e ter a sensação que se estou em casa terei de estar sempre disponível… Mas ainda assim consegui desenvolver projectos que estavam em standby.

Como encaraste e encaras os concertos em streaming? São de alguma forma um motor para se manter uma certa actividade, te sentires activo?
(TF):
Compreendo os concertos em streaming, quase não fiz nenhum, mas é uma sensação nada natural, tocar para um público que “não está presente” e com quem dificilmente consegues interagir, acho que há realidades que foram necessárias em altura de pandemia, mas espero que o streaming não seja a solução, mas sim uma opção a mais para um concerto ao vivo.

Estás a desenvolver músicas ou produções para a nova temporada pós-confinamento que se avizinha? Se sim, podes levantar a ponta do véu?
(TF):
Tenho algumas coisas projectadas mas gostava especialmente que aquilo que foi desenvolvido e que não teve oportunidade de ser divulgado ou tocado pudesse acontecer.

Como se organiza uma agenda com tantas incertezas e reagendamentos constantes? É exequível programar ensaios, concertos e tours a curto e longo prazo?
(TF):
É difícil a nível prático e emocional preparar concertos, ensaios e tudo ao que isso está associado, quer monetariamente quer do ponto de vista criativo. Mas também não se pode deixar de o fazer ou pensar, mesmo que se tenha de adiar e voltar a organizar.

Sentes que a paragem forçada da cena musical transformou o olhar do público e a mesma passou, finalmente, a ser mais olhada como profissão e não como hobby?
(TF):
Acho que quem sentiu mais a diferença/mudança/transformação foram os que trabalham na profissão, e inclusive tiveram de mudar de ramo para poder pagar as contas, mas espero que de uma forma geral todas as pessoas possam dar mais importância e tenham um outro respeito pelos profissionais da música, tal como os profissionais da saúde (mesmo que por razões diferentes).

Produção. Criatividade. Palcos. Como é a tua rotina de músico e como vês o futuro do teu sector a partir destas três palavras?
(TF):
Eu sou um criativo que me mexo em vários “palcos”, sendo músico, sou também designer, ilustrador, editor de vídeo, professor e mais uma série de coisas que fazem parte do meu universo de criação e por isso, os meus palcos vão variando, a criatividade é usada em várias áreas de produção. Gosto muito do meu trabalho(s), e espero em breve poder voltar a pisar palcos como músico.

Quão desafiante se tornou este último ano no teu percurso enquanto músico? Como geriste a falta física dos teus pares, ao teu lado? O que mais mudou na tua perspectiva sobre o teu trabalho?
(TF):
Foi sem dúvida um grande desafio, mas acabei por desenvolver outras competências, o facto de estar mais “isolado”, por não haver concertos e por isso muito menos ensaios, fez com que tivesse de procurar outros meios para conseguir expressar-me e poder fazer registos. Acho que os meios digitais acabam por ajudar, nem que seja para quando pudermos estar juntos ter mais material para partilhar. •

+ Toni Fortuna
@ Fotografia/ Pormenor (Arquivo Mutante): Toni Fortuna (Mancines, 2015) por Bruno Pires.

Já recebe a Mutante por e-mail? Subscreva aqui .