Festivais Gil Vicente / Guimarães

O teatro contemporâneo manifesta-se na bela cidade de Guimarães a partir de amanhã, dia 02 de junho, e até ao dia 11 de junho, sempre às 19h30, irradiando a sua luz pelos palcos do Centro Cultural Vila Flor (CCVF) e do Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG). Estimulada por “formas de imaginar o fim para lançar outros começos”, a edição de 2021 dos Festivais Gil Vicente (FGV) dá protagonismo às novas gerações e à valorização de novas dramaturgias, apresentando criações da autoria de SillySeason, de Eduardo Molina, João Pedro Leal e Marco Mendonça, de Miguel Castro Caldas, António Alvarenga e Sónia Barbosa, de Lígia Soares, da mala voadora e de Tiago Lima, várias delas em estreia absoluta.

Tudo começa “Fora de Campo” com o coletivo SillySeason. A 02 de junho, no CCVF, esta peça inspirada no universo de “Casa de Bonecas”, do dramaturgo norueguês Henrik Ibsen, recupera os mecanismos das séries televisivas mais comuns, para discursar sobre poder e emancipação. Somos assim expostos à desmontagem do tempo e do espaço através de um dispositivo resgatado ao mundo – a tecnologia audiovisual – que nos impõe a necessidade de decidir onde fixar a atenção, possibilitando ao público vaguear pela construção de um imaginário que dialoga, em permanência, com os acontecimentos em palco. Criada e dirigida por Cátia Tomé, Ivo Saraiva e Silva, Ricardo Teixeira, “Fora de Campo” conta com uma equipa de intérpretes onde constam Ana Moreira, Cátia Tomé, Érica Rodrigues, Ivo Saraiva e Silva, Ricardo Teixeira, Sérgio de Brito e Vítor Silva Costa. 

A ação prossegue a 03 de junho, também no CCVF, para nos transportar para o último dia da democracia. E com a sua extinção desaparece também o acesso a qualquer forma de expressão e pensamento livre. Por consequência, este é o último espetáculo que terão oportunidade de ver. Está assim lançado o mote para “Cordyceps”, espetáculo de Eduardo MolinaJoão Pedro Leal e Marco Mendonça a estrear em absoluto nos FGV 2021, após residência artística em Guimarães, desenvolvido ao abrigo do Programa de Convite à Criação Artística Nacional e lançado pela rede de programação 5 Sentidos, da qual A Oficina é membro fundador. Sem dramatizações sobre o desfecho trágico e inevitável do qual todos faremos parte, o tempo de fruição deste espetáculo terá de ser bem aproveitado e os autores querem que este momento seja uma ocasião feliz, como a despedida de um lugar ao qual nunca regressaremos, onde a política e a ficção, o futuro e o agora, dão origem ao protótipo de uma sociedade distópica. 

Assinada e interpretada por Miguel Castro CaldasAntónio Alvarenga e Sónia Barbosa“A Fragilidade de Estarmos Juntos” é um espetáculo sobre os dilemas que surgem quando se vive casado com a democracia, aqui apresentado a 04 de junho em estreia absoluta em Guimarães, mais concretamente no CIAJG. Abordando temas absolutamente atuais, complexos e estruturantes do nosso futuro coletivo e individual – a democracia, o liberalismo, o populismo e a (re)ascensão de modelos autoritários – “A Fragilidade de Estarmos Juntos” é uma coprodução d’A Oficina, Cine-Teatro Louletano e Teatro Viriato que pretende refletir sobre a forma como olhamos para a posição do outro e a possibilidade (e riscos) da empatia, tentando perceber as oportunidades de participar nessa geração de possíveis. 

Dando um passo em frente rumo à segunda semana desta edição, Lígia Soares apresenta “Memorial” a 09 de junho, pretendendo olhar, retrospetivamente, para o tempo presente. A ela junta-se Sónia Baptista no palco do CIAJG para uma reflexão sobre o facto de sermos reféns do passado que se apossou de nós e nos torna resistentes a uma urgente alteração de referências e comportamentos. Aqui o objetivo não é repetir constantes alertas para o fim dos tempos, para a tragicidade do futuro que nos espera, mas sim imaginar esse ‘depois’ onde o nosso sentido único já se deu como perdido, onde já estamos livres da catástrofe, porque somos a própria catástrofe. 

mala voadora aterra a 10 de junho no palco do CCVF para nos deixar “OFF” numa estimulante viagem sobre o fim. O fim de um ciclo. O fim das nossas vidas, o fim do planeta, o fim de novas ideias, o fim da própria mala voadora. Temas que em 2017 esta companhia teve a ideia de trabalhar em 2020, num espetáculo sobre o fim de tudo, quando este se imaginava mais distante do que agora e com mais garantias de tempo para o inventar. Encenado por Jorge Andrade, com texto a partir de “Dying” de Chris Thorpe, num tempo indefinido que se parece com o nosso, uma mulher lida com o fim. Um espetáculo que se sabe como acaba. E como nada há para inventar temos todo o tempo para festejar. A interpretação de “OFF” e assumida por Andreia Bento, Maria Jorge e David Pereira Bastos.

Depois do fim ou dos vários fins, Tiago Lima aproxima-se para dizer “Ainda estou aqui” no dia 11 de junho, explorando a ideia de devoção ao entretenimento que, associada ao individualismo dos nossos tempos, explica que a solidão pode atingir qualquer um. Este espetáculo, escrito e encenado pelo próprio, é simultaneamente um concerto, contando com interpretação e música ao vivo de Bruno Ambrósio, Débora Umbelino aka Surma, Eduardo Frazão e Rodolfo Major. Este que é o projeto vencedor da última edição da Bolsa Amélia Rey Colaço – iniciativa promovida pel’A Oficina (Guimarães), O Espaço do Tempo (Montemor-o-Novo), o Teatro Nacional D. Maria II (Lisboa) e o Teatro Viriato (Viseu) – tem nos Festivais Gil Vicente a sua estreia absoluta, após um período de residência artística em Guimarães.

A tomar nota de tudo. A ir, em Guimarães! •

+ CCVF
+ CIAJG
© Fotografia: da peça “Fora de Campo”, por Alípio Padilha.

Já recebe a Mutante por e-mail? Subscreva aqui .