“Meu coração emigrou” segundo single de apresentação do mais recente trabalho de Amélia Muge – “Amélias” -, cuja sonoridade se baseia praticamente nas várias vozes e efeitos sonoros feitos por Amélia Muge, no respirar de um canto simultaneamente individual e colectivo, está hoje no ar, na Mutante. Um trabalho surpreendente, a nível vocal, que urge conhecer mais a fundo, mergulhando nestas sonoridades.
O 1.º single “Chove muito, chove tanto” transportou-nos para todo um imaginário de infância em África, onde as memórias dão o mote para toda a recriação de vozes que acontecem a partir de melodia de Amélia e letra de sua irmã, Teresa Muge. “Meu coração emigrou”, que hoje trazemos aqui ao universo Mutante, com letra e música de sua autoria, inspira-se na cultura mediterrânica à qual também pertencemos e remete-nos para um ambiente que evoca os ritmos e as sonoridades da música partilhada pelos nossos cantos tradicionais a vozes no feminino.
A simbologia do coração é recorrente nas canções de literatura oral, estando ele aqui, de novo, personalizado e animado de uma vontade própria. “Meu coração emigrou” partilha, assim, de uma variedade de elementos que reconhecemos como nossos mas, ao mesmo tempo, reinventados quer pelo trabalho vocal quer pela ironia de uma ausência que, sendo do coração, lhe dá um humor que alivia a realidade das ausências, tão devastadoras nestes dois últimos anos. A ausência, a partir deste coração que emigrou, tem aqui, no entanto, o sentido mais geral do que acontece em nós quando longe de quem amamos. Neste caso, acresce o sentido quase paradoxal de podermos estar até longe de nós mesmos.
Com arranjo de José Martins, o responsável também pela gravação e tratamento de alguns sons pontuais que, acompanhados pela percussão de José Salgueiro, criam um discreto pano de fundo para o cenário das vozes.
Um trabalho – o álbum “Amélias” – a ter de ser desvendado e ouvido, de fio a pavio.
Relembramos que Amélia Muge vai subir ao palco do Seminário Maior de Coimbra, pela mão do evento RE/FORMA. •
