Escrita íntima / Arpad Szénes e Vieira da Silva

Em Coimbra, no Museu Nacional de Machado de Castro, permanece a exposição “Escrita íntima: Cartas e desenhos de Arpad Szénes e Vieira da Silva”. Para visitar até dia 17 de Setembro.

Inserida na programação do 7.º Festival das Artes, organizado pela Fundação Inês de Castro, em Coimbra, e numa parceria com a Fundação Arpad Szénes e Vieira da Silva e o Museu Nacional de Machado de Castro (MNMC), inaugurou-se no dia 17 de Julho, em Coimbra, a exposição “Escrita íntima”. A curadoria cabe a Marina Bairrão Ruivo, directora do Museu Arpad Szénes – Vieira da Silva e baseia-se na mostra apresentada em Lisboa, entre Fevereiro e Abril de 2014, precisamente na fundação que se dedica à artista nascida em Portugal e ao artista húngaro. Compõem-na o registo manuscrito de uma correspondência extensa no tempo, bem como um número significativo de desenhos e fotografias que documentam a longa vida que partilharam.

A exposição divide-se em três núcleos temáticos, os quais se acordam com a estrutura organizativa do volume de correspondência com o mesmo nome – Escrita íntima, editado em colaboração com a Imprensa Nacional-Casa da Moeda, tal como inicialmente esclarece Marina Bairrão Ruivo: anos 30 até ao exílio no Brasil; os sete anos de vida no Rio de Janeiro; o período do pós-guerra e o regresso do casal à Europa.

Questionemos: Em que medida pode interessar-nos assistir ao deflagrar de intimidades tão preciosas? “Ma drága bichinha” ou “Anjo da Guarda”, a forma carinhosa com que Vieira se dirigia a Arpad…: “«bichomelancólica» sem o Bicho”, Chat. Realmente, estes endereçamentos serão sintoma do afecto que os uniu por uma vida, mas que reverbera em muitos outros casais certamente. Não fossem Maria Helena e Arpad, ou seja, não se inscrevessem na nossa memória colectiva. Tendo-se conhecido em Paris, o casal foi determinante no apoio a jovens artistas portugueses que em tempos sombrios a essa cidade se dirigiam ou, ainda no incentivo que reservaram a outros e outras cujo trabalho viam em Portugal, e aconselhavam a partir. Por outro lado, a obra que nos legaram assoma nos interstícios da história e continua a assombrar na actualidade.

Se nos detivermos nos desenhos, rapidamente ressaltam, na enleante atenção de Arpad, duas realidades: O abraço que une o casal e o acto de pintar e de desenhar de Maria Helena. Estas realidades parecem-nos apontar tanto para a ternura, como para a intensa admiração que o artista reservava à “inventora do espaço” que foi Vieira da Silva. Tendo em conta a ampla consideração histórica da mulher enquanto modelo-objecto na pintura ocidental, não pode deixar de interpelar-nos a concepção firme de Szénes: Vieira da Silva é no acto de pintar e de desenhar. Espelho de intimidades, estes desenhos são ainda documentos valiosos para a afirmação da mulher enquanto artista, laboriosa paciência de projecções espaciais complexas e profundas.

O desenho é, tal como a escrita, um sintoma de intimidade loquaz – sintetiza uma espécie de polpa de apreensão do mundo, é ressonância, transferidor sísmico da percepção. De Arpad Szénes registe-se uma serenidade evidente no que toca a Maria Helena Vieira da Silva (também fica patente a linha caprichosa na paisagem); de Vieira da Silva um fio de humor que reserva ao quotidiano e a grossura penetrante do seu gesto.

A exposição é para visitar até ao dia 17 de Setembro, no Museu Nacional de Machado de Castro, no Largo Dr. José Rodrigues, em Coimbra. •

+ Museu Nacional de Machado de Castro
© Fotografia: MNMC / Raul Mendes

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