Quem não se recorda desta célebre frase “Ó Evaristo tens cá disto”, de Vasco Santana, no filme “Pátio das Cantigas”, de 1942, realizado por Ribeirinho?
Pois bem, o cinema português de hoje já não tem os Evaristos dos anos 40 do século XX, época de ouro do cinema em Portugal, oriundo de uma mescla de actores do teatro de revista. Este cinema acabou, o cinema evoluiu, mas a visão do nosso cinema continua obsoleta, viciosa, com predominância dos lobbies, das elites…
Por cá temos outras visões, o cinema português foi sempre conotado com cinema de autor, a sua evolução nos anos 1960′ deu-nos a conhecer novos cineastas e, no meu ponto de vista, um cinema mais dito de verdade, raivoso, incisivo… Essa evolução poderia ter conduzido o nosso cinema a um nível satisfatório para a nossa cultura portuguesa e para a afirmação no mundo das artes. Isso não aconteceu.
Hoje temos imensos cineastas, festivais de cinema por tudo o que é cidade e vila, mostras aqui e acolá, exibições, colóquios. E o que se vê? Um campo minado, onde os novos cineastas não têm lugar, um campo minado onde passeia a elite da fotografia e dos eventos das revistas cor de qualquer coisa. Esta desordem cultural no nosso cinema é fruto desta nossa mentalidade – agora entras tu, e depois entro eu. E os outros?
Na cultura, e nomeadamente no cinema português, existe uma guerra civil, por aquilo que é mediévico. O cinema não é isto. Faz-me lembrar aquela célebre fotografia de João César Monteiro em que o próprio utiliza o slogan cineasta cão, em que o cão é o cineasta e o cineasta é o cão…
É desta forma que os ditos que não entram são tratados com discursos pré concebidos, com palavras enferrujadas. Os festivais de cinema deveriam, isso seria o seu principal dever e obrigação, mostrar todo o cinema que se faz por cá, quer seja mau, bom ou mediocre.
Tanta organização ligada ao Cinema, tanta associação defendendo os interesses daqueles que trabalham nesta área da cultura e nenhuma delas defende realmente o cinema e os seus intervenientes. Para que se quer uns prémios da academia de cinema português quando estes premeiam… vocês sabem quem foram os premiados! Para que serve tudo isto? De facto a resposta poderia estar nas palavras ditas de Mário Viegas “Carreirismo” de Mário Henrique Leiria porque, por cá, o carreirismo é profissão.
Mas nem tudo está perdido. Ou supostamente remetido ao nevoeiro. Temos gente capaz de fazer bom cinema. Temos gente capaz de falar verdade e não se enconder atrás de um Dom Sebastião que ainda não regressou. E, sobretudo, esta gente capaz é aclamada no exterior pelo seu trabalho – o slogan vá para fora cá dentro aqui não se aplica, mas sim “Ó Evaristo tens cá disto…?” •
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