Se bem se recorda, na passada Primavera alertamos-vos para um avanço da indústria farmacêutica auditiva que vos iria chegar pela mão de um ilustre esculápio do universo sonoro (e até hoje, o único que se apresenta como Doutor): um EP para ser tomado em jejum ou não, de oito em oito horas ou, em casos mais necessitados, de seis em seis. Efeitos secundários: causa dependência e, por vezes, contagia com riso (todavia, assumimos o risco de nos juntarmos aos demais no anunciar do lançamento deste nada genérico fármaco).
Senhor Doutor, com colete do mais fino corte e de laço ao peito, chega finalmente ao excelso exercício de produzir um fármaco, para os seus mais devotos pacientes e na busca de angariar mais, lançando o ansiado EP de estreia, no próximo dia 31 de Outubro, no Musicbox, em Lisboa.
Este ano conhecemos “Miguel” e ficámos rendidos aqui. Uma homenagem em forma de canção, trazida por Senhor Doutor (ser principal que enverga, aqui e ali, o heterónimo de Jorge Ferreira – Senhor Doutor, Pinto Ferreira, The Guys From The Caravan). Este tema afirmou-se como o primeiro single de um EP que vê a luz neste dia de bruxas, 31 de Outubro pelas 22h30, mas que se celebra na sombra dessa mesma noite. Este Doutor, que é um Senhor, atende principalmente à noite, em palcos/ consultórios distintos, claro.
“Nascido e criado no meio da sobrevivência questionável, aos pré quarentas, este Senhor Doutor vive no sentimento fantasma de pertencer sempre a outro lugar, que por fatalidade nunca irá ocupar.” Um rapaz que fala por todos.
O primeiro single, “Miguel”, assinalava já a deambulação de um doutor que veste fados, bossas e outros roques com um dandismo de rulote e nódoas na jaqueta. Com o EP, a ser lançado na próxima quarta-feira, chega-nos o tema que conta a história daquela manhã, “Quarta-feira”; o segundo single, momento a partir do qual as semanas ficaram amaldiçoadas pela passagem daquela inquietante e, algo irritante beleza, que religiosamente passava ali, aquele dia, àquela hora.
O EP vem confirmar a nostalgia de um Senhor Doutor que se mantém convicto de que um dos seus muitos esquemas, um dia, levará a fortuna e o glamour a bater à sua porta, finalmente. A sua pele do “Chico Esperto” desmedido, da verdadeira “fina flor do entulho” dá a cara pela máxima do “antes parecer que ser”, ao mesmo tempo que reveste quem não sabe redimensionar-se aos circuitos que almeja habitar, nem notar a sua própria atitude desproporcionada.
Entre a estória boémia de “Miguel”, a malfadada sorte de uma “Dama de Honor” que, na sombra, não passa da personagem secundária de um dia de folia, e a sorte furada que é a paixão surgir a uma “Quarta-feira”, meio da semana de trabalho e, portanto, um dia péssimo para se andar distraído com romances, vamos andando pelas canções deste EP, a conhecer as personagens e as desventuras destes relatos dos mais típicos males da vida, ao ritmo de um burlesco optimismo. Sem nunca esquecer o “Simão” que antecede o “Miguel” no EP.
A noite de 31 de Outubro tornou-se, assim, muito simples: tomar um novo fármaco – com quatro músicas alinhadas no EP (fora outras tantas mais que sabemos que tem na algibeira do colete e que esperamos, e desejamos, ver num futuro LP) – em Lisboa.
Se ele é Senhor Doutor de outras cousas e lousas… não sabemos. Para nós, é Esculápio musical altamente recomendável (um lárapio da nossa atenção) e é obrigatório ouvir as suas curas em forma de música. •