Guests about Birds / Seven Years of Luck

Naturalmente, já é certo e sabido, por todos os cautos ouvidos de música nacional, que os conimbricenses (e já internacionais) Birds are Indie decidiram, este ano, fazer festa de aniversário. Celebram “Seven Years of Luck”. Sete é aquele número.

Para celebrarem estes sete anos de existência, com vários EP’s e três LP’s na bagagem (o último com o bónus de um belo vinil), com a sorte que é resultado de muita dedicação e inspiração (e de uma amizade fora de série entre os três), o trio de Coimbra decidiu sacudir as penas, ajeitá-las a preceito e rigor, e organizar uma noite que será, indubitavelmente, memorável. A noite, claro está, será pautada por um concerto numa ilustre casa da cidade, no Teatro da Cerca de São Bernardo, com Pedro Rodrigues a bem receber. O concerto é de festa e por tal convidados terá. Neste ponto, o bando das penas não esteve com peneiras, inchou e convidou, nem mais nem menos, que parte da nata musical de Coimbra: Carlos Mendes (a.k.a. Kaló -The Twist Connection, Bunnyranch, Tédio Boys), João Rui (a Jigsaw), Jorge Ferreira (Senhor Doutor, Pinto Ferreira, The Guys From The Caravan), Jorri (a Jigsaw), José Rebola (Anaquim, Speeding Bullets), Paula Nozzari (a Jigsaw, The Parkinsons, Canja Rave), Pedro Chau (Ghost Hunt, The Parkinsons), Toni Fortuna (d3ö, Mancines, Tédio Boys, é’Mas Foice), Tracy Vandal (Tiguana Bibles, a Jigsaw) e Victor Torpedo (The Parkinsons, Tiguana Bibles, Tédio Boys).


© Birds are Indie by Joana Corker & Francisca Moreira

Nós, Mutantes incorrigíveis, também naturais de Coimbra, decidimos preparar uma surpresa aos Birds que tantas vezes já passaram pela Mutante (e porque gostamos de aventurar-nos em entrevistas menos mainstream). Lançámos o repto a convidados para se deixarem levar em verborreias – eloquência abundante, se preferirem – mais sérias ou não, pouco ou menos extensas, com total liberdade, respondendo a perguntas para uns tais Birds: Joana Corker, Ricardo Jerónimo e Henrique Toscano. Este é o resultado…

Carlos Mendes – Que ilustríssimo filósofo convidarias para conversar e divagar com cada um dos Birds e porquê?
Escolheria, da Grécia Antiga, Diógenes de Sinope [Filósofo que fazendo da pobreza uma virtude, diz-se que teria vivido num barril no lugar de uma casa e perambulava pelas ruas com uma lamparina acesa, de dia, alegando estar na procura por um homem honesto].
Porque tenho a melhor ideia dos Birds e por muito gostar do Jerónimo, do Henrique e da Joana, acho que, da velha guarda, Diógenes era a pessoa ideal para tirar o trio “do sério”.
Os temas dos Birds são quentes. Isto é, agora que ando a ouvir ainda mais músicas do trio, tenho-os uma excelente banda sonora para este Inverno. Consigo imaginar-me a ouvir os temas debaixo dos cobertores e pensar que quero que o Mundo se lixe. Agora, Diógenes não se ia ficar perante tantos temas relacionados com o amor, beijos, melancolia, etc.
Imagino o interrogatório a decorrer dentro do grande barril do velho Diógenes, obviamente sempre de lamparina acesa na mão a tentar encontrar honestidade nos Birds, e a perguntar à Joana se havia necessidade de ir para Cardiff dar uns tais mil beijos ou se o mesmo não podia ter sido feito cá!?
Quanto ao Jerónimo acho que a pergunta seria sobre se já tinha chegado a alguma decisão: deixar ou não deixar “a cidade”!?
Já o Henrique teria que ser questionado se o Crime compensa e o que achava dos seus Partners.

João Rui – Que livro ordenarias que cada um dos Birds lesse (e te apresentasse ficha de leitura no fim) e porquê?
É sempre complicado escolher livros para recomendar. Ainda mais porque nos dividimos entre a recomendação baseada no gosto de quem vai ler ou no de quem recomenda. Ainda assim e sem me demorar, poderíamos começar por obrigar o Jerónimo a ter em casa uma cópia do “Leaves of Grass” do Walt Whitman, para ir revendo o poema “I Sing the Body Electric” (E de preferência uma cópia do livro que contenha uma foto do autor, porque sempre é uma barba hisurta de qualidade para Jerónimo almejar). Para o Henrique nada me satisfaria mais do que lhe recomendar em tom de obrigação o livro “The Box Man” do Kobo Abe: é um livro com sombreados kafkianos acerca de um homem que decide viver dentro de uma caixa de cartão com a qual se desloca para onde quer que vá. Creio que lhe assentaria como uma luva para aquecer os serões deste inverno. E para finalizar recomendaria à Joana a Bíblia (versão King James) e recomendar-lhe-ia a passagem “Job 42:10”. Passagem esta que nem necessito de apresentar porque se explica por si.

Jorge Ferreira – Que medicamento (vitamina, mezinha, antibiótico ou anti-inflamatório) aconselharias cada um dos Birds a tomar e porquê?
Apesar da minha posição como Doutor e Senhor não ser a de diagnóstico ou prescrição, não poderia eu, também, deixar de apresentar o meu mais sincero “bitaite” sobre este bando de três mui prezados pardais à solta.
Assim, para o Jerónimo aconselharia uma deporalina vocal pois, se o rapaz é magrinho, roliça é a presença da sua voz. Certamente que, aqui, dever-se-ia proceder a uma medição ao IMC das cordas vocais e algumas análises, até.
Para a Joana, uma prática e saborosa sopa de cavalo cansado, providenciando todas as bases energéticas necessárias a um belíssimo concerto. Atenção! Efeitos secundários como tonturas e acompanhamento nas muitas divagações do Jerónimo, durante os concertos, poderão ser sentidos. Em caso de persistência dos sintomas, o Toscano ri-se.
E por falar em rir-se, Toscano, um pensamento: “Muito riso, pouco siso”. Ora, o jovem não fala muito, mas ri-se que se farta. Logo, é maluco, sem margem de dúvida. Prescrevo, para o efeito, sessões de trepanação, choques ou exorcismo, até.
No entanto, se o remédio particular é tão distinto entre os demais, na generalidade aconselho-lhes um Imodium Rapid para a criatividade destes rapazes e moça pois, a verdade é que em sete anos de sorte ainda não pararam de c… boa música!

Jorri – Que instrumento(s) farias com que cada um dos Birds aprendesse (em jeito de tortura absoluta ou não) e porquê?
Só vou indicar instrumentos que eu saiba pelo menos arrumar…
Ao Jerónimo dava o contrabaixo para, finalmente, ele ter um instrumento à altura dele. É certo que só tem quatro cordas, mas substituia o ukulele que, é certo, tem um som doce e meigo, mas isso é porque é uma espécie de guitarra para anões e eles não podiam acordar a Branca de Neve. Já o contrabaixo é um instrumento para homens de barba rija e com a barba o Jerónimo tem… e mais não digo.
Para o Henrique talvez a auto-harpa. É de cordas (e tantas que tem), tem botões e dá cabo dos dedos. Esta podia ser a descrição do instrumento, mas na verdade é porque é um instrumento que necessita de paciência e carinho; são 36 cordas que necessitam de ser soltas e esticadas, e 21 botões para acarinhar. Tudo isto para sair um som de embalar e não há nada como ir treinando o embalar… e mais não digo.
Finalmente para a Joana, talvez o Harmonium, nas suas várias versões, acústicas ou eléctricas. Primeiro que tudo, é um instrumento que funciona a ar, seja ele dado mecânicamente por nós, seja por um pequeno motor, ar esse, que é o elemento preferido dos Pássaros, por isso gostava que a Joana se sentisse em casa. Além disso o Harmonium é uma espécie de neto do acordeão e do orgão, e tocando a Joana os dois, nada melhor do que aprender a tocar um que junta os dois… e agora é que não digo mesmo mais nada.
Abraços e Beijinhos de Parabéns.


© LP’s já editados pelos Birds are Indie

José Rebola – Que músico ido imaginarias a desafiar cada um dos Birds para uma troca de acordes em palco e porquê?
Só contam músicos mesmo idos ou aqueles que já faleceram e ainda não sabem? A pergunta assim fica mais difícil…
Penso que emparelharia o Jerónimo com o Johnny Cash por uns segundos, só para ver quem é que tem a voz mais grave. Depois, com mais tempo, talvez o pusesse em palco com o Nick Drake. Penso que a capacidade de nos transportarem para um lugar pacífico, quando cantam, iria resultar em algo de mágico. Assim uma cena muito detox.
A Joana talvez combinasse bem com o Ravi Shankar e o Mark Sandman dos Morphine, pela capacidade de pintalgarem um panorama com a beleza da simplicidade, vocal ou instrumental, de trazerem para a visibilidade o essencial, que é de outro modo invisível aos olhos.
O Henrique juntava-o ao Yann Tiersen se pudesse ir ao mundo dos vivos roubar pessoas, mas na premissa da pergunta ia buscar o George Harrison. São pessoas que percebem bem as peças todas de um puzzle musical e as conseguem combinar de maneiras únicas. Acho que seria interessantíssimo dar peças aos três e ver que puzzle saía.
No fim, fazia batota e juntava a Kymia Dawson a esta gente toda! E assistia durante nove horas, enquanto o Fidel Castro discursava no Palco 2.

Paula Nozzari – Que cidades do teu Brasil darias como terapia cómica de férias (tu também irias para garantir o registo) a cada um dos Birds e porquê?
O Henrique, levaria para o Carnaval em Salvador, na Bahia! Como terapia de férias, ele ficaria 12 horas dançando axé music em cima de um trio elétrico, num calor infernal, sem direito à água de côco, claro. Tem que ter feijão!! Seria a superação máxima, especialmente para quem sofre de queda de tensão!
Entretanto, depois que vi os dotes dançantes deste Periquito Indie, o carnaval baiano correria o risco de nunca mais ser o mesmo. Provavelmente, mudariam o tradicional “o que é que a baiana tem?’ para “o que é que o Bird tem?
Para a Joana, como boa vegetariana que é, indicaria uma terapia de choque: dormir alguns dias no acampamento do Parque Harmonia, em Porto Alegre, durante a Semana Farroupilha! Entre cavalos, cães, fogueiras, homens e mulheres com roupas típicas, e ao som da música tradicional do Rio Grande do Sul, a Passarita teria que suportar o cheiro do típico e sangrento churrasco gaúcho que, nesta ocasião, é feito todos os dias, de sol a sol, durante um mês!
O Jerónimo, levaria para um Ritual Xamânico na Floresta Amazônica. Ele beberia 100 ml de Ayahuasca (ou Sando Daime), um chá poderoso feito a partir de um cipó e da planta chancrona! Ah, esta bebiba é autorizada e regulamentada pelo Conselho Nacional de Políticas Sobre Drogas e permitida em cultos religiosos. Neste ritual, a combinação do chá e da música xamânica causa alterações de consciência e, provavelmente, problemas estomacais. Quanto maior o problema estomacal, maior a limpeza espiritual, sendo assim, depois de uma descarga das boas, o Beard Bird ficaria livre, e leve para voar!


© Birds are Indie by Joana Corker & Francisca Moreira, (Pormenor)

Pedro Chau – Que restaurante de Coimbra seria mesa de alpista perfeita para levares cada um dos Birds a jantar e porquê?
Na verdade, não creio que algum restaurante de Coimbra me tenha deixado babado nos últimos tempos, portanto, o mais certo era trazer os ‘pássaros’ a jantar a minha casa e provar um assado de seitan e batata no forno com especiarias e algum picante. A acompanhar, provavelmente, seria um vinho tinto alentejano ou chá verde para quem não bebe alcool. Banda sonora estaria entregue a Little Walter, Howlin’ Wolf, Etta James, Big Maybelle e algumas bandas sonoras de filmes dos 70’s. Estaria, claro, aberto às sugestões musicais deles, caso quisessem mostrar alguma coisa.

Senhor T Fortuna – Que filme (clássico ou contemporâneo) levarias cada um dos Birds a ver e porquê?
Respondendo à tua pergunta para os sete anos dos Birds are Indie, neste momento eu diria que, por analogia e numa associação rápida, levaria a Joana a ver o “The Birds” do Hitchcock, o Jerónimo o “Maltese Falcon” do John Huston, e o Henrique o “Three Strangers” do Jean Negulesco.
Poderia justificar as escolhas, mas foi mesmo por analogia ao Birds e não às pessoas, sendo que são todos filmes icónicos, só o “Three Strangers” não tem analogia ao nome, mas é um filme não muito conhecido, com actores ilustres, e os nossos pássaros de desconhecidos entre eles não têm nada.

Tracy Vandal – Que Bird usaria o Kilt, que Bird faria a dança tradicional e que Bird tocaria a gaita-de-foles da tua Escócia e porquê?
Eles que esqueçam usar o que quer que seja, qualquer coisa, especialmente roupa escocesa e toquem todos, os três, gaita-de-foles como vieram ao mundo, nus. Mas porquê esta pergunta a mim? Pessoalmente acho que, em vez do que acabei de dizer, deviam era acender uma fogueira no palco e dançar sobre ela completamente nus, como é a tradição na Escócia e, talvez e acima de tudo,… nada melhor para parar uma pessoa chata do que o instrumento mais irritante feito para o homem! Há que dizer não a Kilts, gaita-de-foles e especialmente à dança tradicional… a menos que a palavra “nu” apareça mencionada. Aí, então, é engraçado. Love, Tracy.

Victor Torpedo – Que venerado mestre da pintura atribuirias a cada um dos Birds para ter um retrato real e porquê?
Vamos lá então dar Arte à vida dos nossos Birds. Acreditem que tive imenso trabalho em ser sucinto, que a resposta já dava para duas páginas e isso não é bom para a saúde.
Vamos então ao que interessa. O nosso bird Jerónimo tinha de ser tocado pelas mãos de George Maciunas, o grande mentor do movimento Fluxus, pois com Fluxus há um retorno a questões como: O que é um artista? Qual o valor da obra de arte? Quem faz arte (precisa de ser artista)? O trabalho de arte tem que ser um objeto?
Uma filosofia entre a arte e a vida. Algo de difícil definição.
O Jerónimo não pode ser desvendado no encanto simples de uma tela, será algo mais. Um documento ou mesmo um jogo com peças desarrumadas (como a famosa raquete de ténis de mesa de Maciunas, onde a função é retirada e a joke e o jogo toma formato. Um buraco no centro da raquete de ténis de mesa torna o jogo mais interessante). Ele teria que ser vítima de um espontâneo artístico, não retocado onde existia desconstrução de sintonia e da ordem em favor da rotura. Jerónimo é Fluxus.
O mundo precisa de heróis, precisamos mais do que nunca de ser protegidos e de ser acarinhados, mesmo que seja por forças exteriores. O Toscano é um Bird muito especial, talentoso e leve no toque. O artista do Toscano é o Daniel Johnston, tem que ser. Pois Daniel é um enigma, um adolescente reclusivo e uma lenda viva da cultura popular. Dono de uma invulgar capacidade artística, criando filmes em Super 8 e bandas desenhadas na cave de sua casa. Eu sei que não parece uma forma produtiva de contribuir para a sociedade, mas o que seria do mundo sem heróis protetores como o nosso Capitão América ou Gaspar The Friendly Ghost? Daniel vs Toscano… Por um mundo melhor.
A nossa Bird de coração, Joana é um puro David Hockney. Há aqui um toque britânico na Pop Art, pois Hockney é Pop: pinta piscinas, amantes pelados, florestas entumecidas de cor. É Pop porque é intrigante, desenha o Photoshop e com 70 anos usa e abusa das plataformas novas como o iPhone, para criar. Mas classificá-lo somente como Pop esvazia as latas de tinta de uma das mãos mais ácidas da pintura contemporânea. Hockney é o artista da Joana porque Hockney pintou sobre a vida e não há nada mais irónico que a vida.
Beijos para os Birds.


© Maciunas, Johnston, Hockney. Imagens escolhidas e enviadas por Victor Torpedo

E não podíamos deixar de indagar quem “dará” casa para os aniversariantes fazerem a festa…

Pedro Rodrigues – Que peça de Gil Vicente meterias cada um dos Birds a viver e porquê?
Ao Henrique, com todo o respeito, sugiro o “Auto da Índia”. Mesmo entre casais felizes e harmoniosos, há sempre lugar para um Lemos, sobretudo se souber cantar: “Suba quem é.”
Ao Jerónimo, pelas barbas e pela sageza, indico o lugar do Diabo, comandante da “Embarcação do Inferno” em que vamos navegando. Com esperança de que não se esqueça de nenhum dos meus pecados e continue a levar-nos para locais quentes e confortáveis.
À Joana – “oh minha alma e minha dor, quem vos tivesse furtada!” – é Moça que inspira os melhores poemas d’”O Velho da Horta”: “Quisera que esses amores / foram perlas preciosas / e de rubis / o caminho por onde is, / e a horta de ouro tal, / com lavores mui sutis, / pois que Deus fazer-vos quis / angelical. Ditoso é o jardim que está em vosso poder.

Da nossa parte, ficam os parabéns aos Birds are Indie e que continuem a manter Coimbra na ribalta como uma cidade da e de música.
Este será, assim e sem margem para dúvidas, um concerto de aniversário a não perder, no próximo dia 18 de fevereiro pelas 21h30 (não se atrase), no Teatro da Cerca de São Bernardo, em Coimbra. Daqui a uns dias, dar-vos-emos novidades de concertos já agendados deste trio para os próximos meses. Até lá, é reservar este dia na agenda para ir festejar “Seven Years of Luck”! •

Concerto “Seven Years of Luck”/ TCSB
Birds are Indie
TCSB
© Imagem de destaque: Pormenor do cartaz de divulgação do concerto “Seven Years of Luck”.

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