Tó Trips… Tó Trips é daqueles músicos tão imensamente cheios que nos deixam tão perdidamente vazios de palavras, mesmo que para uma brevíssima introdução, de um singelo questionário de oito perguntas bem directas. Tó Trips é senhor das cordas das guitarras, dono de um dedilhar que nos faz desfocar o olhar e, sempre que toca, a guitarra é ele próprio, na curvatura do corpo que a protege.
Dead Combo é, talvez, o nome que mais rápido associa a este aclamado, respeitado e reconhecido veterano músico da cena musical. Dupla que, em tempos, alinhou na entrevista mais rápida e out of the box, da Mutante, (apenas e só sete minutos), em que nos disseram que se fossem música de fusão com gastronomia seriam uma bifana e uma imperial – indiscutível fusão para palatos Mutantes exigentes.
Tó Trips, virtuoso músico, foi umas das vozes que fez soar bem alto a sua sentida e verdadeira indignação face à forma como a Cultura, no seu todo, é vista e tratada. Consciente – e sofrendo também ele as consequências – de ser todo um sector profissional que ainda não é visto, por todos nós enquanto sociedade, como tão necessário como um arquitecto, um advogado, um enfermeiro – ou não nos arquitectasse, a música, cenários, nos desse direitos a ser pops e nos curasse maleitas. O seu curriculum é vasto, (re)conhecido além fronteiras, a solo ou em parcerias e a sua música é sempre e absolutamente viciante. Eis uma rápida reflexão sobre os últimos 12 meses, por Tó Trips.
Se te pedisse para escolheres uma nota musical ou frequência hertziana ou um valor em decibéis para resumir estes últimos 12 meses, qual seria e porquê?
(X): Escolhia uma frequência grave! Porque sempre gostei de sons graves, porque são mais pesados e mais espaciais mais cheios! Sempre fui um tipo que não se deixa ir abaixo facilmente! Mas os graves sempre foram boa companhia.
Houve tranquilidade e disponibilidade – física e mental – para pôr em prática o que anteriormente te era quase impossível, como tirar projectos da gaveta ou reorganizar-te?
(X): Foi tempo de olhar para o meu percurso, de pensar o que fiz estes anos todos, aproveitar algum material fotográfico e textos, e agrupá-los num livro que irá sair no final do ano/ princípio de 2022; tenho dois discos feitos, um a solo que está a ser finalizado e um pronto a sair dos Club Makumba. Foi um tempo rentável no que respeita a processos criativos. Também sou um gajo que não consegue estar parado, somente na praia ao sol é que gosto de não fazer nada de nada!
Como encaraste e encaras os concertos em streaming? São de alguma forma um motor para se manter uma certa actividade, te sentires activo?
(X): Para mim um concerto é uma celebração. A música tem sempre pessoas lá dentro, seja como artista, seja como público, gosto de sentir as pessoas à minha volta.
Os streamings é só uma forma de mostrar aos outros que andamos por cá, mas chega disso porque não tem nada a ver com a experiência de ir a um concerto. Fiz alguns, mas não sou fã!
Estás a desenvolver músicas/produções ou programação para a nova temporada pós-confinamento que se avizinha? Se sim, podes levantar a ponta do véu?
(X): Tenho vários cine-concertos com o filme do Rodrigo Areias “Surdina” do qual fiz a banda sonora em várias salas do país e alguns concertos a solo.
Como se organiza uma agenda com tantas incertezas e reagendamentos constantes? É exequível programar ensaios, concertos e tours a curto e longo prazo?
(X): “Enquanto houver estrada para andar, nós vamos continuar!” Como canta o nosso amigo Jorge Palma! Em relação a tanta incerteza: “É difícil! é difícil!” como cantavam os Censurados! Mas vamos passar isto. Tenho essa fé!
Sentes que a paragem forçada da cena musical transformou o olhar do público e a mesma passou, finalmente, a ser mais olhada como profissão e não como hobby?
(X): Esse olhar tem a ver com meio século XX, aqui fechados no tempo do outro senhor. Esses estigmas demoram muito tempo para passar. Sim, talvez, espero que sim, estamos aí para ver! Um dia apanhei uma boleia de um camionista que me perguntou o que eu fazia, disse lhe que era músico, ao qual ele comentou: “epá ! vida de músico, não têm que trabalhar, é só curtir!“…
Produção. Criatividade. Palcos. Como é a tua rotina de músico e como vês o futuro do teu sector a partir destas três palavras?
(X): Como tenho três filhos e vivo disto, tenho que encarar com optimismo o futuro; aliás, não tenho outra hipótese! Sempre houve muitos bons músicos/ técnicos/ produtores em Portugal! Gentes com ideias, profissionais da cultura válidos em qualquer parte do mundo. É só deixá-los trabalhar e o futuro acontece.
Quão desafiante se tornou este último ano no teu percurso enquanto músico? Como geriste a falta física dos teus pares, ao teu lado? O que mais mudou na tua perspectiva sobre o teu trabalho?
(X): A minha maior falta realmente são as pessoas, a estrada, as celebrações, o estar junto com os outros, os técnicos os roadies, road managers, com o público, com os barmen e com todas as pessoas que fazem ser possível acontecer Cultura neste País.
Por vezes é preciso haver coisas que vêm pôr ao de cima o lodo que já estava instalado há muito! Há que ver as coisas numa perspectiva de mudar para melhor, não cometer os mesmo erros do passado. Assim o espero! •