Uma das prendas de Natal de 2013 foi, para nós na Mutante, um convite para jantar e falar com e sobre Ricardo Dias Ensemble. Hoje, é dia de voltar a falar neste grupo.
Ricardo Dias Ensemble é novo Fado. É mais do que Fado de Coimbra. É música portuguesa, de excelência, que tem nas suas raízes, inegavelmente, a Canção de Coimbra. Os Cinco na Coimbra Contemporânea, como os baptizámos, têm em Ricardo J. Dias o seu diretor artístico, que soube reunir este quinteto ímpar.
O álbum de estreia deste Ensemble é um alinhamento de 12 músicas, novas viagens por clássicos que são trabalhados com nunca tinham sido, com a mestria de quem sabe o que faz. Estamos a falar de Ricardo J. Dias – (acordeão e piano / diretor musical de Cristina Branco e produtor de vários cd’s distinguidos com o prémio José Afonso), Ricardo Dias (guitarra de Coimbra / renovador das suas sonoridades), Bernardo Moreira (contrabaixo / referência no Jazz europeu traz ao Ensemble a sua experiência nos mais diversos projetos), Ni Ferreirinha (viola / papel preponderante no desenvolvimento do Fado – Canção de Coimbra) e José Vilhena (voz / timbre reconhecido que dá corpo a alguns dos mais belos fados de Coimbra).
A viagem começa com “Saudades de Coimbra” num piano só e tão cheio que sabe fazer o silêncio para entrar aquela que é, para nós, uma das melhores vozes do Fado de Coimbra e que consegue, aqui, ter nova voz sem baixar a bitola à qual se juntam, mais à frente no compasso da música, os outros mestres com suas cordas afinadas. A música de uma cidade vive, novamente. Seguimos para o primeiro momento instrumental com “Sede e Morte“, do imenso Carlos Paredes, onde a guitarra de Coimbra ganha todo o seu corpo que se enlaça nos demais que a acompanham sem ninguém ser menor, deve ser a sede (d)e morte de se ser assim, perfeito na música. E “Tenho barcos, Tenho Remos” de José Afonso com um piano, um contrabaixo e uma voz, e é tudo o que é preciso para se rumar aos “Verdes Anos/ Canto do Amanhecer” de Paredes, com a respiração perfeita de Ricardo Dias e o tempo certo de Ni e Bernardo. Passadas quatro músicas, podemos dizer-lhes que entreguem a tese que estão prontos para defender perante o júri – (perdoem, caros leitores, mas há que puxar a brasa à Coimbra dos estudantes). Os “Olhos Claros” anunciam a “Balada de Outono” com a doce lírica de José Afonso que, também ele, a Coimbra pertenceu e a quem José Vilhena dá agora voz. Sem parar e nem adormecer, que venha a “Dança” porque os dedos de Paredes dançam agora nas mãos destes músicos, de forma exímia, numa renovada e contagiante dança, hoje, acompanhada de um acordeão. “Homem só, Meu irmão” da pena de um incontornável de Coimbra de nome Luiz Goes e, muito provavelmente, a mais bela canção de doce embalo portuguesa – “Canção de Embalar“, de José Afonso. E que “Inquietação” este álbum que se ouve. Temendo cair num gongórico artigo, seguimos sem mais para “Ré Menor” porque é obrigatório viajar até Gonçalo Paredes (avô de Carlos Paredes), indubitavelmente, se se quer estrear em grande num novo tocar e cantar de Coimbra, que está acompanhado de um trompete (João Moreira) e de um contrabaixo que sabem ser e existir além do jazz. O júri, será o público que ouvirá este álbum. Porém, por universos Mutantes passamos este novo projeto de música portuguesa com louvor e distinção, temos um Ensemble com provas dadas. Mesmo a quem não tem no Fado de Coimbra um gosto, não deixe de ouvir. Ricardo Dias Ensemble vai além de um Fado, de um jazz. É música contemporânea com raízes seguras.
A seleção dos temas (re)interpretados: é sábia. A (nova) sonoridade: é superlativa. O álbum já se encontra disponível para compra aqui e, também, aqui . A nossa entrevista aqui. Bons sons, a ter de ouvir! •