“E eles tinham coisas para me dizer…” / Vasco Araújo no CAV

Em Coimbra, permanece no Centro de Artes Visuais (CAV) uma das várias exposições em curso de Vasco Araújo: “E eles tinham coisas para me dizer…” Um rastro de dez anos de criação.

Entre 4 de Julho e 4 de Outubro, o que perfaz três meses, podemos visitar a exposição intitulada “E eles tinham coisas para me dizer…”, de Vasco Araújo, residente no CAV, em Coimbra, e com curadoria de Albano Silva Pereira. Registe-se, antes mesmo de nos determos no conjunto de obras aqui reunidas, a subtil elegância desta exposição: existe como que uma respiração entre as diversas propostas, que convocam um percurso criativo ido de 2004 a 2014. Dez anos, portanto.

Vídeo, fotografia, instalação e uma visão essencialmente escultórica: será o que encontramos em “E eles tinham coisas para me dizer…” Vasco Araújo é um artista com uma compulsividade criadora vertiginosa, e de estratos, de que destacaríamos o intuito palavroso, bem como uma problematização crítica de aproximação ao real, tanto presente, como passado. Assim, também aqui assinalamos as camadas arqueológicas que se marcam numa aparente superfície, bem visíveis em Detritus (2011): as aberturas em primeiro plano são, afinal, pórticos sucessivos de passagem para anterioridades evidentes.

Então, está notavelmente estabelecida uma imagem dialéctica frutífera: a superfície é simultaneamente o lugar da maior profundidade, abismo sintomático. De abismo em abismo, as portas da própria percepção vão sendo alargadas e alagadas à medida que fruímos, tendo como horizonte auditivo um carreiro melodioso que se deslarga de Insula (2010), significativa fuga expressiva que nos posiciona nos limites da própria linguagem. Mas também a nostalgia pela reconstituição de um logos, presente em Hereditas (2006): na soberania da floresta recorta-se uma menina que esgravata a terra e acumula algo que compreenderemos mais tarde, quando, na solidão do edifício, e após uma espécie de ritual de passagem (novamente as passagens, os pórticos sucessivos), à medida que abre e fecha portas, se detém numa sala e tenta reconstituir um esqueleto humano. Este deverá ser considerado símbolo de um sentido numa paisagem despida; e que seja uma criança a desvelá-lo, será importante. Os estratos… Em Epílogo (de 2011 a 2012): diálogos ficcionados a partir de pedaços de falas de vários filmes, ou uma estratificação da memória, em que o cinema penetra e modela, enxerta, o quotidiano. “Toda a gente tem medo”, diz-nos ali Greta Garbo; medo da morte? E Caixão (2004). Medo de perder-se…com o resto? E Acting (2008). Ou medo do desejo de ser diferente daquilo que eras? E Acting (2008), novamente.

Numa sala do piso superior, termina, ou começa, esta exposição: com La Chute vers… (2014). Diálogo entre a Europa e o Trovão, a partir de “Diálogos com Leucó” de Cesare Pavese, e alternando uma voz feminina e uma voz masculina, bem como a luz e a escuridão. As palavras: iluminam?

A ser visitada no Pátio da Inquisição, todos os dias entre as 14.00 e as 19.00, excepto às segundas-feiras.

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© Fotografias: CAV

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