Não éramos assim tão diferentes.
Eu gostava de coisas que não se viam “à vista desarmada” enquanto tu dominavas os microscópios. Eu tinha uma admiração por deuses e tu, sem os veres, respeitavas isso em mim. Tu observavas átomos e moléculas, e eu, sem nunca os ter visto, respeitava-te e acreditava em ti. Optei por Artes e tu Ciências, e isso influenciava as diferentes formas de vermos o mundo. Mas, quando queríamos ver o que realmente importava, olhávamos ambos (e ao mesmo tempo) para o local certo: nos olhos um do outro. Por isso, acho que éramos praticamente iguais. Nos olhos um do outro, finalmente chegávamos a casa. Conversávamos, discutíamos e éramos felizes.
«Tenho o coração apertadinho» dizias-me, quanto estavas triste. Muito triste. E ainda mal acabavas de o dizer já o meu contraia e diminuía. Acho que em criança lidamos melhor com a dor. Talvez porque simplificamos o complicado e criamos enredos e histórias para o que é aparentemente simples. Equilibramos as coisas, portanto. O mundo precisa de equilíbrio.
Não é por acaso, que os adultos têm uma certa “mania”, de colocar às crianças questões, para as quais poucos têm respostas. Como a habitual e sempre recorrente: “o que é o amor?”. Depois riem-se, surpreendidos com as inesperadas respostas, que originam inclusive, artigos e reportagens. Na verdade, acho que sentem admiração – e eventualmente inveja – de tanta genuinidade. Ou será genialidade?
Em criança achava que “o amor é quando duas pessoas decidem ficar velhinhas juntas”. Ainda acredito. Depois de te ver tantas vezes com o coração nesse estado, chorando, queria voltar a ser criança, escolher “o queria ser” e poder ser o que quisesse. Então, decidiria ser cirurgião, abrir-te-ia o peito, e beijar-te-ia no coração. Tenho a certeza que a dor passaria. •
© Ilustração: Sandra Sofia Santos .
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