Dubai, o Emirado Árabe que muitos crêem ser um país é, na verdade, um lugar surreal, difícil de explicar e, mais ainda, de compreender. Um projecto megalómano? Um capricho dos sheyks? O paraíso na terra? Ou um espaço artificial, paradoxal, sem alma ou identidade?
O Dubai pode ser um pouco de tudo isto. É, certamente, o destino mais nonsense que visitei.
O investimento feito em pouco mais de quatro décadas
conduziu à transformação de uma banal vila de pescadores
num destino turístico (e de negócios) luxuoso,
dirigido a uma elite mundial que ali se refugia
numa bolha de ar imune às realidades distantes.
Praticamente sem história, sem raízes, sem grande identidade, mas repleto de recordes Guiness e outras medalhas de trazer ao peito, o Dubai conta com os maiores centros comerciais, os mais altos edifícios, as mais prestigiadas marcas e empresas. Tudo de topo. E é do topo do Burj Khalifa, o mais altaneiro dos arranha-céus, com 830 metros e quase 170 pisos, que podemos constatar o quão paradoxal é tudo aquilo. Areia, areia e mais areia… Auto-estradas que serpenteiam pelo meio das construções… Construções aqui e ali, todas elas imponentes, assustadoramente imponentes… Gruas, bichos de metal a ameaçar mais betão, mais recordes – a média é de um edifício concluído a cada dia -, mais blocos verticais.
De volta a chão firme, apercebemo-nos de que quem nos rodeia é, na sua maioria, estrangeiro. Dizem os números que apenas 17% dos habitantes deste Emirado são autóctones. Mal damos por eles, a menos que visitemos o único bairro da cidade que se pode dizer tradicional, Al Bastakyia. Nas casas antigas destacam-se as torres de vento, construções pensadas para captar os ventos de quaisquer direcções e refrigerar o interior das habitações. Porém, hoje estas estão destinadas a pequenas galerias, cafés e casas de hóspedes, com pátios e deliciosos pormenores de arquitectura islâmica.
Não muito longe, no interior do Forte Al Fahidi, encontramos o Museu do Dubai, que nos proporciona uma pequena viagem aos tempos em que ali se vivia apenas da pesca e do negócio das pérolas. Uma amostra de um Dubai já quase inexistente, perdido no deserto e esquecido, até que um punhado de sheyks se lembrou de convertê-lo num pólo de atracção turística.
Passeando ao fim da tarde junto ao canal, na zona de Deira, podemos continuar a vivenciar um outro Dubai, mais árabe, mais genuíno e típico. As barcas carregadas que, de margem a margem, levam de tudo e a todos. Dali partem também os dhows, embarcações que levam mercadoria para outros países do Médio Oriente e também destinos africanos. Não por acaso, ali perto fervilham os mercados, dispersos por ruelas destinadas a comércio de especiarias, essências, tecidos, prata… Um cheirinho a Oriente, por fim.
Fora dali, daquele epicentro, o Dubai é ocidental. O Dubai dos arranha-céus, das marcas francesas, das cadeias de comida norte americanas e dos automóveis de luxo fabricados em qualquer outro país é um Dubai que não se contenta com o seu imenso espaço físico – que muitos diriam estéril não fosse o “ouro negro” – e que se quer projectar no Mundo lá fora. Um emirado que se converte numa Meca do consumo, num aglomerado de hotéis ultra-exclusivos, num destino de duas sílabas que anda nas bocas do Mundo. •