A Escola da Noite estreia, na próxima quinta-feira dia 18 de Dezembro, o espetáculo “Da sensação de elasticidade quando se marcha sobre cadáveres”, de Matéi Visniec. A partir da experiência comunista na Roménia, a peça faz uma denúncia – forte mas bem humorada – do absurdo dos regimes totalitários e da violência com que eles atacam e procuram anular a individualidade do ser humano.
Sérgiu Penegaru é um escritor que se recusa a escrever poemas patrióticos, que cedo descobriu a literatura como espaço de liberdade e leu Kafka, Dostoievski, Camus, Beckett, Ionesco, Lautréamont, que admira o surrealismo (interessando-se igualmente pelo dadaísmo, pelo fantástico, pelo teatro do absurdo, pelo grotesco, mas também pelo teatro realista anglo-saxónico), o que numa Roménia comunista, do final da década de 50 do século XX, era suficiente para que entrasse para a “lista negra”. Nessa altura, as suas obras são proibidas e é preso na penitenciária Sighet – que realmente existiu, por onde passaram e onde morreram dezenas de presos políticos, nesse período. Como forma de resistir ao cárcere, Penegaru e os seus três companheiros de cela divertem-se a representar “A cantora careca”, de Eugène Ionesco. O teatro – em particular o teatro do absurdo de Ionesco – não só ajuda os quatro homens a distanciarem-se do horror como acentua o absurdo da própria realidade em que vivem. Não se trata apenas de sobreviverem fisicamente, mas também de salvaguardar a liberdade de pensamento individual, de resistir à mais perigosa das manipulações, aquela que é operada dentro das próprias cabeças. Neste sentido, tanto as anedotas políticas que Penegaru tem sempre para contar, como a poesia que não consegue parar de escrever, como o teatro que leva para dentro da prisão são mais do que escapes ou do que fugas à realidade. São formas ativas de resistência e de luta pela liberdade. Numa entrevista recente, Matéi Visniec, ele próprio autor proibido na Roménia durante a ditadura de Ceausescu, assume que continua a sentir-se um “autor engajado” e a sentir necessidade, enquanto artista, de combater “o mal”: “Na França, como em outras sociedades democráticas, identificar o mal exige um trabalho maior de reflexão. O artista tem de ser subtil para reconhecer as formas de manipulação por meio da publicidade, da moda, da indústria de entretenimento, da sociedade de consumo, dos slogans do comércio e da linguagem dos meios de comunicação”. E acrescenta: “nesses países ‘livres’, onde o ditador é o mercado, descobre-se que a lavagem cerebral se esconde atrás da máscara da liberdade”. Escrita em 2009 e publicada em francês, em romeno e em português (no Brasil), a peça “Da sensação de elasticidade quando se marcha sobre cadáveres” nunca foi representada, tendo portanto a sua estreia mundial agendada para Coimbra. Acontece no próximo dia 18 de Dezembro e a temporada inicial é de apenas quatro dias.
Com a sua obra proibida pelo Governo, abandonou a Roménia em 1987 e pediu asilo político em França, onde trabalha até hoje como jornalista e começou a escrever teatro em francês. A partir da década de 1990 as suas obras começam a ser conhecidas, representadas e traduzidas um pouco por todo o mundo. Tem mais de 30 peças editadas e já foi representado em mais de 30 países. Nos últimos dois anos, vários trabalhos seus foram traduzidos para português e editados no Brasil, com extraordinário sucesso. Entre os prémios que recebeu, destacam-se o Prémio Europeu da Sociedade de Autores e Compositores Dramáticos (França, 2009) e os dois prémios de imprensa no Festival Off de Avignon (2008 e 2009), onde obras suas têm tido presença regular. Marque presença nesta estreia “Da sensação de elasticidade quando se marcha sobre cadáveres” de Matéi Visniec, pel’A Escola da Noite, com cenografia do arquiteto João Mendes Ribeiro.
Em Coimbra, no Teatro da Cerca de São Bernardo (TCSB), de 18 a 21 de dezembro, quinta a sábado pelas 21h30 e domingo pelas 16h00, a arte, o humor e a liberdade de pensamento no próximo espectáculo d’A Escola da Noite, não falte! •
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© Imagem: Pormenor do cartaz de divulgação.
