No seu sexto ano consecutivo, as Noites de Verão no MNAC – Museu do Chiado regressam à área exterior do Museu, conhecida como Jardim das Esculturas, nas habituais sextas-feiras, pelas 19h30, e com entrada livre.
Este ciclo de concertos singulares produzido e programado pela Filho Único é desenhado, com o objectivo e missão desta associação cultural sediada em Lisboa e com a identidade e vocação do Museu Nacional de Arte Contemporânea que o acolhe, com o intuito de apresentar e divulgar propostas na área da música que trabalhem a partir de critérios construtivos de produção artística, que visem o desenvolvimento da arte e contenham em si um cariz de busca e de progressão estética. Eis o programa de 2015 alinhado:
10/07 – Joe Morris (US) é um dos mais importantes guitarristas do jazz e da música improvisada, facto que se tem tornado cada vez mais unânime ao longo da última década, mais de trinta anos depois do início da sua carreira. É dele uma linguagem profundamente informada por toda a história destas músicas, que o próprio interpreta e trabalha diariamente enquanto instrumentista e professor e autor com obra publicada na matéria, com “Perpetual Frontier – the Properties of Free Improvisation” (2013). Das colaborações regulares, destaque para o seu recentemente reemergido quarteto, com quem editou clássicos como “Cloud of Black Birds” ou “Age of Everything”, com Mat Maneri no violino; várias colaborações ao vivo e em estúdio em trio com William Parker e Hamid Drake, ou ainda o álbum editado conjuntamente com Anthony Braxton. O seu trabalho, é apresentado como particularmente cristalino, nítido e exposto na circunstância do solo, prática que manteve ao longo destes anos, mas a que recentemente tem dado mais primazia. Depois de um hiato discográfico de 14 anos desde “Singularity”, regressa agora com “Joe Morris Solos Bimhuis”, gravado integralmente numa das grandes catedrais do jazz mundial, a BIMhuis de Amsterdão.
17/07 – Djumbai Djazz (GW). Maio Coopé fundou o seu Djumbai Jazz em 1999, em Lisboa, como um projecto de pesquisa intencionado a revisitar os ritmos sonâmbulizados na sua história pessoal com a terra-natal Guiné-Bissau. Maio cresceu imergido na rica e diversa cultura do país, etnicamente diferenciada e com tradições populares milenares, tais como músicas cerimoniais usada em funerais, iniciações e outros rituais, originadas e preservadas especialmente pelas comunidades Balanta e Mandinga, e a comunidade insular animista no Arquipélago dos Bijagós. Habituado em criança às reuniões noturnas junto dos mais velhos, para ouvir histórias a serem contadas e canções cantadas, reavaliou mais tarde em idade e consciência adulta aquele poder telúrico ancestral. Djumbai Djazz centrou-se em estilos tradicionais guineenses como o Ngumbé, Brocxa e Djambadon, mas o repertório da banda denota a influência de outras sonoridades da África Ocidental, revelador da vontade em oferecer uma proposta consequente com a perspetiva de Maio sobre o que lhe interessa ser a expressão de um músico imigrante africano lusófono em Lisboa, tendo em conta a diversidade do público para o qual toca. Neste concerto terá o prazer de ver a formação composta por Maio Coopé, em voz, cabaça e percussão, Braima Galissá, na kora, e Sadjo Cassamá, na guitarra e voz.
24/07 – Barry Guy (GB). Figura fundamental do jazz britânico, da improvisação europeia, da composição contemporânea, intérprete de várias outras músicas mais e menos seculares, editor, e tantos outros ofícios que foi criando por necessidade e visão. Parte da primeira geração de aprendizes da figura seminal da improvisação europeia, o músico britânico John Stevens, Barry Guy foi e tem sido, ao lado de outros como Derek Bailey ou Evan Parker, dos grandes exploradores do que se pode fazer nos territórios novos. Criou a London Jazz Composers Orchestra no arranque da década de 1970, instituição que ainda hoje se mantém viva e vibrante. Mantém a Barry Guy New Orchestra, com notável trabalho editorial e em palco. Faz parte de um dos mais importantes trios do jazz contemporâneo, com o supramencionado Parker e Paul Lytton, que permanece vivo e intrépido. Contudo, e no que diz respeito mais a este concreto, trata-se de um dos grandes contrabaixistas vivos. O seu trabalho é de enorme riquezas melódica, harmónica, tímbricas e solistas. Nele, ouve-se tanto do muitíssimo que viveu e aprendeu, ao longo de um percurso que arrancou sério no princípio da adolescência, num bar, onde foi aprendendo tudo o que podia com Champion Jack Dupree ou Sonny Boy Williamson, e outros lendários que por lá passavam. Uma história sem fim em música, que teima em não parar de se escrever, mais rica a cada dia que passa.
31/07 – Yong Yong (PT) é o nome sob o qual os dois parceiros Rodolfo Brito e Francisco Silva que se conheceram na ESAD das Caldas da Rainha, agora sediados em Glasgow, depois de uma temporada em Lisboa, fazem música e concretizam formas revigoradas de imaginação de a complementar, e comunicar, em apresentações públicas e na expressão online. “Estrearam-se ao vivo na mensalidade Filho Único há cerca de quatro anos, onde tocaram escondidos debaixo de uma mesa revestida a cortiça trazida pelos próprios, imagem alegórica especulativa para o poder de absorção luso de influências exteriores com perspectivas de as transformar, mais do que a costela insular do ‘orgulhosamente sós’ atávico“. Voltaram a mostrar novo espectáculo no OUT.FEST 2012, nas vésperas do LP “Love”, editado em cassette e vinil na londrina Night School, na linha do mundo singular de colisão e desdobramento da genealogia de música urbana electrónica que têm vindo a construi. Seguiram-se a fita “Yong Yong Meet Lord Prince ‘I’ Infinito” na Goaty Tapes e o “Greatest It’s” novamente na Night School, no ano passado. Realizam a sua música manipulando tecnologia subterrânea/subterfugiada – pedais, voz, laptop, microfonia carismática, etc. A compleição do duo no espaço, constante motivo de reflexão por parte dos artistas, é sempre nova a cada ocasião.
07/08 – Éme (PT) editou “Último Siso” no final do Verão do ano passado, recebido com um reconhecimento crítico e público ajustado à maturação autoral patenteada. Dedicou-se nos meses que se foram sucedendo em levar o disco aos portugueses, numa vida de estrada pautada por um entusiasmo e uma generosidade pela experiência da viagem e descoberta que é não só reflexo do cidadão jovem da capital naturalmente curioso que é, mas também do compositor e intérprete que quer perceber qual o país em que canta, e para quem canta, privileginado o contacto directo com as pessoas. Éme, como Mário Lopes na sua recensão crítica ao disco no Público tão precisamente qualificou, “tem o dom de saber identificar, trabalhar e adornar com precisão uma melodia”, e com a consolidação de uma banda para o coadjuvar ao vivo, tendo sido a mesma que com ele ensaiou e gravou as canções no estúdio de Walter Bnjamin no Alvito, com B Fachada ao leme da produção, afigura-se um futuro ainda mais auspicioso para ele e para quem o começou a ouvir depois de convencido do seu real valor. Regressa, portanto, ao Jardim das Esculturas depois da actuação há um par de anos, agora acompanhado de Júlia Reis (Pega Monstro) na bateria, Lourenço Crespo (Iguanas) nos teclados e Miguel Abras (Putas Bêbadas) no baixo.
14/08 – Lorenzo Senni (IT) é um músico e produtor italiano que se tem afirmado nos últimos anos como um investigador dos mecanismos e das peças da engrenagem que compõe o género da música de dança electrónica, apresentado resultados em música que traduzem as suas ideias e proposições sobre o assunto, principalmente depois do lançamento do seu disco “Quantum Jelly” na Editions Mego, em 2012. “Cunhando o termo “Pointillistic Trance” para descrever a sua perspetiva e abordagem, a música de Senni é uma aposta na desconstrução da cultura e estética rave vivida a partir do dealbar da década de 90 na Europa e Reino Unido, com vista a uma apropriação e a uma recontextualização alicerçada nos critérios conceptuais de ‘isolamento’ e ‘repetição’ de certos elementos da música que estava no centro e, durante alguns anos, em espantosa progressão estética livre, deste movimento cultural de juventude“. Com o sucessor “Superimpositions”, lançado no ano passado na Boomkat Editions, “a fórmula ganhou maior consistência e as suas vinhetas taxidérmicas dos crescendos eufóricos isolados das faixas de dança originais maturaram para peças panorâmicas e aurais de proporções e volumes funcionais. Senni é também gestor do selo editorial Presto!? Records, tendo no seu catálogo discos de artistas como Florian Hecker, Carsten Holler, DJ Stingray, EVOL ou Marcus Schmickler, entre outros, e tem composto música para cinema e teatro, destacando-se a sua banda-sonora para o premiado filme “Da Vinci” de Yuri Ancarani, mostrado na 55ª Bienal de Veneza“.
21/08 – Julinho da Concertina (CV) nasceu em Piloncan, concelho da Calheta de São Miguel, ilha de Santiago, Cabo Verde, há quase 60 anos, e desde cedo descobriu a paixão pela música e pela concertina, instrumento que escolheu e afinou a seu jeito para se fazer acompanhar em palco a tocar as mornas, coladeras e especialmente o funaná da sua terra natal. Emigrou para Portugal em 1973 e vive actualmente no bairro da Quinta da Lage, na Falagueira, onde ainda hoje ocupa uma boa parte do seu tempo a trabalhar numa horta urbana e o fole e os teclados da sua concertina. “Vivi, quase sempre, da música. Mas os cachets foram rareando. Toquei ao lado de muitos músicos afamados. Participei em concursos com bons resultados. Mas esta horta é uma grande ajuda para a família“, dizia ao jornal diário online cabo-verdiano A Semana, aquando de uma visita para uma peça sobre si há cerca de 3 anos. Com um vasto reportório, com peças da sua autoria e temas de outros compositores, diz guardar a mágoa de não ter sido convidado para tocar para o grande público em Cabo Verde, até porque, afiançava à mesma entrevista, antes dos Ferro e Gaita e outros grupos cuja carreira atingiu patamares de reconhecimento e sucesso notáveis, era ele e outros da sua geração que impulsionavam a disseminação do funaná na sua terra e na diáspora cabo-verdiana. Nas Noites de Verão no MNAC, Julinho da Concertina far-se-á acompanhar de Nirr Paris na bateria e António Tavares no ferrinho e voz.
28/08 – David Maranha & Helena Espvall (PT/SE) têm vindo a colaborar com frequência desde que Helena participou em “Marches of the New World”, álbum de David editado em 2007, sendo evidente que a parceria conheceu novos desenvolvimentos a partir do momento que Helena escolheu Lisboa para viver há cerca de uns anos. Na vida do recentemente extinto espaço alternativo na Cave do n.º 211 da Avenida da Liberdade, David promoveu inúmeros encontros entre músicos da cidade e outros em trânsito temporário para, em formações variáveis, ajudar a definir uma comunidade de performers e público interessados na busca de novas formas de expressão no improviso, sendo Helena uma das figuras centrais desta dinâmica, e com certeza contribuído para a produção de “Sombras Incendiadas”, disco em duo lançado este ano no selo suíço three:four records. Helena é violoncelista sueca que operou durante largos anos na Costa Este dos Estados Unidos, tendo-se notabilizado como uma das vozes dos Espers. Reconhecida como uma improvisadora muito melódica, entre trabalhos a solo regulares destacam-se dois discos em duo com o mítico Masaki Batoh, líder dos Ghost (ambos pela Drag City). David Maranha é um explorador das potencialidades do som contínuo, do silêncio, da acústica… e da arquitectura sonora, quer nos Osso Exótico quer no seu percurso a solo, apresentado-se regularmente ao vivo com outros músicos que convida para o ajudarem a concretizar as suas composições abertas. Para além de músico, especialmente versado em orgão elétrico e violino amplificado, activo desde o final da década de 80 e com uma discografia profícua, tem nos últimos anos exposto em galerias comerciais e espaços independentes o seu trabalho em artes visuais, sobretudo através de objectos escultóricos e instalações.
04/09 – Bill Kouligas (GR) é um músico, designer e DJ a operar entre Nova Iorque e Berlim. A partir de 2006 iniciou actividade pública usando o nome Family Battle Snake, tendo lançado acima da vintena de edições em vinil, cassette e cdr, incluindo projetos colaborativos com outros músicos. Fundador e editor do selo PAN, teve um papel crucial, a par da consolidação da influência de revistas online como a Fact, da distribuidora Boomkat e do circuito europeu emergente de festivais de músicas electrónicas. Com uma visão obstinada nas músicas psicadélica, composição electroacústica, industrial, ambient, house, techno, foi “construindo um catálogo que tem vindo a cartografar as renovadas avenidas lexicais de expressão sonora imbuídas de arrojo e desafio propostas por artistas novos e não tão novos de idade e currículo, a quem foi proporcionando uma infraestrutura, nalguns casos pela primeira vez, oferecendo uma assertiva perspectiva curatorial no processo“. Depois de muitos anos a produzir e apresentar ao vivo música experimental sob diferentes pseudónimos, entra numa nova etapa criativa em que irá apresentar um novo concerto de electrónica manipulada ao vivo, “consubstanciado pelo seu aguardado primeiro longa duração em nome próprio a ser lançado no Outono“.
A ir, em Lisboa. •
+ MNAC – Museu do Chiado
© Fotografia de destaque: Barry Guy.
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