Inaugurou na Biblioteca Municipal Eng. Jorge Bento, em Condeixa-a-Nova no dia 20 de Setembro, uma exposição de fotografia da autoria de João Pinto Rodrigues: aconselho a que não perca o seu “olhar” inaugural.
Transcrevo integralmente o texto que acompanha esta exposição, escrito por João Pedro Pinto Rodrigues e disponível numa impressão de pequeninas dimensões; aliás, gostaria, desde já, de assinalar a escolha feliz que decidiu pela escala em que as suas palavras são apresentadas. Assim, logo após se escrever o título da exposição, pode ler-se: “MARavILHA! Na companhia dos meus avós, fiz uma viagem aos Açores, em que tive a oportunidade de conhecer algumas ilhas do grupo central deste arquipélago: Pico, Faial e S. Jorge. São ilhas separadas entre si por poucos quilómetros, formando uma espécie de triângulo, que lhes quebra um pouco o isolamento a que a imensidão do mar, à partida, as condenaria. A ilha do Pico foi a nossa base. Não se regressa o mesmo, depois de visitar um sítio assim. É impossível ficar indiferente à presença de um vulcão, da coroa de nuvens que o rodeia e que tudo parece envolver numa atmosfera misteriosa e fantástica. A paisagem desarma-nos: os campos de lava, o verde intenso, as tais vacas felizes de que nos fala um anúncio da televisão, uma tranquilidade que eu não me lembro de sentir em qualquer outro sítio. Os dias, simplesmente, aconteciam mais devagar. Ao longo de uma semana, partilhando a paixão do meu avô, fui tirando fotografias como quem precisa de reunir provas de que os olhos não estavam a mentir. Foi assim que acabou por nascer esta exposição, que mais não é que uma partilha. Ao abrir, de manhã, a janela do meu quarto, o mar estendia-se por toda a parte. E eu rodeado de espanto por todos os lados.”
Ressalto, do sensível testemunho de João Pinto Rodrigues, a última frase: “E eu rodeado de espanto por todos os lados.” Pois é de tal que se trata nesta exposição: de ESPANTO, a condição essencial para se chegar à beleza. As fotografias deste jovem, sim, é um jovem, são-nos apresentadas como se se tratasse de um primeiro olhar, como se o vulcão, as coroas de nuvens que o rodeiam, os campos de lava, os girassóis, estivessem a ser vistos pela primeira vez. Da condição de “espanto” e sua consequência inevitável, ou seja, a franqueza com que emoldurou a paisagem, resulta uma limpidez que perpassa estas imagens, como se de cada uma delas, e de todas a uma só voz, jorrasse água fresca. Cristina Campo precisamente fala da necessidade, e no contexto da tão importante busca do sentido de “presença” na(s) época(s) da História, de todo um trabalho que faça sobressair um pouco de água dos textos. Pois aqui, nestas fotografias, é a fonte mesma do olhar que se faz presente: isso toca e emociona.
Na paisagem, que tão fiel e respeitosamente é apresentada, recorta-se uma única figura humana: um senhor que avança sobre um burrinho, segurando nas suas mãos o chapéu que fez questão de tirar. Ao olhar esta fotografia foi-me impossível não pensar em Au Hasard Balthazar, de Robert Bresson e datado do ano de 1966. E continuei a pensar: estou certa de que, aqui e agora, aquele burrinho é bem tratado, sim, aquele senhor gosta dele e partilham a vida naturalmente e com normalidade. Aquele burrinho não é acossado e não se reúnem à sua volta para lhe queimarem a cauda, não: existe uma simbiose entre o senhor e o burrinho, que partilham uma economia, comum. E pensei ainda: Maria, quem não se vê nestas fotografias, mas se pressente, aqui e agora, partilha, de forma serena, a coroa de flores com o seu querido burrinho. Enfim, existe harmonia. E é isso que João Pinto Rodrigues nos oferece: harmonia. Não é pouco!
Para ver até dia 4 de Outubro na Biblioteca Municipal Eng. Jorge Bento, em Condeixa-a-Nova.