Produção, Criatividade, Palcos. Qual o futuro da cena musical? / Raquel Ralha

Senhora de uma inconfundível presença e voz, Raquel Ralha é indissociável de sonoridades como de Belle Chase Hotel, Mancines, Wraygunn, Raquel Ralha & Pedro Renato, Animais… É voz sem a qual esta música supra mencionada e toda a nossa música não passa.

Raquel está há mais de… Não. Não façamos contas desnecessárias. Raquel é da música desde sempre, mesmo que tenha tido, há muito, outros percursos paralelos à música – o ensino perdeu uma super professora de inglês – foi tudo jogo de diversão, certamente, para não se entregar logo de chofre aquele que é o seu mundo, a sua alma: a música com a sua voz. Raquel diluiu-se na música e agora é impossível separar uma da outra.
Com noção do quão efémero tudo é e do quão surrealista foi, e está a ser, esta era pandémica das nossas vidas, Raquel da voz versátil, que abraça desafios vários sem receios de emprestar a sua voz, aproveitou os últimos 12 meses para se (re)organizar, à parte da música.
Nas palavras aqui escritas, sentimos uma voz que agita um pé nervoso que anseia por levar para os palcos os seus mais recentes álbuns editados; álbuns que ainda não lhe fizeram sentir o público à flor da pele, como ela tanto gosta.

Se te pedisse para escolheres uma nota musical ou frequência hertziana ou um valor em decibéis para resumir estes últimos 12 meses, qual seria e porquê?
(RR):
Mais um silêncio de vácuo, talvez.

Houve tranquilidade e disponibilidade – física e mental – para pôr em prática o que anteriormente te era quase impossível, como tirar projectos da gaveta ou reorganizar-te?
(RR):
Este ano que passou foi dedicado, fundamentalmente, a fazer outras coisas à parte da minha actividade musical, como tratar de assuntos familiares, fazer arrumações e experimentar actividades agrícolas. Está a ser um stand-by em que aproveito para estar comigo a fazer coisas pendentes, sem pressas nem horários.

Como encaraste e encaras os concertos em streaming? São de alguma forma um motor para se manter uma certa actividade, te sentires activo?
(RR):
No meu caso, não fiz nenhum e assisti a poucos. Prefiro esperar pelo regresso aos palcos reais, como profissional ou como espectadora.

Estás a desenvolver músicas ou produções para a nova temporada pós-confinamento que se avizinha? Se sim, podes levantar a ponta do véu?
(RR):
Estou em três bandas (Mancines, Animais, Raquel Ralha & Pedro Renato) cujos discos lançados em 2020 não foram ainda devidamente promovidos pelo impedimento que a pandemia impôs. Por isso, haverá muito que fazer no pós-confinamento, esperemos. Coisas novas estão sempre em mente, mas, para já, há que dar prioridade a essa promoção.

Como se organiza uma agenda com tantas incertezas e reagendamentos constantes? É exequível programar ensaios, concertos e tours a curto e longo prazo?
(RR):
É difícil. Mantém-se, por enquanto, a agenda desorganizada. Andando e vendo…

Sentes que a paragem forçada da cena musical transformou o olhar do público e a mesma passou, finalmente, a ser mais olhada como profissão e não como hobby?
(RR):
Espero bem que sim. A ver se acaba de vez a clássica pergunta “Sim, mas, para além da música, trabalhas em quê?“.

Produção. Criatividade. Palcos. Como é a tua rotina de músico e como vês o futuro do teu sector a partir destas três palavras?
(RR):
Não tenho uma rotina específica. As coisas vão acontecendo e vamos trabalhando à medida da fase em que estamos, seja de produção, de criação, de promoção, etc. Há fases mais exigentes em termos de trabalho e prazos, outras menos.
Quanto ao futuro do sector, espero que a engrenagem rode de novo, sinceramente, com maior investimento cultural, e, mesmo que os caminhos possam não ser iguais ao que eram antes, que a adaptação seja rápida e haja ânimo renovado e condições para prosseguir.

Quão desafiante se tornou este último ano no teu percurso enquanto músico? Como geriste a falta física dos teus pares, ao teu lado? O que mais mudou na tua perspectiva sobre o teu trabalho?
(RR):
Foi tão desafiante quanto “fazer omeletes sem ovos“. Ainda assim, tentei encarar tudo isto como uma pausa surrealista. Adaptei-me à situação da melhor forma possível e reafirmei a minha opinião de que o mundo é bom, mas muuuuuito estranho. Em última análise, não caminhamos para melhor e vamos todos morrer um dia, por isso, ou apesar disso, tentemos então ser minimamente optimistas enquanto por cá andamos. •

+ Raquel Ralha
@ Fotografia: Raquel Ralha por Vera Marmelo.

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