Um nome com história
Simbraz nasceu na Zambézia, província de Moçambique que tem em Quelimane a sua capital; agora vive no Norte de Portugal. Por quanto tempo? Não sabe, exactamente. Trouxe-o o desejo de pintura e é nele que confia até esconjurar (todos) os fantasmas, para que as cores possam surgir na intacta promessa de festividade e vibração. Conheço o pintor Simbraz desde a MANOEUVRE, onde trabalhámos em conjunto: assisti ao seu labor, escrevi sobre o seu universo de criação, entrevistei-o, e nasceu então uma admiração pelo que cada um de nós traz em seu redor. Eu com as palavras, Simbraz com as imagens, pareceremos, talvez e por vezes, almas perdidas que se exigem a devida calibração; a esta também a vamos encontrar, claro, no respeito que devotamos ao trabalho que, embora alheio, se torna num meio não alheado e contribui para a não alienação.
Simbraz carrega os antepassados e a natureza dentro de si, terreno onde se funda a religiosidade e de onde avultam os deuses ancestrais. Por tal, diz-me que as forças da magia – para o mal e para o bem, operam dentro de cada um/a de nós. E essas forças são necessariamente transfiguradoras, com a noite a lançar véus de entendimento também sobre rostos deformados, inquisitoriais, vigilantes, que permanecem na sobreposição dos seres humanos. Provavelmente será esta sobreposição a responsável pela escuridão evidente que encontramos nas suas obras recentes.
Simbraz possui um traço largo que, há dois anos, quando me deparei com o seu universo, o levava para inúmeros caminhos: o do retrato, o do realismo social, o do onírico, o do surreal. Agora, porém, o seu traço parece ter sido cooptado pelos fantasmas que esvoaçam invisíveis à sua passagem, que o visitam nos sonhos nocturnos, que se materializam nos rostos que a pintura reiteradamente devolve, porque pintar é ir e vir com as mãos, com o coração e com essa área de pensamento cinzenta, conivente com a memória. Do interior de si próprio parece então vir captar os rostos que se guardam ciosamente.
Simbraz desenhava em criança, o que o distinguiu cedo de outros meninos e meninas, viu os programas de televisão de Malangatana dirigidos às crianças, descobriu que essa era uma forma de se expressar e continuou a desenhar com carvão e as restantes cores a serem retiradas da natureza. Em Milange, na adolescência, prestou alguma assistência a um senhor que desenhava e pintava, mas este nunca consentiu que se imiscuísse no seu ofício. Destacou-se mais tarde a fazer o mural de um internato, o que lhe possibilitou ser convidado para fazer outros trabalhos e adquirir dinheiro para comprar tintas, a sério. Agora é um pintor: a sério.
Simbraz: “Nada é por acaso, Sempre há um mistério”, palavras suas. Neste momento, pode vê-lo no Porto e em Gaia.