Sustentabilidade e qualidade são as palavras-chave da renovada cozinha do restaurante do n.º 44, da Rua Dom Pedro V, em Lisboa, às quais junta os sabores e a tradição, com a prevalência do que é sazonal e nacional.
Gaspacho de tomate e pepino com sarrajão é prato para os dias quentes que restam deste Verão prolongado
Lisboeta, de 29 anos, José Lopes permaneceu, por sete anos, em terras algarvias, onde acabou por frequentar e concluir o curso de cozinha e pastelaria na Escola de Hotelaria e Turismo de Vila Real de Santo António. Passou pela ilha da Madeira e regressou à cidade-berço, para integrar-se na equipa de cozinha do Eleven (1 estrela Michelin), durante cerca de seis anos, três dos quais exerceu o ofício de chef residente.
Se analisarmos à lupa o conceito do Pão à Mesa com certeza, muito se perdeu, pois esse alimento, tido como um dos mais antigos no mundo, deixou de ter o protagonismo que tinha, inicialmente, neste restaurante. O que é positivo. O mesmo se conclui no que à apresentação dos pratos e à harmonização de sabores diz respeito, sobretudo pela conjugação notável nas duas primeiras sugestões do alinhamento que se segue.
Avancemos. No couvert há manteiga cujos sabores vão alternando entre a de ervas, a de pimentos fumados, a de morcela. Há o azeite, a broa de milho e o pão. Sobre este último houve a necessidade de procurar um cuja qualidade fosse ao encontro das exigências sustentadas na qualidade da matéria-prima, na forma como é feito e no local onde é produzido. Mesmo assim, em meados de Novembro vão testar a produção deste alimento na cozinha do restaurante no equipamento já adquirido para o efeito. Quem assim o desejar, também pode juntar as azeitonas temperadas ou o queijo meia-cura, o picante ou o amanteigado.
A salada inspirada no prato tradicional de bacalhau cru desfiado
Nas entradas, a escolha desdobra-se em oito sugestões diferentes. Ficámos pelo refrescante gaspacho de tomate e pepino com sarrajão. Porquê gaspacho de tomate e pepino, pois se a composição assim o dita? Porque é composto por tomate-cereja, pickles de cebola e pepino, e rebentos de coentros, peixe – idealmente o sarrajão ou o espadarte quando o mar troca as voltas à cozinha – curado e ligeiramente braseado, os quais são regados com os sucos do tomate, do pepino e da cebola. Trata-se, portanto, de um “gaspacho distorcido”, justifica o chef José Lopes.
O bacalhau em saladinha de azeitona e cebola roxa é outra das propostas para iniciar o repasto. Inspirado na punheta de bacalhau, este prato é feito com pil pil de bacalhau (receita da cozinha basca), cebola crua, em pickle e em tempura, azeitona e tapenade de azeitona (pasta de azeitona originária de Provença, no sul de França), salsa e gel de salsa.
A homenagem à “capital do polvo”, em terras algarvias
Da trilogia de peixes foi servido o polvo de Santa Luzia fumado e em patanisca, com chips e puré de batata doce. O prato é inspirado no ingrediente que levou Santa Luzia, no concelho de Tavira, passar a chamar-se de “capital do polvo” e, claro, pelo facto do chef José Lopes ter vivido no Algarve.
O arroz de pato do chef José Lopes
Os pratos de carne são, igualmente, três. Destes, tivemos a sugestão do arroz de pato do chef José Lopes. Um risotto de pato, com peito de pato laminado, demi glace de pato encimado por uma telha de queijo parmesão.
Mas há dois vegetarianos para quem prefere pôr o peixe e a carne de parte: o risotto de aipo e cogumelos, e o “caviar” de beringela, milho, manjericão e pão alentejano torrado.
A torta de laranja do Algarve e maracujá
À sobremesa, foram escolhidos os clássicos. Para os mais saudosistas há a torta de laranja e o toucinho do céu. O primeiro é feito com laranja do Algarve, tem o crumble de amêndoa na sua composição, além do maracujá e gelado feito a partir deste fruto, que contrastou com o doce do bolo enrolado, “tal como se fazia antigamente”, garante o chef.
A versão livre de toucinho do céu “Pão à Mesa” com limão
O segundo é uma inspiração do doce conventual português, ou não se chamasse toucinho do céu “Mãos à Mesa”, com crumble de amêndoa e os deliciosos gelado e mousse de limão.
O Pão à Mesa apresenta, ainda, as sugestões semanais de almoço do chef José Lopes, para os mais “apressados”. Além disso, apresenta uma garrafeira com mais de cinco dezenas de referências vínicas provenientes dos designados pequenos produtores ou produtores menos “comerciais” de norte a sul de Portugal Continental.
Em suma, o espaço continua informal e decorado com as memórias de infância da sócia gerente deste espaço, Andreia Duarte. Em contrapartida, a carta já não é o que era e o restaurante assume-se como bistro.
É ir. Bom apetite! •