E por universos Mutantes, as agendas culturais de 2019 não param sossegadas. Hoje, é abrir logo no segundo mês do ano para tomar nota da 9.ª edição do GUIdance, em Guimarães, com 11 espetáculos, 8 estreias, masterclasses, encontros nas escolas, oficinas, conferências e debates.
De 07 a 17 de Fevereiro de 2019, Guimarães será atingida, de novo e a bem, pela mais imparável das forças: a criação. Num tempo em que o espaço se invade, simbólica e explicitamente, de permanentes manifestações corporais, o GUIdance – Festival Internacional de Dança Contemporânea – propõe, naquela que é a sua 9.ª edição, um exercício transformador e vigoroso: a suprema energia do primeiro olhar sobre a criação. Assim, por cima de todo um jogo de tensões, acionado pela imperiosa necessidade de construir futuros, revelam-se riscos fundamentais de propor caminhos não esgotados. É aqui que o esplendor de uma cidade de criação se afirma, no desafio de construir um programa inesperado e quase pleno de estreias. Victor Hugo Pontes é o coreógrafo em destaque nesta edição do festival, abrindo o evento com “Drama”, em estreia absoluta, e apresentando a remontagem de “Fuga Sem Fim”, peça estreada neste mesmo palco corria o ano de 2011. São várias as peças que o público verá pela primeira vez no GUIdance 2019: dos 11 espetáculos do programa, 6 são estreias absolutas e coproduções d’ A Oficina.
© Um ponto que dança por Joana Linda
A marca de origem portuguesa terá presença em peso com nomes como Jonas & Lander, Miguel Moreira (Útero), Sara Anjo, Maurícia | Neves, Ainhoa Vidal, Joana von Mayer Trindade & Hugo Calhim Cristovão. Juntam-se a este elenco de artistas nacionais os Mão Morta, banda desafiada a desenvolver um projeto inédito, juntamente com a coreógrafa Inês Jacques, a ser apresentado em estreia absoluta. O festival promove ainda duas estreias em Portugal de companhias estrangeiras, convidando o incontornável Michael Clark que, com “to a simple, rock ‘n’ roll… song.”, encerrará esta edição. Uma semana antes, a promissora companhia Wang Ramirez apresenta “EVERYNESS”. Os espetáculos desta edição repartem-se por vários espaços da cidade – Centro Cultural Vila Flor, Centro Internacional das Artes José de Guimarães e Fábrica ASA.
A 07 de Fevereiro, o “Drama” chega ao Centro Cultural Vila Flor (CCVF) para se estrear pela mão de Victor Hugo Pontes, que prolonga, nesta nova criação, o trabalho laboratorial de procura de uma nova linguagem artística, situada algures entre a palavra e o movimento. Depois de “Se Alguma Vez Precisares da Minha Vida, Vem e Toma-a”, a partir de “A Gaivota” de Anton Tchekóv (estreia absoluta no GUIdance de 2016), desta feita o ponto de partida é a peça seminal de Luigi Pirandello “Seis Personagens à Procura de Um Autor”. Esta nova coreografia do criador vimaranense chega às 21h30 ao palco do Grande Auditório do CCVF.
O segundo dia do festival resulta de um desafio lançado pelo GUIdance à mítica banda Mão Morta e à coreógrafa Inês Jacques para, em conjunto, desenvolverem um projeto inédito. Desta forma, um grupo de seis músicos e um grupo seis de bailarinos juntam-se para apresentar uma desconstrução do espetáculo de música e de dança. É assim “No Fim Era o Frio”. A banda – neste caso os Mão Morta, matéria singular do rock português – cria o cenário onde deambulam os corpos, em movimentos imaginados por Inês Jacques. Com música original de Miguel Pedro e António Rafael e narrativa de Adolfo Luxúria Canibal, “No Fim Era o Frio” terá a sua aparição a 08 de fevereiro às 21h30 na Black Box da Fábrica ASA. Imperdível!
No primeiro sábado desta edição, dia 09, a dança tem três vidas, com passagens pelo Pequeno Auditório do CCVF (11h00 e 15h00), Black Box do Centro Internacional das Artes José de Guimarães (18h30) e Grande Auditório do CCVF (21h30). O dia começa a sorrir para os mais novos com “Um Ponto que Dança”, espetáculo-oficina de Sara Anjo, a partir do livro com o mesmo nome que a artista escreveu, com ilustrações de Martina Manyà, que se desenvolve em duas partes: uma leitura encenada da obra e um conjunto de exercícios centrados na ideia de um ponto que dança para crianças e famílias. A dança avança depois para o CIAJG com a estreia absoluta de “anesthetize”. Há uma associação pouco óbvia entre as ideias de anestesia e movimento, mas é a partir dessa aparente contradição que a prolífica criadora Maurícia | Neves (coreógrafa e performer, mas também autora de instalações e música) fez nascer “anesthetize”, peça para três corpos femininos com a qual faz a sua estreia no GUIdance. Os últimos passos deste dia serão dados no palco maior do CCVF pela companhia Wang Ramirez. Autores de uma linguagem que cruza hip-hop, ballet e movimentos de artes marciais, a dupla Honji Wang e Sébastien Ramirez tem construído, desde 2010, um sólido percurso que os tem levado a alguns dos principais centros de dança mundiais. A companhia Wang Ramirez estreia-se em Portugal com “EVERYNESS”, peça que traz para o palco o tema das relações humanas, seja a amizade ou o amor romântico.
© EVERYNESS por Caroline Minjolle Steps, 2018
A segunda ronda de espetáculos abre, tal como a primeira, com uma peça de Victor Hugo Pontes. Estreado em novembro de 2011, no CCVF, “Fuga Sem Fim” regressará no próximo dia 13 de Fevereiro ao ponto de partida, numa re-montagem encomendada pelo GUIdance 2019. Construído a partir de uma ideia de João Paulo Serafim – realizador do vídeo que acompanha a peça –, neste espetáculo Victor Hugo Pontes propõe uma reflexão sobre a ideia de fuga e o ato criativo.
Às 21h30 do dia 14 de Fevereiro, outros filhos a Guimarães retornam para mais uma estreia absoluta, desta vez protagonizada pela Útero. O espetáculo “Fraternidade I + II”, da autoria de Miguel Moreira, é um díptico dividido por um intervalo. Como se fossem duas peças gémeas, ou o lado A e B de um disco. “Fraternidade I + II” é a Útero de Miguel Moreira a perguntar o que quer realmente dizer masculino e feminino, a partir do elo mais forte que liga os seres humanos: a fraternidade. Uma peça repleta disso mesmo, com cocriação e interpretação partilhada por Cláudia Serpa Soares, Francisco Camacho, Luís Guerra, Maria Fonseca, Miguel Moreira, Romeu Runa, Sara Garcia e Shadowmen.
No dia seguinte, à mesma hora, Jonas&Lander (Jonas Lopes e Lander Patrick) viajam até à Black Box da Fábrica ASA para revelar o seu “Lento e Largo”, um trabalho fabricado no Centro de Criação de Candoso, local onde decidiram aventurar-se no passado mês de Novembro para uma residência artística. O interesse da dupla pela robótica enquanto elemento performativo vem de trás, mas nunca deixa de causar estranheza. Em “Lento e Largo”, os robôs que dançam são um dos elementos que contribuem para o que chamam de poética da alucinação. Inspirados pelo surrealismo, reclamam a ficção como espaço que desafia a racionalidade.
No dia de encerramento do GUIdance 2019, o festival volta a fazer uma dança a três passos, percorrendo três dos palcos pisados nesta edição. Às 11h00 e às 15h00, é tempo de navegar pelo “Oceano” criado por Ainhoa Vidal no Pequeno Auditório do CCVF. A poesia que se pode imaginar a partir dos animais e plantas que se encontram fundo do mar é a matéria a partir do qual se constrói “Oceano”, espetáculo para fazer sonhar crianças dos 6 meses aos 2 anos. Ao final da tarde, pelas 18h30, a peça “Dos Suicidados – O Vício de Humilhar a Imortalidade” de Joana von Mayer Trindade & Hugo Calhim Cristovão estreia-se na Black Box do CIAJG. O trabalho desta dupla é singular pela metodologia de trabalho assente num diálogo entre a experimentação, o pensamento e o discurso crítico. Depois de José Régio e Almada Negreiros, prosseguem a sua investigação sobre escritores portugueses, partindo agora da obra de Raul Leal.
O festival fecha o programa de espetáculos em grande forma com a Michael Clark Company a apresentar “to a simple, rock ‘n’ roll… song.” pela primeira vez em Portugal. O grande iconoclasta da dança britânica, Michael Clark, estreia-se desta forma em solo nacional com uma peça em três atos que presta homenagem a três das suas fontes de inspiração musical (Erik Satie, Patti Smith e David Bowie), explorando as principais marcas da linguagem artística deste criador: o esbatimento das fronteiras entre o bailado clássico e a dança contemporânea, a moda, a música e as artes visuais. Um momento singular para testemunhar a partir das 21h30 no Grande Auditório do CCVF.
© Fuga sem fim por Susana Neves
As essenciais atividades paralelas juntam-se ao cartaz principal ao longo de toda esta edição do GUIdance, agregando público, artistas, escolas e pensadores. Destas fazem parte as masterclasses (8 e 15 Fevereiro) – experiência única de trabalho criativo que permite a bailarinos/as e alunos/as de dança de nível avançado um contacto privilegiado com alguns dos mais conceituados criadores internacionais da dança contemporânea, nesta edição orientadas pelas companhias Wang Ramirez e Michael Clark –, conferências nas escolas com Cláudia Galhós (7 e 13 Fevereiro) – uma espécie de aula-conferência sobre a história da dança contemporânea, com a jornalista e crítica de dança, na qual se misturam olhares e processos da criação artística ao longo dos tempos – e debates (9 e 16 Fevereiro) moderados pela mesma, oficinas para famílias orientadas por Ángela Diaz Quintela (10 e 17 Fevereiro) – com inspiração no movimento, olhando para a arte como território de experiência e de liberdade, um diálogo entre o corpo, o museu, a memória e a imaginação – e ainda encontros que levarão Adolfo Luxúria Canibal e Victor Hugo Pontes às escolas do concelho de Guimarães, os quais assumirão o papel de Embaixadores da Dança (5 e 11 Fevereiro), partilhando o seu percurso, a sua experiência de vida e as suas visões artísticas em contexto de sala de aula.
GUIdance 2019 – Programa do Festival Internacional de Dança Contemporânea:
07/02, 21h30 – Drama, Victor Hugo Pontes, (Estreia Absoluta); CCVF / Grande Auditório.
08/02, 21h30 – No Fim Era o Frio, Mão Morta + Inês Jacques, (Estreia Absoluta); Fábrica ASA / Black Box.
09/02, 11h00 e 15h00 – Um Ponto que Dança, Sara Anjo, (Educação e Mediação Cultural); CCVF / Pequeno Auditório.
09/02, 18h30 – anesthetize, Maurícia | Neves, (Estreia Absoluta); CIAJG / Black Box.
09/02, 21h30 – EVERYNESS, Company Wang Ramirez, (Estreia Nacional); CCVF / Grande Auditório.
13/02, 21h30 – Fuga Sem Fim, Victor Hugo Pontes, (Remontagem); CCVF / Grande Auditório.
14/02, 21h30 – Fraternidade I + II, Útero, (Estreia Absoluta); CCVF / Pequeno Auditório.
15/02, 21h30 – Lento e Largo, Jonas & Lander, (Estreia Absoluta); Fábrica ASA / Black Box.
16/02, 11h00 e 15h00 – Oceano, Ainhoa Vidal, (Educação e Mediação Cultural); CCVF / Pequeno Auditório.
16/02, 18h30 – Dos Suicidados – O Vício de Humilhar a Imortalidade, Joana von Mayer Trindade & Hugo Calhim Cristovão, (Estreia Absoluta); CIAJG / Black Box.
16/02, 21h30 – to a simple, rock ‘n’ roll… song, Michael Clark Company, (Estreia Nacional); CCVF / Grande Auditório.
A tomar nota. A mergulhar neste universo da dança, em Guimarães. •