Há mais de duas décadas em Portugal, Frederic Breitenbucher aceitou, em 2020, o desafio de liderar as cozinhas do The Albatroz Hotel, em Cascais. Desde então, o dia-a-dia tem sido uma verdadeira roda viva, face à qual deu azo à imaginação e avançou com projectos que se têm revelado muito prazeirosos, seja para a sua equipa, seja para os clientes do restaurante desta unidade hoteleira.
O The Albatroz Hotel reabriu as portas no passado dia 29 de Março em regime de rooms service e o pequeno-almoço “Morning Albatroz” é servido das 07h30 às 13h00, para gáudio dos hóspedes de tão paradisíaca unidade hoteleira localizada na baía de Cascais e com vista privilegiada para o oceano Atlântico.
Entretanto, Frederic Breitenbucher, nascido em Estrasburgo, França, prossegue com as suas diligências gastronómicas no âmbito do takeaway, tarefa que tem vindo a desempenhar imediatamente a seguir do momento em que assumiu o papel de chef executivo The Albatroz Hotel. A aposta nos produtos e no receituário portugueses associados à técnica da cozinha francesa fazem parte do quotidiano do chef ou não estivesse Frederic Breitenbucher há mais de 20 anos em Portugal, com o Restaurante do Hotel Fortaleza Do Guincho e as cozinhas do Myriad by SANA Hotels e do Restaurante River Lounge no seu currículo.
A que se dedicou a fazer durante estes últimos meses?
Desde o primeiro confinamento escolhi não ficar parado e, desde logo, tentei encontrar novas soluções, sobretudo porque, em tempo de crise temos de continuar de ser um “actores” do nosso destino e mostrar as nossas capacidades de adaptação. Assumi as minhas novas funções no Restaurante do The Albatroz Hotel, no início do mês de Março de 2020. Duas semanas depois tivemos de fechar as portas. Fui, um dos primeiros a lançar uma oferta de takeaway e entregas ao domicílio. Na altura, tivemos uma certa adesão, mas como tínhamos decido não divulgar a minha entrada, teve menos impacto.
Neste segundo período de confinamento, já com um ano de actividade, decidi que tinha que impor, a mim próprio, um novo desafio: o de poder entregar pratos requintados de fine dinig ao domicílio dos nossos clientes. Com a minha equipa, desenvolvemos uma forma de possibilitar empratamentos mais bonitos e, sobretudo, mais fáceis de fazer em casa. Foi desafiante, mas funcionou muito bem. Teve bastante sucesso e receptividade. Um exemplo deste trabalho foi o desenvolvimento de menu completo à base de trufa Melanosporum, composto por oito momentos, do início até a sobremesa, e conseguimos um objectivo muito importante: despertar o interesse de novos clientes através deste serviço e fidelizá-los sem que ainda não tenham tido a oportunidade de desfrutar de uma refeição no nosso espaço físico.
Houve tempo para pôr em prática o que anteriormente lhe era impossível?
Sim, ecfetivamente, houve mais tempo. Apesar de nunca termos chegado a parar, trabalhámos diariamente e com o mesmo foco de sempre, como a concretização desta nova oferta de entrega em casa, que pode representar um complemento futuro para o nosso restaurante, e continuámos, também, a comunicação, para promover o que temos vindo a fazer. Aproveitei para elaborar planeamentos, no papel, para o futuro – a curto e longo prazo.
Houve, também, mais tempo para estar em casa. Estive mais presente ao fim do dia, o que habitualmente é mais complicado, desfrutando do tempo em família com a minha mulher e os meus dois filhos. Aproveitei para pôr as leituras em dia, especialmente dos livros de cozinha.
Se lhe pedisse para falar sobre o seu percurso profissional, o que diria acerca destes 12 meses?
Foi um dos períodos mais desafiantes da minha vida profissional. Este último ano, foi muito atípico, disruptivo em tudo. Ninguém estava à espera de uma crise sanitária que mudasse por completo a nossa realidade. Para mim, ainda foi uma sensação mais estranha, porque aceitei este novo desafio, o de liderar as cozinhas do The Albatroz Hotel duas semanas antes do mundo parar.
Foi a primeira vez que entrei numa casa nova e, no espaço de 15 dias, tive de fechar as portas. Quando reabrimos no início do Verão, pouco a pouco, conseguimos conquistar e fidelizar novos clientes, mas também seduzir os clientes habituais que, no início, ficaram surpreendidos com a mudança, a nova linha gastronómica e a qualidade que apresentámos.
Foi muito encorajador ouvir esses comentários! Foi um ano tipo “yo-yo”, com altos e baixos, com todas as restrições impostas pelas autoridades, como não podermos trabalhar ao fim de semana. Foi um ano muito duro, mas posso dizer que, apesar de tudo, foi um ano de conquista para mim e para a minha equipa, com um balanço positivo.
Está a desenvolver pratos/criações para a nova temporada que se avizinha? Pode levantar o véu?
Já temos muitas ideias para a nova temporada. Já fizemos alguns testes, mas como sempre só quando as cartas entrarem em vigor é que podemos divulgar detalhes mais concretos. Até ao último dia, há sempre coisas que podem mudar, sobretudo porque há certos produtos, de Primavera, que não tenho a certeza de que venham a estar disponíveis. O hotel reabriu no dia 29 de Março em regime de rooms service. Posso dizer que tenho um produto que odoro e os nossos clientes também, a trufa preta, durante 15 dias, mais ou menos.
Que novidades pondera incluir nos menus de degustação e na carta aquando da reabertura do restaurante do The Albatroz Hotel?
Vamos continuar na linha que começamos a traçar em 2020, a respeito da qual tivemos muito bom feedback por parte dos nossos clientes. Temos uma filosofia bastante reactiva baseada, sobretudo na qualidade dos produtos e na sua frescura. Ao almoço temos uma proposta de pratos do dia que mudamos diariamente, para poder satisfazer e proporcionar variedade aos nossos clientes mais frequentes.
Vai implementar mudanças na sua cozinha, no sentido de abranger um público mais lato ou a estratégia é cingir o serviço a um grupo mais restrito de clientes? Como explica esta decisão?
Posso dizer que as mudanças já fizemos no ano passado. Fizemos um reset total. Quando reabrimos no mês de Maio de 2020, já tinha mudado toda a oferta. Os feedbacks foram muito bons, por isso vamos continuar nessa linha. O ano de 2021 vai ser um ano de afinação e consolidação do nosso conceito.
Qualidade. Criatividade. Preço. Como é a sua cozinha e como vê o futuro do sector da restauração a partir destas três palavras?
Ao longo da minha carreira sempre foi sempre uma preocupação procurar bons produtos e, ao longo do tempo, consegui uma pequena rede de fornecedores que me garante isso mesmo. Quando cheguei ao Albatroz, continuei com essa linha de pensamento. Essas três palavras são muito importantes e têm uma interligação. Elas definem um restaurante onde gostamos de ir e onde queremos voltar.
A qualidade do produto é a base, as pessoas reconhecem-na imediatamente. Temos de ser criativos para sublimar o produto com muito respeito, de forma a valorizá-lo e a diferenciá-lo, não só nas combinações de sabor, mas também no requinte do empratamento, tudo isso a um preço justo. É assim que se consegue fidelizar a clientela. O futuro da restauração passa por aqui.
A ida a um restaurante deve ser um momento mágico e especial, vendemos sonhos. Há outros factores que vão condicionar o futuro. Os restaurantes bem estruturados e localizados fora dos centros de grandes cidades vão poder recuperar mais rapidamente do que a média. Mesmo com lotações reduzidas, vão poder alcançar um volume de vendas equilibrado mais facilmente, o que será certamente mais complicado para mais os pequenos, que vão sofrer mais.
Quão desafiante se tornou este último ano no percurso do chef?
No percurso de chef temos sempre momentos de ascensão e atravessamos períodos de crise. Já passámos por outras crises, como em 2008, por exemplo, quando foi muito profunda e afectou o país com as medidas drásticas de austeridade que tanto custaram aos portugueses, uma crise de carácter económico, dura, longa, mas com uma recuperação previsível.
Desta vez, temos em mãos uma crise sanitária. Não podemos fazer grande planeamento, o que implica um grande esforço e uma gestão de curto prazo, com pouca privisibilidade e visibilidade. Existe ainda outra dimensão, a pandemia afectou muito o lado psicológico das pessoas. Temos de estar mais atentos aos problemas da saúde mental, em especial das nossas equipas.
O grande desafio foi, apesar da incerteza, continuarmos com a nossa filosofia e dinâmica de trabalho, tentando proporcionar momentos únicos e especiais à volta de mesa, desta vez em casa dos nossos clientes. Proporcionar algum conforto e emoções positivas – a cozinha tem esta virtude. Manter as encomendas e continuar a apoiar a nossa rede de fornecedores e produtores, que bem precisam, para manter viva alguma actividade nestes momentos mais complicados. Continuar com as nossas equipas activas, foi essencial, ao mesmo tempo que continuamos. Aliás, nunca parámos, de apoiar, com refeições solidárias, quem precisa. Certo que é uma gota água, mas se cada um de nós contribuir, conseguimos ter algum impacto no apoio social.