Larissa é travo doce na música de estética e conceito independente que troca o seu Brasil – São Paulo – para se radicar na cidade de Leiria. Na música, chega-nos à flor da pele sob o heterónimo de LaBaq. Com ora um violão ora uma guitarra eléctrica (só a título de exemplo) – sem esquecer o português com q.b. de açúcar – tem vindo a conquistar o seu merecido lugar na cena musical portuguesa, nos palcos vários da Europa e da América Latina.
Na música desde tenra idade, Labaq (guitarrista, cantora, compositora e produtora) é corpo e alma musical. Sozinha, como autodidata, ou na via académica, LaBaq, na música, cresceu e construiu um identidade musical que a torna, há um bom par de anos, um nome reconhecido na cena alternativa. No seu universo musical, equilibra o minimalismo da voz acompanhada só de uma guitarra com os momentos onde junta loops e efeitos que nos criam novas paisagens sonoras, brindando-nos com um… Ousemos chamar indie-electrónico. Todavia, rotular LaBaq é demasiado castrador para alguém a quem sentimos uma capacidade musical de viajar e nos levar a viajar por diferentes paisagens sonoras, sem amarras, sem medos de experimentar sonoridades, sem medo de deixar de ser indie pop para ser experimental ou pop avant-garde.
Na bagagem editorial carrega “Voa” (de 2016) e “Lux” (2019), dois álbuns onde garante que é nome a reter da música contemporânea brasileira. Neste equilíbrio de meio de semana, é com Larissa que reflectimos sobre os últimos meses na vida de uma multi-instrumentista radicada em terras lusas.
Se te pedisse para escolheres uma nota musical ou frequência hertziana ou um valor em decibéis para resumir estes últimos 12 meses, qual seria e porquê?
(L): Db6/9 – Chato de fazer, estranho de ouvir porque acaba ficando distante do que eu faço normalmente, mas uma vez que ele existe, depois de tanto tocar, acabamos por nos acostumar. No fundo, até tem seu quê de bonito, mas é preciso ouvir muito para aprender a abraçar a estranheza dele.
Houve tranquilidade e disponibilidade – física e mental – para pôr em prática o que anteriormente te era quase impossível, como tirar projectos da gaveta ou reorganizar-te?
(L): No início da pandemia não tive esse espaço, estar na Itália e ficar isolada por lá sem saber quando poderia voltar, foi intenso. Acho que o equilíbrio e alguma organização vieram mais no segundo isolamento, desde repensar ideias e planos até organizar antigos discos externos com fotos e etc.
Como encaraste e encaras os concertos em streaming? São de alguma forma um motor para se manter uma certa actividade, te sentires activo?
(L): Acho que foi a saída e foi muito importante para muitos de nós nesse último ano; não só financeiramente, mas também para termos algum tipo de conexão com o público. A essa altura eu sinto que todo mundo anda bastante saturado de concertos em streaming, de redes sociais, desse mundo digital em geral e acho que é natural, muito tempo em telas e a falta do contato real com as pessoas, ao longo do tempo, pode ser muito confuso, eu acho.
Estás a desenvolver músicas/produções ou programação para a nova temporada pós-confinamento que se avizinha? Se sim, podes levantar a ponta do véu?
(L): Ando fazendo esse planejamento com mais calma. Termino em alguns meses um curso de producao musical que muito me tem inspirado e a partir dessa temporada de estudos vou fazer outros planos, mas o que consigo dizer é que há concertos muito giros durante o verão, também trabalho em algumas colaborações com artistas que gosto muito e venho produzindo o trabalho de outros artistas, o que me entusiasma bastante nesse momento.
Como se organiza uma agenda com tantas incertezas e reagendamentos constantes? É exequível programar ensaios, concertos e tours a curto e longo prazo?
(L): Tanto eu quanto minha equipa estamos caminhando a passos mais lentos nos planos a longo prazo desde o início da pandemia e sentimos que ainda é um momento de observar como fluem os próximos meses antes de fazermos planos mais sólidos, que envolvam tours muito longas, concertos internacionais ou coisas do gênero. Acho que é o caminho mais sensato a se fazer, para já.
Sentes que a paragem forçada da cena musical transformou o olhar do público e a mesma passou, finalmente, a ser mais olhada como profissão e não como hobby?
(L): Eu acho que evoluímos essa discussão durante a pandemia, o refúgio de toda a gente acabou por ser música, filmes, livros e entendemos a arte como vital e necessária, porém as questões são mais profundas que isso, a desvalorização do artista é algo muito enraizado na sociedade e isso vem por diversas razões, e cultural, basicamente. Educar para as próximas gerações a entenderem que a arte é importante e precisa ser valorizada me parece o caminho.
Produção. Criatividade. Palcos. Como é a tua rotina de músico e como vês o futuro do teu sector a partir destas três palavras?
(L): Me divido entre o criativo, os estudos, redes sociais e o burocrático/planejamentos, em algum momento tudo se entrelaça, depois dissolve e assim por diante. A rotina em si sempre depende do que está acontecendo em um momento, se tenho concertos ou lançamentos vou estar mais em torno de planejamentos e redes sociais, tempos de concertos também envolvem estudos e ensaios, por exemplo.
Acredito que o futuro vai caminhar a passos lentos, para encontrar o equilíbrio e voltarmos a ser criativos precisamos estar bem emocionalmente, para que tudo volte a ter ritmo eu acho que a palavra chave é saúde, emocional e física, individual e coletiva.
Quão desafiante se tornou este último ano no teu percurso enquanto músico? Como geriste a falta física dos teus pares, ao teu lado? O que mais mudou na tua perspectiva sobre o teu trabalho?
(L): Deve ter sido o ano mais desafiador da minha vida, assim como o foi para muitos, eu tenho certeza. Distâncias físicas, a falta do que vem do exterior e que nos dava tanta força, inspiração, abraços, conversas, tudo isso reflete no que eu produzo enquanto artista então foi confuso reorganizar o meu ser/estar sem as viagens, as trocas com público e outros artistas. Eu me percebi parando forçadamente após sete anos de viagens, sem rotinas, basicamente nômade, então foi descobrir quem eu sou sem tudo isso, foi intenso e bonito ao mesmo tempo.
A mudança mais marcante em termos de perspectiva sobre o meu trabalho foi aceitar que as coisas acontecem e fogem do nosso controle em todos os níveis imagináveis, para além dos níveis que eu já estava acostumada a lidar. Poder encarar tudo isso e suspender tantos planos e ideias foi difícil em um primeiro momento, mas incrível quando aceitei que era isso e quando consegui aceitar, outras coisas vieram, aulas de produção musical, colaborações com artistas dos quais sou muito fã, etc. •