Museu Nacional de Machado de Castro / Identidade da Arte

Melhor Museu do Ano 2013: Museu Nacional de Machado de Castro (MNMC), Coimbra. Com a Dr.ª Ana Alcoforado, Diretora do Museu, a Mutante visitou o MNMC para vos comprovar, numa breve suma, a obrigatoriedade de se conhecer este espaço ímpar, da museologia nacional.

A história do espaço que se vê, percorre e vive tem cerca de 2000 anos. O Museu, enquanto museu, estamos a falar de 100 anos, celebrados em 2013. Fazer um retrato do espaço, mesmo que longo, é sempre ato inglório, aquém do que se gostaria de contar, e escrever sobre o espólio, que hoje existe, era ter de visitar, também, a “Fundação Oriente (Lisboa) onde 40% da coleção é pertença do MNMC ou ir até ao Paço dos Duques de Bragança onde 60 a 70% da coleção pertence ao museu…”, a que se junta o espólio, no espaço onde nos encontramos que nos arrebata, onde teríamos de falar dos 15% expostos e muito, muito mais em reserva. Assim, façamos um breve exercício de convite peremptório à vossa visita.

O MNMC tem hoje a merecida casa que há muito lhe era de direito, deixando para trás um edifício sem as condições necessárias a um museu contemporâneo, capaz de mostrar a sua vasta coleção, tendo sido “um dos maiores investimentos feito pelo Instituto dos Museus nos últimos anos e em boa altura”. É um museu com características muito próprias “tendo sido classificado como a segunda maior coleção de arte a nível nacional e o segundo maior museu”, museu este que vê a sua área triplicada e que ainda tem, no horizonte, um alongar do seu espaço e um auditório quase terminado. À chegada, tomamos desde logo contacto com a história no modo como o projeto devolveu o espaço à cidade, pela mão de uma vasta equipa multidisciplinar liderada pela sábia e segura mão do arquiteto Gonçalo Byrne, criando “uma praça pública aberta à cidade que está na génese do museu”. Na loggia nos perdemos de encantos… e caminhamos para um espaço assente em dois pilares determinantes que conduziram e definiram as linhas orientadoras de Byrne: o reconhecido Criptopórtico Romano – arquitetura civil romana mais importante e mais bem conservada de toda a Península Ibérica; e a coleção de escultura em pedra que está ligada à origem do museu que é identitário de uma região – Coimbra tem um património forte na escultura dada a existência de jazigos de pedra de Ançã que foram um mote para o desenvolvimento artístico da região na arquitectura e escultura, e não fosse o patrono escolhido Machado de Castro, grande escultor e divulgador da escultura portuguesa. Como dois pontos (pilares) definem uma reta, eis os dois pontos base para vos acicatar, por (quase) extenso:

Criptopórtico Romano.

A memória que resta do Fórum de uma ida Aeminium. Em estudos sabe-se que a autoria é de Caius Sevius Lupus, designado como architectus aeminiensis e reconhecido pelo desenho do Criptopórtico, construção imponente na altura. Com dois pisos visitáveis eis que hoje se tem conhecimento, seguro, que antes deste Criptopórtico do período de Cláudio houve, ali, um outro do período de Augusto… pois neste museu, viajamos na história de forma real sempre acompanhados de quiosques que nos constroem imagens desaparecidas e “vemos escavações musificadas que nos permitem ler os patamares da história, patamares que nunca param de ser explorados”. É uma estrutura que, com este renovado museu, ganha uma projeção que há muito lhe era devida podendo ser visitado separadamente do museu e sendo um dos espaços mais desejados e emblemáticos. Aqui temos o confronto direto com um palimpsesto único de histórias de arquiteturas feitas e com o desafio de enquadrar pré-existências, reforçando a parte romana do edifício, “pedido expresso ao arquiteto era que todo o projeto tivesse sempre esta identidade com a época romana, que é o vestígio da cidade de Aeminium”.

Coleções do MNMC.

A memória que nos leva do século I ao século XX e “por força desta o âmbito cronológico do museu é muito alargado portanto, é um museu essencialmente de arte, de arte antiga, de arte religiosa, mas que abarca coleções muito dispersas”. Como referido “é o grande museu nacional da escultura”, é ela que, indubitavelmente, nos arrebata no início com capitéis românicos, com a subtileza de um claustro reerguido e nos tira o ar com a Capela do Tesoureiro no modo como uma Capela foi remontada num museu e se tornou ela numa escultura, numa peça de arte ladeada por uma coleção ímpar de retábulos em pedra, apogeu da nossa renascença, é um “elemento museográfico de leitura clara e perceptível”. E não esquecer a Sala Hodart, aquela coleção de escultura de terracota de valor imensurável, datada de 1530/34, a expressão singular de corpos na Última Ceia, exemplo de intervenção e restauro para o futuro. Mas o museu é também uma coleção de pintura que nos prende na leitura – embora mais pequena que outras, é outra de cerâmica, é a coleção de ourivesaria medieval de grande relevo, é um tesouro da Rainha que foi Santa, padroeira da cidade e é tanto mais, que o olhar pede no mínimo três horas se quase tudo se quiser ver. É museu e museografia numa arquitetura contemporânea de excelência e história obrigatória.

O Museu Nacional de Machado de Castro sabe viver dos seu pontos mais fortes em equilíbrio perfeito com as coleções que, embora ricas, são de dimensão menor; é um espaço que é aberto, que tem luz natural a vingar sempre que possível, com percursos e transparências e cotas várias, é um espaço permeável que deixa a cidade entrar. Pensou-se “no museu enquanto espaço único, diferente” no conceito e visita. E, à medida que o percurso se faz, sentimos a ligeireza com que o fazemos, sem barreiras, sem percalços em calços, com informação que nos ensina. Um museu cujas acessibilidades foram pensadas no físico e no intelectual… porque por vezes só queremos admirar a arte e outras vezes queremos também estudar a arte. É a identidade de uma cidade romana, de um museu preenchido e é, no fim de cada visita, um descanso do artista no Loggia Restaurante… Pedimos um café? •

+ www.museumachadocastro.pt
© Fotografia: Inês Prazeres