Produto, produtor e chef: A [plataforma] Matéria por João Rodrigues

Começou com um menu, evoluiu para jantares-desafio com chefs de fora de portas e, em meados de 2018, dará corpo a uma rede online aberta a todos os que querem saber “onde está o produto, quem é o produtor e onde o podemos ter”.

A explicação, como se pode ler, é simples. Porém, a estruturação desta plataforma surgiu há algum tempo: “É um desejo antigo, um projecto pessoal diferenciado, embora criado dentro do mesmo conceito.” Quem explica é João Rodrigues, chef do restaurante Feitoria (1 estrela Michelin), do Altis Belém Hotel & Spa, em Lisboa, para quem esta estrutura online “vem responder a uma necessidade que eu sinto que é: onde está o produto, quem é o produtor e onde o podemos ter”. Se quiséssemos cingir a explicação a uma súmula, diríamos que a plataforma Matéria consiste numa rede de informação implementada por João Rodrigues, com o intuito de reunir uma lista de produtos previamente sujeitos a uma investigação. “Já há muita investigação feita, há muito trabalho feito, mas está espalhado. Portanto, a ideia é ir ‘beber’ a esses trabalhos, falar com as pessoas que o fizeram e trazê-lo para a plataforma, e identificar cada produto, em termos científicos, históricos, sociais e de utilização, de localização”, afirma o chef do Feitoria. Deste modo, esta plataforma online terá os produtos distribuídos por cada região do país e o contacto directo do produtor. “Estamos a valorizar o produto e o produtor e, ao mesmo tempo, estamos a criar uma rede de contactos entre os chefs.”

Mas de que forma é “alimentada” a plataforma Matéria? “A primeira fase terá a ver com a minha própria pesquisa e com o meu próprio espólio de produtores que será ali exposto para todos. O que quero que aconteça é que cada chef, foodie, interessado, empresário da restauração possa aceder através de um login e colocar o seu contributo.” É feito o rastreio e analisado o produto, um a um. Para o efeito, haverá um trabalho conjunto entre pólos universitários e historiadores e biólogos, entre outros doutos conhecedores da matéria. “Depois colocamos o produto na base. A parte interessante é associar à plataforma a pessoa que traz esse produtor, para que não pareça um trabalho só meu. Temos contactos previstos, pessoas identificadas, parcerias previstas, mas isto tudo assenta, para já, em muita carolice.”

A necessidade é, por sua vez, comum a muitos chefs.

“Para já, esta rede não contempla produtos transformados, como compota, marmelada, bolachas, pão-de-ló; apenas o produto de origem.” Para além disso, garante que não será atribuída exclusividade ao autóctone, apesar de vir a ser implementada essa mesma diferenciação.

“O passo, para 2018, será fazer desta plataforma uma ferramenta criada para todos, até porque vai permanecer no universo online para chefs e cozinheiros do país”. Porquê? “Porque quero construir um trabalho para a comunidade, quero fazer algo, quero participar em algo.”

O apoio provém do Grupo Altis, ao qual pertence o Altis Belém Hotel & Spa, unidade hoteleira onde está o Feitoria. “Tive todo o apoio do grupo onde trabalho e tenho de agradecê-lo, por me deixarem fazer esta ideia louca – um menu chamado matéria que depois a própria carta evoluiu para ser um pequeno livro de cozinha. A verdade é esta, podiam ter escolhido um caminho, mas deixaram-me escolher meio caminho e acreditaram até agora e deixaram-me fazer os jantares. Depois há todo um lado que se tem de construir para além dos muros do Altis, porque é um trabalho para a comunidade, um trabalho com o qual não podemos sobrecarregar o grupo, mas que tem de ser posto lá fora e a ideia é todos contribuírem – todos os que quiserem.”

Relembramos que o histórico deste projecto começa com o menu Matéria em Outubro de 2016, quando o chef lisboeta começa a mostrar o produto tal como ele é, ou seja, desde essa data, João Rodrigues faz questão de levar à mesa o produto-protagonista do prato que se segue no alinhamento da carta ou do menu de degustação, “é trazer a terra, o mar e as pessoas à mesa de quem nos visita.” Um trabalho complementado, desde Outubro de 2017, com os jantares Matéria, a segunda parte abrangida por este conceito e para os quais está a convidar chefs internacionais. O objectivo é levá-los a visitar regiões do país, explorar o que por lá se produz, conhecer os produtores e as gentes da terra, e um chef local. Por fim, é apresentado o desafio: idealizar composições, cozinhar esses mesmos ingredientes e, com eles, criar pratos (ler aqui). •

+ Restaurante Feitoria
© Fotografia: João Pedro Rato

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