Quando é que vamos de férias… cá dentro?

Natureza, espaço, autenticidade, simplicidade, qualidade. Este são apenas alguns dos atributos da nossa hospitalidade tantas vezes sublimada e que, certamente, irão (re)conquistar portugueses e estrangeiros, para que desfrutem da entrega ao ócio com o tão merecido vagar. Mas, afinal, como se vai tirar partido de tão valiosos predicados?

Do imenso vocabulário Português, qual será a palavra que mais se associa à hotelaria na reabertura deste sector findo o próximo Estado de Emergência?


“Portugal não ficará fora de moda dentro dessas novas tendências”
Raul Martins, Presidente do Conselho de Administração do grupo Altis Hotels / © Altis Hotels


Rita Soares, CEO da Herdade da Malhadinha Nova, localizada em Albernoa, no concelho de Beja, no Baixo Alentejo, decidiu fechar o seu Turismo em Espaço Rural – recentemente renovado e ampliado – no passado dia 12 de Março, como medida de prevenção face à realidade. Mulher determinada e caracterizada por um dinamismo e positivismo ímpares, Rita Soares diz-nos, porém, que “a retoma [da hotelaria no período ‘pós-covid-19’] será muito lenta” e “não acredito num novo paradigma para além do que estamos a viver para este ano”

Dentro da mesma linha de pensamento está Raul Martins. O Presidente do Conselho de Administração do grupo Altis Hotels afirma que “a retoma vai ser lenta e difícil”. O facto desta pandemia apresentar “um enorme risco de contágio” tem como consequência a “relutância enorme em viajar até que haja, entretanto, um medicamento e, mais tarde, uma vacina”. Raul Martins refere que as viagens e, por razões óbvias, o turismo, serão igualmente afectados pela redução da capacidade financeira de muitos. Ou seja, “vai haver uma redução da capacidade disponível para fazer viagens” que, deste modo, deixarão de ser uma prioridade para eventuais turistas.


“As Políticas de Higiene e Segurança serão cada vez mais relevantes para a decisão dos viajantes”
Nuno Antunes, Assessor da Administração do grupo madeirense Savoy Signature

Apesar do futuro incerto, Nuno Antunes afirma não ter dúvidas de que a hotelaria será o sector “que mais perdas registará a médio e longo prazo”. O assessor da administração da Savoy Signature, grupo detentor de cinco hotéis e resorts, na ilha da Madeira, salienta os desafios a que terão de dar rápida resposta face às “possível mudanças no perfil do viajante e até dos próprios mercados emissores”. Ou seja, a exigência vai subir de tom na tomada de decisão no que à escolha do destino e do hotel diz respeito, mais concretamente “ao nível planos de segurança e higienização dos espaços, assim como, estratégias de prevenção e medidas a adoptar em cenários de surtos como este que agora vivemos. As Políticas de Higiene e Segurança serão cada vez mais relevantes para a decisão dos viajantes”, afirma o assessor da Administração da Savoy Signature.

Outro aspecto preponderante a reter nesta matéria está relacionado com os hóspedes que viajam em negócios. “Eventos de negócios e sobretudo o segmento MICE vão ser altamente afetados. Este segmento, directamente relacionado com a situação económica de cada mercado, será também o último a recuperar. A resposta dependerá da recuperação ao nível económico dos próprios países”. No entanto, “haverá tendência de realizar eventos empresariais nos próprios países, à semelhança do que aconteceu com a crise que se iniciou na final de 2008”.

Durante esta fase preenchida pela dúvida, Raul Martins reforça, também, a mudança, com os turistas a elegerem espaços sem aglomerados: “não vão querer hotéis tão grandes nem com muitas pessoas.” Mesmo assim, “Portugal não ficará fora de moda dentro dessas novas tendências”, salienta o Presidente do Conselho de Administração do grupo Altis Hotels, que reforça o facto da propagação da doença “ser razoavelmente contida” no país.

Luísa Amorim, CEO da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo –  propriedade vinhateira localizada em Covas do Douro, no concelho de Sabrosa, no coração do Douro – assegura que, “durante algum tempo, [os turistas] vão preferir lugares mais seguros, mais autênticos e longe de alguma confusão”. Rita Soares vai mais longe: “acredito na mais-valia dos projectos sustentáveis e inseridos em zonas menos povoadas onde o contacto com a natureza seja privilegiado. (…) Cabe a nós, empresários e portugueses, valorizar as nossas mais-valias e oferecer qualidade”.


“O sector da hotelaria só vai ser forte se souber redesenhar e proporcionar aos seus hóspedes experiências únicas”
Carmen e Paulo Romão, fundadores das Casas do Côro, na Aldeia Histórica de Marialva

“O que vai mudar no setor da hotelaria no ‘pós Covid-19’ decorre da adaptação que teremos que ter para a transformação que se está a operar na mentalidade das pessoas, na forma diferente de que todos passamos ver o mundo – de valorizar a relação entre as pessoas, de valorizar a vida com total liberdade”. As palavras são de Carmen e Paulo Romão, fundadores das Casas do Côro, o boutique hotel cuja implementação começou, há duas décadas, entre ancestrais paredes de granito da Aldeia Histórica de Marialva, localizada no concelho de Mêda, no distrito da Guarda, onde a baixa densidade populacional é uma mais-valia. Para ambos “muitas pessoas estão a aperceber-se que o tempo lhes pode fugir mais depressa do que o que pensavam. É por isso que o sector da hotelaria só vai ser forte se souber redesenhar e proporcionar aos seus hóspedes experiências únicas”.


Com estas alterações, será que vai haver um “novo luxo” na hotelaria?


“O facto de estarmos situados numa propriedade grande numa das zonas menos povoadas da Europa, onde a produção de vinho e a recriação da gastronomia alentejana de forma auto-suficiente, o retorno à terra e às origens, o contacto com a natureza são alguns atributos que, sem sombra de dúvida, farão parte do novo luxo”
Rita Soares, CEO da Herdade da Malhadinha Nova, em Albernoa, concelho de Beja

Privilegiada por uma envolvente (quase) infinita primada pelos tons terra e os verdes dos cerca de 80 hectares de vinha, sem contar com o montado nem os pomares, a Herdade da Malhadinha Nova é dotada pela sustentabilidade e pelo modo de produção biológico. A ambas, acresce “a comercialização de experiências que envolvem o artesanato local e os artesãos, a relação com a cultura e as preocupações sociais, o sentido do sítio”, enumera Rita Soares, para quem estas são apenas algumas das mais-valias deste tipo de turismo. “O facto de estarmos situados numa propriedade grande numa das zonas menos povoadas da Europa, onde a produção de vinho e a recriação da gastronomia alentejana de forma auto-suficiente, o retorno à terra e às origens, o contacto com a natureza são alguns atributos que, sem sombra de dúvida, farão parte do novo luxo”


“[A Villa Extramuros é] um lugar ideal para o ‘confinamento’ voluntário”
François Savatier, co-proprietário da Villa Extramuros, em Arraiolos, no distrito de Évora / © Ricardo Junqueira

Os hóspedes da Villa Extramuros desfrutam do mesmo privilégio. Este Turismo em Espaço Rural, localizado em Arraiolos, no distrito de Évora, convive pacificamente com a natureza em pleno Alentejo. Sem esquecer o “tamanho generoso dos quartos, todos com terraço privado, o espaço do pátio interior” da casa mãe nem as cabanas independentes inseridas na envolvente campestre, “um lugar ideal para o ‘confinamento’ voluntário”, descreve François Savatier, co-fundador deste projecto a par com Jean-Christophe Lalanne.

Paulo e Carmen Romão descrevem o novo luxo como sendo “a autenticidade, a paz, o silêncio, a natureza, o atendimento muito personalizado. Em suma, a importância cada vez maior da componente humana, vai seguramente sair mais reforçado depois desta situação”

O atendimento personalizado é igualmente um dos factores apontados por Rodrigo Herédia. O empresário e conhecido surfista que, a 7 de Junho de 2019, abriu as portas do seu Sul Villas & Spa, em Lagoa, na costa sul da ilha de São Miguel, Açores, considera que “a era do novo luxo já tinha surgido há uns anos” e dele não prescindiu quando criou o seu quatro estrelas, “onde o requinte simples aliado a um serviço de excelência, a uma personalização do atendimento e a uma boa localização aliados à sustentabilidade irão tornar o luxo cada vez mais simples!”

Apesar de “estarmos muito dependentes dos transportes aéreos”, após esta epidemia, “a procura por destinos sustentáveis e de natureza vão ser uma realidade, bem como unidades mais pequenas, com os alojamentos mais espaçados e com menor número de hóspedes, serão uma escolha e o Sul Villas & Spa está enquadrado em todos os pontos acima referidos. Como tal, acho que será um dos espaços que irá beneficiar no pós era covid”, acrescenta Rodrigo Herédia.


“Nós vivemos muito de quem procura um bom vinho, uma boa gastronomia, uma história diferente e de um bom lugar para usufruir da vida. Penso que mais do que nunca as pessoas vão querer conhecer a beleza e a tranquilidade do Vale do Douro”
Luísa Amorim, CEO da Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo, em Covas do Douro, concelho de Sabrosa, Douro / © Quinta Nova


Luísa Amorim destaca a oferta implementada na Quinta Nova de Nossa Senhora do Carmo e a forma como está, “sobretudo, relacionada com a natureza, com a cultura local e com o verdadeiro luxo da vida, que é apreciar as coisas simples servidas com muita qualidade”. Aliás, o facto de integrar a valência de enoturismo é, por si só, uma mais-valia: “nós vivemos muito de quem procura um bom vinho, uma boa gastronomia, uma história diferente e de um bom lugar para usufruir da vida. Penso que mais do que nunca as pessoas vão querer conhecer a beleza e a tranquilidade do Vale do Douro.” Da mesma vantagem desfruta a Herdade da Malhadinha Nova, pois além do alojamento e do restaurante, é de salientar a produção vinho feito a partir das uvas colhidas na vinha desta propriedade que, agora, soma 460 hectares.

Para Nuno Antunes, “o próprio conceito de luxo tem vindo a mudar e nós temos uma vantagem no que diz respeito à oferta de slow travel, que permite conhecer os espaços de uma forma mais autêntica, relaxada e segura.” Personalizar é outro dos predicados da Savoy Signature e uma mais-valia na estratégia de diferenciação deste grupo madeirense, que remete para a afirmação de “uma nova tendência de luxo no que diz respeito à procura da autenticidade, adicionando a individualidade de cada experiência dentro e fora do hotel”. O assessor da Administração da Savoy Signture salienta, ainda, “as boas práticas na higienização dos espaços, assim como, uma atenção mais personalizada e dedicada ao conforto do cliente em cada momento da sua estada”, realidades acrescidas que conferem o tão solicitado “distanciamento social, sobretudo numa fase transitória”. Como consequência, a capacidade dos equipamentos turísticos terá de diminuir, “o que poderá resultar em preços superiores para garantir taxas de rentabilidade dos operadores”.

Quando estará aberta a época de férias cá dentro?

Luísa Amorim afirma que não perderam a confiança dos turistas, mas “os clientes terão de percepcionar que o cenário de pandemia desapareceu”. Com o Wine Hotel completamente remodelado, “estamos a trabalhar em estratégias de aproximação aos nossos clientes, por email, através da loja online e de uma série de novos serviços disponíveis no nosso novo website. Por isso, acredita que, durante o verão, “os portugueses vão fazer férias cá dentro o que, apesar de ser um cliché, fica bem a todos e a todos os níveis”. Por essa razão, aponta que, “a partir de Junho, Julho, vamos ter várias visitas e hóspedes”

Por sua vez, Raul Martins apresenta o plano de reabertura de cinco dos seus seis hotéis, uma vez que o Altis Suites se mantém aberto, porque “tem clientes próprios que são residentes” assegurando, por essa razão, o cumprimentos das indicações implementadas pela Direcção Geral de Saúde. Assim, o Altis Avenida, o Altis Belém Hotel & Spa e o Altis Prata são os primeiros a reabrir as suas portas, em Julho. Em Agosto, será a vez do Altis Prime e, em Setembro, é a altura de pôr a funcionar o Altis Grand Hotel.

Ainda sem data marcada, mas com uma enorme vontade de receber novamente hóspedes, a Savoy Signature tem “vários planos preparados tendo em conta as possibilidades de evolução deste cenário e das medidas a serem tomadas nos próximos dias ao nível regional e nacional”. De acordo com Nuno Antunes, está programada a reabertura de um hotel no Funchal e de um outro na Calheta, município localizado na zona oeste da ilha da Madeira, “sendo este último muito mais direcionado ao mercado regional, sobretudo numa primeira fase”, até porque é muito comum os madeirenses aproveitarem algumas das suas férias nos “seus” hotéis. 


“Acredito que seja a desforra de muitos que este ano não puderam viajar!”
Rodrigo Herédia, proprietário do Sul Villas & Spa, em Lagoa, na ilha de São Miguel, Açores / © Sul Villas & Spa

Sobre esta fase de transição, o tempo permanece indeterminado até que o turismo possa retomar a tão desejada normalidade. Há quem aponte para meados de 2021, como é o caso de Rodrigo Herédia. O proprietário do Sul Villas & Spa admite que após esta quebra, “vem um crescimento e uma procura enorme” que terá reflexo “só a partir de Março de 2021”, devido à acentuada diminuição de viagens aéreas de que o arquipélago açoriano tanto depende para receber turistas. “Acredito que seja a desforra de muitos que este ano não puderam viajar!” 

No entanto, este regresso à normalidade só acontecerá, para François Savatier, no Verão de 2021 e, paralelamente, depois da vacina, advertência supracitada por Raul Martins. “De uma maneira geral, as viagens de longa distancia vão demorar algum tempo a recuperar e os clientes irão ter vontade de confirmar reservas mais tarde ou no último minuto”, acautela o co-proprietário da Villa Extramuros. Em todo o caso, e apesar das estratégias que vão implementar no sentido de reconquistar os seus hóspedes, “a última coisa que queremos fazer é entrar na guerra dos preços, porque não queremos degradar a qualidade dos nossos serviços”, sublinha François Savatier.

Já Rita Soares considera que este “será um novo paradigma”, ou seja, conta com a probabilidade de se poder definir viagens “livres e sem quaisquer receios ou restrições” daqui a dois anos.

Carmen e Paulo Romão estimam que, “antes de Maio de 2021, não estaremos a operar com a normalidade desejada”. Mesmo assim, “temos assistido a hóspedes fidelizados que ligam todos os dias, com palavras de estímulo e a promessa de que é nas Casas do Côro que sonham para a sua primeira saída”. Por isso, “a única estratégia importante é a da manutenção de níveis de comunicação constantes com os nossos hóspedes, para que eles saibam o que estamos a fazer nestes tempos difíceis e na preparação da reabertura, para os receber com mais paixão do que antes”.

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Foto de entrada: © João Pedro Rato


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