A cidade de Estremoz é o epicentro de toda a folia deste coleccionador de arte, que também assume a função de produtor de vitivinícola. As uvas vêm de Portalegre, mas também da sub-região de Monção e Melgaço, e as boas novas prometem elevar a fasquia.
Alentejo rima com vinho de talha. O tema é pertinente, já que a estreia da multidisciplinar Howard’s Folly neste contexto aconteceu no Verão deste ano. Frescho? tinto 2020 é o nome deste field blend feito a partir de vinhas velhas, para se beber fresco, e que pertence ao portefólio deste projecto, iniciado em 2002, pelo coleccionador de arte e empresário britânico, e produtor de vinho, Howard Bilton, em parceria com o enólogo australiano David Baverstock. No rótulo, figura o degelo na Gronelândia, alerta subliminar associado à questão do aquecimento global. O próximo será um vinho de talha branco elaborado com vinhas velhas, da colheita de 2021, que estagia no ovo de Beannes – cuba de betão, cujo formato se assemelha a um ovo. Quanto ao nome, o melhor é aguardar.
Mas do que se trata a Howard’s Folly? Pois bem, é um projecto multidisciplinar que reúne vinho, arte e restauração, vertentes concentradas no edifício restaurado, em 2008, por Howard Bilton, em Estremoz. Continuemos pelo universo vitivinícola, com o foco na adega. Instalado nesse meso edifício, este espaço reservado à produção vínica é acessível através da porta, que não é mais do que uma caixa de vidro cheia de rolhas de cortiça, do restaurante The Folly.
“Queríamos ter uma adega boutique, porque não queremos chegar à produção de milhões de garrafas, além de que queremos continuar a fazer vinhos únicos”, explica Howard Bilton. Ambos conheceram-se em Lisboa e a empatia, na dose certa, contribuiu para uma amizade, com potencial de guarda.
Junto às cubas de inox, está o mural da autoria do ilustrador e designer gráfico português Le Funky a combinar com uma inusitada peça móvel, exposta neste momento de pausa na adega, além de outras obras de arte discretamente dispostas neste espaço.
Sobre a arte do vinho, as uvas aqui recebidas provêm de 6,5 hectares de vinhas velhas situadas na Serra de São Mamede, em Portalegre, Alto Alentejo. A esta junta-se a matéria-prima vindimada em vinhas velhas – estas com uma média superior a 70 anos – de pequenos produtores de uva, de Portalegre. “Altitude e frescura” são os atributos que o nosso anfitrião enaltece nos vinhos vinhos feitos a partir das uvas vindimadas em Portalegre.
Já a casta Alvarinho é proveniente da sub-região de Monção e Melgaço, da Região Demarcada dos Vinhos Verdes. Dá corpo ao Howard’s Folly Alvarinho 2017 (€12), mas também ao Sonhador Alvarinho 2013 (€72), desta feita, no alinhamento do projecto nascido de uma ideia de David Baverstock – que conta com o apoio de Pedro Furiel, enólogo residente. “Adveio do sonho de David querer fazer o seu vinho. Também foi muito importante para mim, porque sem o David não teria aberto as portas desta adega, porque, do ponto de vista financeira, fazer vinhos é uma loucura!”
Neste alinhamento cabe a estreia do rosé na gama Sonhador, com a colheita de 2019 (€12), o Sonhador branco 2019 (€12), resultante de um field blend de vinhas velhas localizadas no sopé granítico da Serra de São Mamede, e o Sonhador tinto 2016 (€12) – a primeira edição é da colheita de 2011 –, feito a partir de uvas vindimadas em vinhas plantadas em solo de granito de Portalegre.
“Todos dos rótulos continuam a ser feitos por crianças”, sublinha Howard Bilton, referindo-se à imagem estampada na garrafa da gama Sonhador e à Sovereign Art Foundation, instituição por si fundada em 2003, no sentido de usar os benefícios da pintura e das artes, no seu todo, como terapia, para crianças asitáticas carenciadas. Anualmente, é organizado o Sovereign Asian Art Prize, concurso de arte, em que parte dos lucros reverte para a fundação. Os desenhos dos vencedores vão para os rótulos da Howard’s Flly, como é o caso do Reserva tinto da colheita de 2016, que ostenta uma obra-prima de Kniw Mang Ho, a.k.a. Frog King, artista conceptual de Horng Kong, e será apresentado no mercado este mês de Novembro de 2021. Sem esquecer as obras de arte expostas na galeria, instalada na torre norte, onde, a cada dois meses, há uma mostra pronta a receber visitantes.
Outro vinho a ter em atenção é Howard’s Foly Edição Especial Dirk Niepoort tinto 2019 (a partir de €40). Feito a partir de uma selecção de vinhos pelo próprio produtor e enólogo, rosto da quinta geração da família holandesa instituída desde o século XIX, marca a estreia de uma gama de vinhos baseada nas amizades de Howard Bilton. “O próximo ‘amigo’ será o Câteau Cheval Blanc, em Saint-Émillion, França”, revela o produtor vitivinícola britânico. “Penso que o mercado está aberto a diferentes estilos, a evoluir neste sentido”, continua o nosso anfitrião, para esclarecer esta parceria e a ousadia de dar liberdade a David Baverstock, para realizar as suas experiências na adega.
A cozinha afinada do chef Hugo Bernardo
The Folly, nome atribuído ao espaço de restauração, aberto desde Fevereiro de 2020, no piso térreo do edifício da Howard’s Folly, é simultaneamente uma espécie de galeria de arte. O ambiente informal e eclético, marcado, ora por peças artísticas contemporâneas, ora pela tapeçaria típica do Alentejo, combinam com a carta desenhada pelo chef Hugo Bernardo.
Aos pratos regionais do país, Hugo Bernardo atribui simplicidade, para descomplicar, e muito sabor, a simbiose perfeita para harmonizar com os vinhos da garrafeira desta casa. Não faltam, por isso, a cabeça de xara, a alheira alentejana, o prego do chef ou as asas de frango fritas.
Das influências de outras cozinhas espalhadas pelo mundo, é de destacar os camarões enrolados em massa kataifi, as batatas bravas, os ovos rotos e o novilho.
À sobremesa, sublinhe-se o brownie de chocolate negro, beterraba e gelado de chá earl gray, que tem de permanecer nesta lista, bem como a tarte praliné de avelã e chocolate, para rimarem com o Vinho de Carcavelos da colheita de 1991, apresentado em Fevereiro de 2021, pela Howard’s Folly. A oportunidade de incluir esta relíquia no portefólio de vinhos deste produtor, surgiu na sequência de uma parceria com a Quinta dos Pesos, “porque precisava de um vinho, para terminar a refeição aqui, no restaurante”, declara Howard Bilton. Eis, portanto, um dos muitos pretextos, para visitar a Howard’s Folly e terminar este roteiro vínico à mesa do The Folly.
Brindemos!