Gruta. Os sabores e produtos de Portugal e do Brasil cruzam-se à mesa do restaurante portuense

Entre a multidão à procura do melhor ângulo para captar o charme do Majestic Café e os quase 16 mil azulejos que ocupam as fachadas da Capela das Almas sem deixar ninguém indiferente, escondem-se, à vista de todos, autênticas pérolas à espera de serem descobertas.

A corvina selvagem, servida com puré de castanhas, molho de açaí, beurre blanc e chips de castanha, brilha na nova carta do espaço, uma ode à criatividade e ousadia.

Independentemente do horário, vários são os estímulos sensoriais que se atravessam no caminho de quem se aventura pela Rua de Santa Catarina. Do aroma a castanhas assadas — responsável por trazer a sensação de aconchego, mal chega o outono, àquela que é uma das artérias mais emblemáticas e populares do Porto — às melodias entoadas por artistas urbanos de várias nacionalidades, há muito com o que se distrair ao longo dos seus 1.500 metros.

É o caso da Gruta, um projeto gastronómico fresco e sazonal, que se destaca pela delicadeza e arrojo de uma equipa comandada, há cerca de um ano e meio, por Caroline Giandalia. Encontra-o no final de uma pequena rampa, emoldurada por plantas verdejantes, afastado de olhares apressados por um portão de ferro que dá acesso ao número 447. O espaço, que já foi escola de dança e taberna, acolhe, desde 2021, um restaurante que funciona também como um refúgio de tranquilidade no meio do caos citadino.

“Aqui, trabalhamos essencialmente o peixe e o marisco da nossa costa, combinando ingredientes portugueses, de fornecedores locais, e produtos brasileiros, como a mandioca, o tucupi, o cupuaçu, as frutas exóticas ou o açaí, apresentados de uma forma inusitada e surpreendente”, conta a profissional de 29 anos, que iniciou a sua carreira num negócio familiar com foco na pastelaria. Já em Portugal, colaborou com personalidades conceituadas como José Avillez e Ricardo Costa antes de assumir o cargo deixado vago por Rafaela Louzada, que em 2024 abriu um corner no Time Out Market Porto.

Sem esquecer a história da casa, que sempre assentou numa equipa composta, quase exclusivamente, por mulheres — uma tentativa de alertar para a valorização destas em cozinhas profissionais —, e nas inspirações provenientes do outro lado do Atlântico, Caroline tem feito o seu próprio caminho. Para isso, interliga técnicas, referências e sabores de Portugal e do Brasil, aos quais dá um toque contemporâneo, que resultam em criações originais, com personalidade e repletas de combinações improváveis. Na base da sua experimentação, está a matéria-prima, com a qual explora distintas possibilidades de confeção, texturas e camadas de sabor.

“É um processo que envolve muita pesquisa. Gostamos de selecionar os ingredientes que queremos trabalhar para, só depois, desenvolvermos o resto. A ideia é partir do zero e fazer tudo de uma forma original e criativa, com elementos diferentes e produtos que ainda não são muito conhecidos aqui em Portugal”, explica a chef.

A nova carta, apresentada à imprensa em novembro, começa com um couvert em que o azeite picante, a manteiga fermentada com algas, a estaladiça focaccia caseira e o biscoito de polvilho, bastante presente na infância da cozinheira, aguça a curiosidade para o que está por vir. Seguem-se propostas como as vieiras com caramelo de tucupi e texturas de tangerina (18€); e as gambas selvagens salteadas em alho, regadas com molho de castanha de caju fermentada, óleo de pimenta malagueta e canónigos (16€).

Já o arroz de carabineiro algarvio com aioli de lima e coentros (38€); a corvina selvagem com puré de castanhas, molho de açaí, beurre blanc e chips de castanha (30€); e a moqueca de banana da terra grelhada, com arroz basmati e farofa de dendê (20€) sobressaem nos pratos principais.

No momento de encerrar a refeição, o bolo de mandioca, cocada morena, queijo coalho grelhado com mel e pipoca de tapioca (10€), assim como a mousse de chocolate com bolo de chocolate amargo, ganache de chocolate branco caramelizado e gelado de cupuaçu (12€), devem ser considerados.

Para acompanhar, num ambiente intimista construído com matizes suaves, plantas, cerâmica, ilustrações de autor e uma playlist de música popular brasileira (MPB), há referências do Douro, Bairrada e Açores, além de espumantes e vinhos do Porto. Esteja na sala principal ou no terraço climatizado, a vista para a cozinha, no centro de tudo, está garantida.

A experiência, que está disponível apenas ao jantar e já conquistou nomes como Martinho da Vila, Caetano Veloso, Adriana Calcanhoto e Emicida, fica completa com a aposta em empratamentos delicados e harmoniosos. Um serviço cuidado e despretensioso reforça a vontade de voltar.

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