O legado do futuro

Chegámos! – diz o homem esguio e alto, e um sorriso rasgado, conduzindo o carro pela estrada cujo fim já se contempla.

Tiram-se os cintos. O rosto de quem acompanha o homem esguio e alto é invadido ora pela surpresa, ora pela curiosidade.

Quinta da Roêda…

As palavras saem da boca da anciã num tom poético, pejado de saudade, como se viessem de tempos há muito idos, depois de cruzar o olhar apaixonado com o mais vetusto homem que também a acompanhava, enquanto descia do carro com a ajuda da mãe das duas crianças que, de olhos arregalados e sorridentes pareciam estar à espera de mais uma velha estória, daquelas estórias que só os antigos sabem contar às gerações futuras, enchendo-lhes o coração de conhecimento e, em simultâneo, abrindo-lhes um longo caminho para o eterno desejo de querer saber mais.

A vista daqui é incansável. Aliás, a beleza do Douro vinhateiro é um quadro vivo feito pela dupla Natureza e Homem para contemplar… por quem o visita, claro, porque aqui – afirma, com o propósito de criar uma aura de suspense – trabalha-se muito, muito a sério!

Clarinha, de chapéu azul claro a tapar o cabelo louro, agarrada ao coelho bege de nome Tiago, e Afonso, calçado com as suas chuteiras preferidas (daquelas sem pitons, claro!), arregalavam ainda mais os olhos castanhos escuros para a avó.

Vamos? – pergunta o homem esguio e alto com a Rita, a bebé de faces rosadas, olhos vivos e cabelo cor-de-avelã, ao colo.

A caminhada até ao Centro de Visitas faz-se entre uma mão cheia de perguntas acicatadas pelo mistério desperto nas palavras proferidas pela avó que, agora, dava as mãos a Clarinha e a Afonso, o mais velho dos três irmãos, com uma cumplicidade singular, que só as duas gerações entendem do que é feita.

Bom dia! – dita a voz masculina que vem de dentro do Centro de Visitas. Em simultâneo, o que dantes era apenas uma sombra foi tomando contornos até, por fim, se ver o braço estendido para o aperto de mão.

Filipe! Como está? – dita o avô já com a Rita ao colo, a quem ensinara caretas e gargalhadas de boa disposição – Há quanto tempo!

Como está? Há uns bons anos! – responde, ao mesmo tempo que cumprimenta calorosamente todos os que se vão aproximando – Como vai? – pergunta entusiasmado por rever a idosa senhora, que contribuiu com um afectuoso aperto de mão.

Esta é a vinha sobre a qual vos falei – esclarece a avó, olhando para as crianças – uma escola a céu aberto, onde é explicada a importância de uma casta portuguesa, a Mourisco, uma casta muito forte, tão forte que conseguiu fazer frente a uma doença que surgiu no Douro há muitos, muitos anos, à qual chamaram de filoxera, que arrasou uma grande parte das vinhas desta região.

O que aconteceu depois, avó? – pergunta a Clarinha ávida de curiosidade – o que fizeram com a Mour… isca?

Houve um senhor português que resolveu pegar na casta Mourisca e cruzou-a com a Touriga que, na altura, só assim se chamava por haver apenas uma e, juntas, fizeram com que nascesse a Touriga Francesa, mais conhecida por Touriga Franca, como passou a ser chamada mais tarde…

Como se fez isso, avó? – continua o Afonso – Ah! É como o avô fez com a pereira? É a enxe…

Enxertia – diz o avô com a calma que lhe é conhecida e um grande sorriso – Bem vejo que aprendeste! É quando inserimos um ramo de uma planta, neste caso de uma videira de uma das castas na outra, para que cresça e dê frutos – explica com delicadeza à medida que os olhos de Clarinha se arregalam.

Fazes um desenho, avô, para explicares como se faz?

Claro que sim!

Já sentados no muro de um dos socalcos erigidos ali bem perto, Clarinha seguia o traço do lápis do avô, que fala sobre o que são as castas, a vindima e o processo que se desenrola numa adega do Vinho do Porto, dando a da Quinta da Roêda como exemplo.

Ao lado, a restante família explora a pequena vinha cravejada de pequenas placas de sinalética. Cada uma ostenta o nome da casta que tem junto de si e cada nome é lido, em voz alta, pelo Afonso para a irmã mais nova, Rita, que parece ouvi-lo com a maior das atenções e, no fim, bate palmas entusiasmada, esboçando um sorriso demarcado por uma enorme boa disposição.

Muito bem, senhor Afonso! – afirma a avó orgulhosa – Tamanha erudição merece um brinde!

E este é muito especial, Clarinha! – esclarece o homem alto e esguio, com um uma expressão carinhosa – Façamos um brinde à nossa menina que, hoje, celebra o seu quinto aniversário, com um Vinho do Porto do mesmo ano em que nasceste, um Croft Quinta da Roêda Vintage 2012.

Brindemos! – dizem os adultos sob o alpendre do Centro Visitas, outrora os antigos estábulos da Quinta da Roêda, elevando o copo às alturas – Parabéns, Rita! E um feliz Dia da Família!

Distribuem-se beijos e abraços bem apertados e abafados pelas gargalhadas das crianças desejosas por conhecer melhor a quinta sobre a qual os avós tanto falavam nas estórias, carregadas de heranças e tradições que perduram no tempo graças à sabedoria assimilada pelas gerações mais novas.

Vamos passear mais!

Sim, queremos passear mais! – pede a Rita, parafraseando o irmão.

Claro que sim! Vamos! Põe o chapéu, Rita. Ata o atilho da chuteira, Afonso, por favor – implora a mãe.

Lá vão eles, juntos, uns de mãos dadas, outros abraçados, um quadro vivo captado pela lente do avô, que os contempla com a maior das felicidades pelo ecrã da sua câmara fotográfica.

– Feliz Dia [Internacional] da Família! – profere o avô para consigo.

Agradecemos à The Fladgate Partnership o apoio na realização desta história de celebração do dia da família.

+The Fladgate Partnership
© Ilustração: Sara Quaresma Capitão
(Clique em cima da ilustração para visualizar com mais detalhe)

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