O ecletismo dos seis restaurantes e bares do hotel em terras algarvias levaram o novo escanção a actuar de acordo com o tipo de público de cada espaço, como ficámos a saber na conversa que se segue.
Miguel Martins, o novo escanção do Conrad Algarve
A aventura começa com a eventual ida do escanção Miguel Martins, de 42 anos, para a Quinta do Lago, em Almancil, no Algarve, mas um desvio na bússola do destino do nosso cicerone conduziu-o ao vizinho Conrad Algarve onde, há dois meses, o convidaram “para fazer um trabalho abrangente de todos os outlets”. Por isso, o nosso cicerone tem a função Head of Sommelier, ou seja, faz “um trabalho global dentro do hotel” no que diz respeito ao universo vínico, esclarece. “O interesse do Conrad teve a ver com o meu know-how da parte do business, porque já fui comercial de vinhos”, mas a paixão “é, obviamente, ser sommelier”, portanto, este ofício traduz-se em “uma evolução” no percurso profissional de Miguel Martins.
“A experiência começa por cada um dos outlets passarem a ter uma identidade.” Por essa razão, os restaurantes Gusto by Heinz Beck e o Louro, e os bares Lago Lounge, Dado Seafood, Dado e Sereno têm a sua própria lista de vinhos, “de acordo com o público e com a comida que tem” e “faço questão de não repetir um vinho de um outlet para outro”, até mesmo os champanhes, até “porque se um cliente está aqui durante uma semana, temos de ter uma oferta em que não haja repetições”. Por exemplo, o Sereno, “o bar da piscina tem champanhe”, enquanto “o Lago Lounge vende muito vinho a copo”.
A garrafeira do Gusto by Heinz Beck tem uma mão cheia de vinhos portugueses e já conta com bastantes néctares de Baco italianos
No Gusto, onde “há muito vinho novo” garante-nos, mostrando o interior da garrafeira envidraçada do restaurante com a assinatura do chef alemão, “e uma forte componente portuguesa. O que penso para o Gusto é o que senti quando vim cá jantar pela primeira vez, um restaurante fine dining, mas com uma vertente muito forte da gastronomia italiana, por isso, há uma maioria de vinhos portugueses e quase uma maioria de vinhos italianos, os quais se calhar só se encontra nas pizarias mais sofisticadas”, mas também há franceses, espanhóis e os biológicos.
Ao Louro estão, por sua vez, reservados apenas os vinhos portugueses, “com destaque para os vinhos regionais”, informa, ou não fosse este o restaurante onde o chef Osvalde Silva mostrasse quanto vale a cozinha do País.
“Não entra uma garrafa aqui que não não passe por mim, que eu não tenha escolhido”, garante o director de vinhos do Conrad Algarve, que quer transformar o bar da piscina infinita em Saint-Tropez, onde “vou ter uma quantidade enorme de rosés da Provence, alguns brancos e não tantos tintos. Mesmo assim, os tintos mais leves”.
A somar à mudança, Miguel Martins aposta na formação de quem trabalha nos espaços de restauração do hotel: “Dou-lhes formação individual, de restaurante para restaurante, para que cada um conheça os vinhos de cada espaço e para que possam trabalhar melhor.”
A grande boa nova acontece, porém, no terraço contíguo ao lobby do Conrad Algarve, onde o champanhe e o sushi, “um bar pop-up”, farão furor nos dias de Verão. E outra virá no futuro, a qual será criado com um dos mais célebres produtores em Portugal, com quem Miguel Martins desenhará um cuvée em edição limitada e exclusiva do Conrad Algarve. “Queremos ter vinhos exclusivos e a grande aposta é nos vinhos portugueses.”
A equipa do restaurante de assinatura de Heinz Beck: O barman Nelson de Matos (atrás, ao centro), Daniel Salvador, Soraia Martins, o escanção e director de vinhos do Conrad Miguel Martins,Chew Wen Wei, Paulo Frederico, chef Daniele Pirillo, o sous chef Matteo Gerardi, Marcelo Tavares (fila de trás), Patrizia Sabatini e Eduardo (ambos na fila do centro), Gennaro Perrotta, Guilherme Mollering, Razvan Cublesan e Giacomo Troisi (à frente)
O desafio da noite passou, por conseguinte, em conhecer o trabalho do novo escanção à mesa do Gusto by Heinz Beck, num repasto que começa com canapés de merengue de queijo, sablé de limão e creme de ervilhas, lula com tinta de choco e cavala, esponja de sésamo e frutos secos.
O chef Daniele Pirillo eo sous chef Matteo Gerardi
Para amuse bouche, o chef Daniele Pirillo prepara peixe galo com maionese de gambas e um outro, composto por marshmellows com água de tomate e beterraba.
Chega o momento da entrada feita com lírio marinado em yuzu e erva-limão com guacamole e merengue de soja, para a qual Miguel Martins escolheu um Cortes de Cima Sauvignon Blanc 2015, um Vinho Regional Alentejano cuja casta provém de uma vinha incluída num programa de viticultura integrada e criado pelo enólogo Hamilton Reis.
Lagosta de Primavera
Ao lombo de lagosta, creme de favas, feijão verde e alcachofras mandioca, pulverizado com cogumelos, o escanção deu lugar ao Soalheiro Terramatter branco 2015, um vinho de agricultura biológica feito a partir da casta Alvarinho, desenhado pelo produtor e enólogo António Luís Cerdeira da Quinta do Soalheiro, em Melgaço, sub-região dos Vinhos Verdes. A harmonização é de truz.
O espumante DOC é a escolha para o carpaccio de vieiras, espuma de batata fumada, gnochi de espargos e caviar
Por sua vez, o carpaccio de vieiras, com espuma de batata fumada, gnochi de espargos e caviar é o par perfeito do Murganheira Vintage Bruto 2006, o espumante DOC da Região Demarcada Távora-Varosa, servido num copo largo, como se fosse a decantar. “Um vinho untuoso, mas com a frescura ideal para combinar com o prato”, explica Miguel Martins que, uma vez mais, acerta em cheio na harmonização.
As fagotelli carbonara com queijo, pimenta preta e ovo, e curgete com guanciale (tipo de bacon não-defumado italiano com a bochecha de porco) preparadas a preceito são companhia para o Principal Tête de Cuvée rosé 2010, um DOC Bairrada feito a partir de Pinot Noir, que o escanção decanta, “para dar mais intensidade do que frescura”.
Este vetusto vinho da Caves de São João acompanha o bacalhau com batata, infusão de aipo e crosta de caril
Ao bacalhau com batata, infusão de aipo e crosta de caril elege-se o par: Porta dos Cavaleiros Reserva 1985. Uma relíquia do Dão da Caves de São João para uma combinação que revela a sensibilidade de Miguel Martins para com os pratos, em particular para este, que melhor se sobressaiu, graças ausência de complexidades dando lugar à simplicidade na combinação dos sabores.
Um vinho feito à medida para o peixe galo com crosta de alcaçuz, creme de amêndoa e camarões marinados em limão
Peixe galo com crosta de alcaçuz, creme de amêndoa e camarões marinados em limão é o prato que se segue no alinhamento bem coordenado da cozinha para a sala. Desta vez, Miguel Martins escolhe um vinho da Península de Setúbal: Alfaiate branco 2015. Um néctar composto pelas castas Sercial, Galego-dourado, Arinto e Antão Vaz, da Herdade do Portocarro, de José Mota Capitão que, deste modo, forma um par muito feliz.
O prato de carne é o par de Luís Pato Quinta do Moinho 2001
Para a vitela com creme de repoulho – roxo, branco e lombardo –, molho de azeitonas pretas “precisamos de um vinho com mais elegância e mais delicado”, daí Luís Pato Quinta do Moinho 2001, um Vinho Regional da Bairrada feito a partir da casta para acompanhar.
As ‘mil e uma maneiras’ de servir avelã num prato
Nas sobremesas, Giacomo Troisi, o chef pasteleiro, faz o cheesecake de limão, queijo e sorbet de framboesa, seguido do planeta avelã, uma composição formada por várias texturas feitas com o referido fruto seco – semifrio, em creme, biscoito, esponja pulverizada, em geleia de avelã – e gelado de queijo de cabra. Do lado de Baco, Miguel Martins escolhe um Blandy’s Malvasia 1996 “que, com a oxidação, intensifica os aromas dos frutos secos”.
Afinal, “quem vem cá espera ser surpreendido, eu estou cá para isso”, remata Miguel Martins.
Miguel Martins é formado pela Escola de Hotelaria e Turismo do Algarve e conta, no currículo, com o Vila Joya (2 estrelas Michelin), em Albufeira, o restaurante Henrique Leis (1 estrela Michelin), em Almancil, o Ocean (2 estrelas Michelin), do Vila Vita Parc, em Porches, e Vista, restaurante do Bela Vista Hotel & SPA Relais & Chateaux, em Portimão, e é proprietário da loja Sommelier Wine Shop, em Lagos. •