Duas décadas dedicadas à terra, às castas e ao vinho / Diogo Lopes

O ano de 2001 marca o início do percurso profissional do enólogo lisboeta, que, 21 anos depois, reúne, à mesa da Herdade Grande, vários terroirs e colheitas de cinco regiões vitivinícolas e sete produtores, para brindar à vida.

Este foram alguns dos vinhos presentes na celebração dos 20 anos de vindimas do enólogo Diogo Lopes


A Herdade Grande, propriedade vinhateira localizada na Vidigueira, Alentejo, é a eleita por enólogo Diogo Lopes, para celebrar a primeira etapa da sua carreira. Sem contar com as vindimas na terra do avô, nas beiras, que acicataram a vontade de, em adulto, escolher Agronomia e, depois, Enologia, no Instituto Superior de Agronomia de Lisboa (ISA). “Quero partilhar aqui o que tem sido feito ao longo destes 20 anos”.

A primeira vindima foi em 2001, nos Vinhos Borges, em Macieira da Lixa, com Anselmo Mendes, conhecido como o “Sr. Alvarinho”. “Em 2002 foi a segunda, com Anselmo Mendes.” À vinha, juntava-se a adega, “trabalhos duros”, que valeram pela vida, mas “o miúdo que quer ser enólogo tem de esfregar a cuba de inox”, recorda Diogo Lopes. A viagem até ao outro lado do mundo, com destino a Napa Valley, na Califórnia, é registo datado do ano 2003.

No regresso, Diogo Lopes volta a aliar-se a Anselmo Mendes. Estreia-se em 2005, no Alentejo, como enólogo residente. O desafio é assumir a produção do Grou, da Sociedade Agrícola do Vale de Joana, em Cabeção, no concelho de Mora. 

Ao fim de cinco anos, ruma a Montemor-o-Novo, para fazer consultoria em enologia na Couteiro-Mor, que tem a Herdade do Menir como propriedade bandeira. É, contudo, da Vinha da Granja que provém a casta tinta Baga, variedade de uva colhida numa parcela de quatro hectares, plantada em solo de xisto, e eleita para o BR Baga 2020. Um vinho com pouca extracção, primado por uma elegância ímpar, que está pronto a beber, para usufruir plenamente dos seus atributos. Ao contrário do Herdade do Menir Vale do Ancho Reserva tinto 2012, muito expressivo e com taninos bem presentes, que precisa de tempo.

Herdade Grande, AdegaMãe, Kranemann Wine Estates, Herdade do Freixo e Couteiro-Mor marcaram presença… em estado líquido


Pouco tempo depois, tem nas suas mãos a AdegaMãe, em Torres Vedras, na região dos Vinhos de Lisboa, projecto que acompanha desde o início, precisamente em 2010, aquando da primeira vindima. “Tínhamos um desconhecimento total em relação à região.” O trabalho realizado ao longo destes anos nesta adega é o reflexo de uma constante aprendizagem, baseada em experiências, que denotam uma abertura de mentalidades essencial no mundo dos vinhos. A segunda edição do AdegaMãe Vinhas Velhas Vital 2019, vindimada vinha localizada na Serra de Montejunto e com cerca de 50 anos, que, neste caso, consiste em “ir à procura de sítios que dêem um carácter diferenciador aos vinhos”. AdegaMãe Parcela Amarela 2019, feito a partir de Viosinho – variedade das regiões transmontana e duriense, uma casta-revelação neste território vitivinícola –, confirma a apetência para o ensaio por parte da equipa da AdegaMãe. Quanto ao Terroir tinto 2016, feito a partir de castas vindimadas em cepas com mais de 40 anos, da Quinta de D. Carlos, em Alenquer, confere a grandiosidade de uma região, a conhecer. Esta terceira edição desta referência sairá para o mercado no final de 2022. Em suma, “a região de Lisboa é o futuro dos vinhos de Portugal”, afirma Diogo Lopes. 

Em 2011, Diogo Lopes protagoniza, na companhia de Anselmo Mendes, intensas viagens pelo país, desde o Continente às ilhas. Primeiro, toma as rédeas da Adega Cooperativa de Biscoitos, na Ilha Terceira, em relação à qual enaltece a “personalidade” dos vinhos aqui produzidos – “um bocadinho de imperfeição acaba por dar carácter [aos vinhos], que não “têm de ser lineares. São vinhos açorianos, sem maquilhagem”. A comprovar esta afirmação, o enólogo mostra o Magma Verdelho 2019, um branco seco, cheio de acidez e com uma acentuada sensação de salinidade. Ao mesmo tempo, reforça a missão de ambos naquela ilha: “queremos que aquela malta volte a recuperar as vinhas”, património relacionado não apenas ao cultivo da vinha, mas também à valorização da uva. “Só assim é que os viticultores sentem capacidade para trabalhar.”

Seguiu-se, também em 2011, Cazas Novas, projecto da família Cunha Coutinho, em Santa Marinha do Zêzere, Baião, na fronteira da Região Demarcada dos Vinhos Verdes com a Região Demarcada do Douro. O objectivo é explorar a casta Avesso, plantada em 30 hectares. Para mostrar o carácter desta casta branca típica desta zona dos Vinhos Verdes, Diogo Lopes dá a provar a primeira edição de Cazas Novas Barrel Aged Avesso 2020, feito a partir de uvas vindimadas em vinhas com cerca de seis anos, da Quinta das Tias, um das quatro propriedades deste produtor. Há ainda Cazas Novas Pure Avesso 2019, cuja uva foi colhida em cepas com três décadas, numa vinha exposta a Sul, especificidades que favorecem o vinho, que denota complexidade, elegância e boa acidez.

As talhas antigas da Herdade Grande, onde são vi


Passados sete anos, inclui a Herdade Grande, na Vidigueira, no seu currículo de enologia. “Vínhamos para aqui quando frequentava o ISA (…) Hoje, estamos a tentar estruturar e reformular aqui os vinhos da Vidigueira.” A prova contempla a segunda edição do Herdade Grande Amphora branco 2019, vinho de curtimenta feito, na talha, a partir das castas Antão Vaz, Perrum, Roupeiro e Alvarinho, para degustar com a calma necessária. Neste desfile está a dupla Herdade Grande Garrafeira. Os novos topos de gama deste produtor do Alentejo foram elaborados para homenagear e celebrar dos 75 anos de António Lança, homem maior desta propriedade vitivinícola. São eles Herdade Grande Garrafeira branco 2019, feito a partir de Vinhas Velhas e Viosinho, um vinho perfeito para beber o ano inteiro; e Grande Garrafeira tinto 2018, que tem Alicante Bouschet e Sousão e com um cariz mais tradicional à semelhança dos ‘Garrafeira’ de outros tempos.

A Kranemann Wine Estates, com o epicentro da Quinta do Convento de São Pedro das Águias, no Douro, foi o terceiro desafio de 2018. Diogo Lopes está, finalmente, a produzir Vinho do Porto e vinhos com Denominação de Origem Douro, dos quais traz o primeiro branco, o Quinta do Convento Reserva branco 2018. Este vinho é feito a partir de três uvas brancas – Rabigato, Viosinho e Gouveio – colhidas em altitude, cujas cepas estão plantadas em solo granítico e com a exposição virada a Norte, terroir que justifica a frescura, acidez e sensação de mineralidade existentes neste vinho. O Quinta do Convento Reserva tinto 2018, feito a partir das castas Touriga Nacional e Touriga Franca, também é uma estreia no portefólio da Kranemann Wine Estates, partilha da mesma frescura e mineralidade do anterior.

A mostra gastronómica e a conjugação de sabores tipicamente alentejanos estiveram a cargo do chef Leopoldo Calhau (Taberna do Calhau, Lisboa) e de Teresa Estrela, cozinheira de mão cheia da Herdade Grande


A colheita de 2019 na Herdade do Freixo, entre a Serra d’Ossa e Évora, no concelho de Redondo, também fica marcada com o contributo de Diogo Lopes, que, aqui, ainda vai só no começo. É de provar Herdade do Freixo Special Edition Riesling 2020, casta vindimada em vinha de altitude (entre 500 a 600 metros), e Herdade do Freixo Special Edition Petite Syrah 2019, da mesma gama com entrada no mercado prevista para a época natalícia deste ano.

Ao fim de 20 anos, Diogo Lopes assume a enologia em sete adegas de Portugal, as quais vão desde Vinhos Verdes aos Açores, passando por Douro, Lisboa e Alentejo. “À medida que vamos crescendo, procuramos o que as vinhas nos podem dar (…) não tanto as castas, mas o potencial das vinhas.” 

Brindemos a 20×20 anos!


+ Diogo Lopes
© Fotografia: João Pedro Rato

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