O intervalo de tempo entre Beja e Lisboa conta 25 anos. Inaugurado em 2019, foi objecto de uma transformação evolutiva em finais de 2021. Agora, as referências vínicas em destaque são de inspiração ancestral e a comida convida a percorrer as regiões do país.
Rissol especial de lingueirão à Bulhão Pato
Sérgio e Pedro Frade são irmãos. O primeiro é formado em Educação Física. Foi professor e atleta de alta competição, mas quis o destino que rumasse para o Brasil. O regresso a Portugal acontece em 2017. Além do investimento no ramo imobiliário, abre O Frade em 2019, no número 14 da Calçada da Ajuda, em Belém, com um balcão instalado ao centro, “como se fosse uma casa, como se reavivássemos a taberna”, afirma Sérgio Frade referindo-se aos tempos em que o avô, António Teles Frade, natural da Vidigueira, tinha o seu restaurante, O Frade, na Rua da Biscainha, em Beja, fechado há um quarto de século.
Feijoada de polvo
Na origem, O Frade, em Lisboa, estava associado à cozinha alentejana, mas, com a passagem do tempo, foram implementadas mudanças neste espaço descontraído. Para garantir a consistência do restaurante, tira um MBA em Gestão aquando do irmão, Pedro Frade, com formação em Biologia e diretor de operações do restaurante. Em 2021, dá a “volta” à matriz da cozinha, centrando-a no compêndio culinário traduzido num singelo roteiro gastronómico pelo país.
Sem descurar da sua região-berço, nem mesmo na seleção de referências vínicas, a qual recai em rótulos pouco convencionais, ambos reforçam a aposta no vinho de talha. Uma vez mais, está aqui implícito o trabalho iniciado pelo avô António Teles Frade, que, já no outrora O Frade, em Beja, fazia vinho de talha, enquanto a avó tomava conta da cozinha.
Uma herança com futuro
Pesgar a talha é assunto para se falar ao balcão d’ O Frade
O legado vitivinícola é assegurado por Alexandre Frade. Pai de Sérgio e Pedro Frade decide tirar, aos 60 anos, uma especialização em enologia, para tirar melhor partido da sua Vinha do Roque, com mais de 50 anos. Aqui, “estão castas antigas da Vidigueira”, assegura o nosso anfitrião, como Larião, Manteúdo, Perrum, Diogo Alves, entre outras.
Castas Antigas branco 2018 é vinho de talha DOC Alentejo, tal como os demais vinhos de talha produzidos por Alexandre Frade
Entretanto, “comprou uma vinha perto das ruínas de São Cucufate”, com seis hectares e de solos arenosos e xistosos, onde, em 2015, plantou mais vinha, “só com bacelos de varas de vinhas centenárias”. Sérgio Frade explica que se trata de um centro de genoma, “acompanhado pela Universidade de Évora e pelo Grupo de Investigação da Plansel” (produtor de vinho situado em Montemor-o-Novo, também no Alentejo). O objetivo é recuperar variedades de uva antigas e simultaneamente testar a Defensor, casta híbrida testada na região pela Plansel. “À exploração, temos vinhas centenárias. Tudo na Vidigueira”, acrescenta.
Alexandre Frade é, por conseguinte, o responsável pelo vinho de talha da família e pesga estes recipientes de barro de um forma muito peculiar. “É o primeiro produtor exclusivo de vinho de talha DOC” e “está a desenvolver técnicas artesanais, para evitar o excesso de oxidação”, conta Sérgio Frade. Só assim, consegue engarrafar o vinho em Abril, submetendo-o a um novo estágio, desta vez, em garrafa, por três anos. Mesmo assim, “os vinhos brancos precisam de um controlo maior comparativamente com os brancos”.
Apesar de ter duas adegas, “uma para brancos e outra para tintos”, Alexandre Frade está a construir uma nova adega, “com talhas feitas à medida”, a estar concluída no verão deste ano de 2023.
Peculiar é o rótulo que faz parte do portefólio da família Frade desde 2018
Até lá, é de provar os vinhos de talha da família Frade, cuja primeira colheita apresentada remonta ao ano de 2016, com um branco e um tinto Escolha. A estreia da referência D. Alice aconteceu com um branco de 2017, ano do aparecimento do Peculiar, disponível apenas na versão tinto, e do Talha de Frades. As uvas foram vindimadas na primeira vinha de teste, localizada no monte dos pais de Sérgio e Pedro Frade. Da colheita de 2018, surgem o Castas Antigas, só branco e feito a partir de castas colhidas nas vinhas velhas, bem como a referência Um por Um, um vinho-ensaio elaborado com em proporções iguais de duas variedades de uva branca.
“Inicialmente, os clientes estranhavam a cor do vinho. Hoje já há quem vinha e peça um D. Alice, por exemplo”, diz Sérgio Frade.
Prepare o estômago para mais
Servido o vinho, eis o momento de experimentar a comida. Da cozinha para o balcão – ou a esplanada, muito cobiçada em dias soalheiros –, o chef Diogo Carvalho prepara cada prato com o apoio da sua equipa. O couvert tem pão do Isco e azeite, e os petiscos despertam a atenção só de olhar a ementa.
Comece com o rissol especial de lingueirão à Bulhão Pato. Delicie-se com a massa fina e estaladiça, e o interior suculento e saboroso. Ou renda-se à empada especial do Frade, cujo interior é de revelar apenas no momento da primeira dentada. Isto é, tem de ir a O Frade, até porque há pato de escabeche, pelada de porco braseada, entre outras entradas a escolher a dedo e “de comer e chorar por mais”.
Arroz cremoso de cogumelos
O arroz de pato à Frade é já um clássico e o xerém de corvina com coentros e limão parece que conquista mesmo as bocas mais cépticas. Para os valentes, há rabo de boi estufado com legumes, mas o guloso arroz cremoso de cogumelos não é para deixar de parte. Da feijoada de polvo nem se fala!
Dom Rodrigo limão e merengue
Bolo de gelado e noz, mousse de chocolate com sorbet de coco ou Dom Rodrigo limão e merengue? Os dois últimos são de experimentar, sobretudo o terceiro, pois o equilíbrio entre a doçura e a acidez fica no ponto.
Bom apetite!