Arinto e Esgana-Cão. Há Bucelas no copo

A primeira dá corpo a um vinho de curtimenta. A segunda está a solo na garrafa. Ambas as referências vínicas foram produzidas com a chancela da Quinta das Murgas sob a orientação do enólogo Bernardo Cabral. Eis os novos Murgas.

“Toda esta paixão foi-me transmitida pelo meu avô e todos os valores que me passou fizeram com que desse continuidade a este legado”

Murgas Esgana-Cão 2022 (€25) e Murgas Curtimenta 2024 (€16,50) são as boas novas da Quinta das Murgas, propriedade de família de João França e legado do avô, Sérgio Geraldes Barba, localizada na Região Demarcada de Bucelas, concelho de Loures. Se o primeiro é “mineral e complexo”, o segundo “é irreverente e muito estruturado”, nas palavras de Bernardo Cabral, o enólogo que, em 2014, ano do início da recuperação da vinha, aceitou o desafio apresentado pelo atual produtor.

Arinto (a principal casta de Bucelas) e Esgana-Cão (ou Sercial, commumente utilizada na produção de Vinho da Madeira) são variedades de uva branca primordiais em Bucelas, região demarcada desde 3 de março de 1911. Aliás, foi a primeira região de Portugal demarcada exclusivamente para vinhos brancos. Situa-se no vale do rio Trancão e faz parte do território vitivinícola dos Vinhos de Lisboa. Na verdade, há quem defenda que a primeira casta é autóctone de Bucelas, daí a designação “Capital do Arinto”; a segunda é “osso duro de roer”, ou não fosse o vinho feito a partir esta variedade de uva submetido a um tempo considerável de estágio, para atenuar a acidez excessiva que a caracteriza. 

Esta dupla aposta reflete a dedicação de João França pela propriedade onde, outrora, os almoços de sábado eram passados em família, à mesa do avô. “Grande parte da minha infância foi passada aqui”, recorda o produtor, que tinha por hábito acompanhar o avô nos passeios pela vinha e pelo campo. “Toda esta paixão foi-me transmitida pelo meu avô e todos os valores que me passou fizeram com que desse continuidade a este legado.” 

“Bucelas é uma micro-região com potencial, pelo que o caminho é olhar para os vinhos de nicho”

À falta de um sucessor direto que prosseguisse com o negócio do vinho, cuja produção foi iniciada na década de 1980, por Sérgio Geraldes Barba, João França decide avançar com este desafio ao lado de Bernardo Cabral, que ajudou a recuperar as vinhas e a plantar outras. Esta ação é confirmada pelo enólogo, para quem “Bucelas é uma micro-região com potencial, pelo que o caminho é olhar para os vinhos de nicho”.

A primeira colheita da Quinta das Murga é Murgas branco 2017, feito a partir de Arinto. Porém, nesta época “a acidez era mal vista. Mas a acidez começa a ser novamente uma mais-valia”, declara Bernardo Cabral, e o trabalho na vinha e na adega ganha um novo alento. Em 2019 surge o Murgas Vinha do Arneiro tinto, elaborado apenas com a casta Touriga Franca, a mesma variedade de uva do Murgas rosé 2022. 

A Quinta das Murgas reúne 12 hectares de vinha plantada em solo pobre, predominantemente calcário. A este cenário, palco de piqueniques, compostos por produtos regionais, junta-se o casario e a densa vegetação da propriedade, a visitar durante um passeio equestre ou num todo-o-terreno, por exemplo, para dar a conhecer o passado e o futuro deste refúgio bucólico localizado a 30 minutos de Lisboa. “Queremos ser uma referência da região e de Bucelas”, remata João França.

Brindemos!

Quinta das Murgas  
© Fotografia: João Pedro Rato

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