Quinta dos Carvalhais, a tradição de um Dão maior

A Região Demarcada do Dão rima com planalto beirão. Localizada no centro-norte de Portugal, é formalmente estabelecida através da Carta de Lei datada de 18 de setembro de 1908. Já o decreto regulamentador da produção e da comercialização dos vinhos chega a 25 de maio de 2010. É “a primeira região de vinhos não licorosos demarcada e regulamentada no país”, segundo o site dos Vinhos do Dão. Estas datas ditam a história de um território vitivinícola renascido pelo trabalho diário dos produtores, no sentido de elevar esta terra no roteiro vínico do país.

A presença da Sogrape no Dão remonta a 1957, aquando da aquisição do capital da sociedade Vinícola do Super Dão, que passa a denominar-se Vinícola do Vale do Dão. Desta história nasce, por exemplo, a referência vínica Grão Vasco. Quem não conhece? Com a passagem do tempo, Fernando Guedes decide comprar, em 1988, a Quinta dos Carvalhais, com uma área de 105 hectares, situada entre Nelas e Alcafache, no concelho de Mangualde. 

É também na década de 1980 é feito um estudo que permite registar o potencial de cada casta plantada na propriedade. Acima de tudo, possibilita que a equipa da Quinta dos Carvalhais tenha percepção da aptidão da casta Encruzado. O mesmo desvelo estende-se ao solo, submetido a um rigoroso mapeamento.

Embora o granito seja a rocha predominante, há parte da propriedade em que a argila é visível. O resultado obtido traduz-se na existência de oito tipos de solo. “Este mapeamento permitiu perceber qual o terreno mais vocacionado para cada porta-enxerto”, afirma André Guedes, responsável pela componente agrícola desta propriedade vitivinícola da Sogrape. Depois há que ter em conta a proteção das serras do Caramulo, do Luso e da Estrela, as oscilações térmicas significativas, sobretudo no verão, e a influência da floresta, carregada de carvalhos, pinheiros e cedros, por exemplo.

A utilidade destes trabalhos volta a ter grande expressão em 2020, quando a Sogrape reforça a aposta na variedade de uva Encruzado na Quinta dos Carvalhais. No alinhamento deste processo, a equipa recorre, nesse ano, ao histórico da propriedade, com a finalidade de obter o porta-enxerto ideal para a zona onde, posteriormente, é plantada a vinha com a referida casta branca. Esta decisão advém “da percepção da tendência dos mercados para os vinhos bancos”, afirma André Guedes. 

Esta ação continua a permitir “a produção de monovarietais muito diferentes”, avança Beatriz Cabral de Almeida, que, desde 2012, desempenha a função de enóloga, ou como muito bem diz “engarrafar a essência da Quinta dos Carvalhais”, onde, hoje, a variedade de uva Encruzado ocupa oito hectares dos 54 hectares de vinha. Mais ainda, a área das castas brancas suplanta a das tintas, com, respectivamente, 60 por cento e 40 por cento de ocupação num vinhedo, que, desde 2023, está sem herbicidas. 

Paralelamente, são produzidos vinhos de referência, como o Quinta dos Carvalhais Único tinto, com edições registadas nos anos 2005, 2009, 2015, 2017 e 2020, uma vez que é feito apenas em “anos excepcionais”. As duas primeiras colheitas são elaboradas a partir da casta Touriga Nacional; as três últimas contam com a chancela de Beatriz Cabral de Almeida, que inverte esta tendência para a feitura de um lote constituído por Touriga Nacional, Alfrocheiro e um field blend. À mesa, fica bem com “polvo à lagareiro, um cachaço de porco assado no forno ou até um arroz caldoso de entecosto”, de acordo com a enóloga. 

Nos tintos, cabe outra novidade, o Quinta dos Carvalhais Alfrocheiro Edição Especial 2019, que acompanha polvo à lagareiro, entre outros pratos de forno. A designação “especial” advém das uvas vindimadas em duas parcelas desta propriedade do Dão, as quais são tidas como singulares por Beatriz Cabral de Almeida e a restante equipa da propriedade.

Já nos brancos, a boa nova é o Quinta dos Carvalhais Especial branco Edição n.º 7. Trata-se de um vinho sem ano de colheita. É feito a partir das variedades de uva Encruzado, Gouveio e Semillon, e de uma mistura de castas. Engarrafado em 2021, estagia em garrafa por três anos e está no mercado desde 2024. Segundo as indicações da enóloga, esta referência vínica harmoniza com “pratos de peixe assado, peixes bem condimentados ou bacalhau; ideal também com carnes vermelhas, como cabrito assado”.

É precisamente o cabrito assado em forno a lenha, servido com batatas também assadas em forno a lenha, e grelos regados de azeite, o protagonista de uma refeição informal na sala de jantar da Quinta dos Carvalhais. Entre paredes de pedra de granito, fala-se sobre vinho e acerca do valor da cozinha tradicional. Ambos os temas são enaltecidos ao sabor de um almoço antecedido pelas boas-vindas dadas com o Quinta dos Carvalhais Reserva rosé Edição Especial 2023, elaborado com a casta Alfrocheiro a dar corpo a este vinho. 

“Pensamos no vinho, para dar prazer à mesa.” A frase da autoria de Beatriz Cabral de Almeida encaixa perfeitamente no pretexto para um almoço que juntou, a 12 de novembro de 2024, na Quinta dos Carvalhais, quatro chefs de cozinha, de três restaurantes do distrito de Viseu: Inês Beja e Nuno Fonte, do DeRaiz, na aldeia de Rebordinho, concelho de Viseu; Luís Almeida, do Memórias de Santar, no Valverde Santar Hotel & Spa, em Santar, no concelho de Nelas; e Henrique Ferreira, do Tertúlia, em Nelas. Todos apresentaram um prato com produtos da estação, para harmonizar com vinhos desta propriedade por ocasião da apresentação do Quinta dos Carvalhais Único tinto 2020. Eis o ponto de partida para um roteiro gastronómico pela Região Demarcada do Dão.

Brindemos!