A caminho dos seus 20 anos, o Bica do Sapato apresenta, agora, uma carta mais criativa assinada pelos chefs Henrique Mouro e Pedro Rezende. Sem esquecer a importância do sabor nem o respeito pela sazonalidade dos produtos.
Quem escolhe, habitualmente, a Bica do Sapato para uma refeição tranquila com os olhos postos no rio Tejo descobre, agora, uma nova carta. Esta marca o regresso de Henrique Mouro. O chef lisboeta que, entre 1999 e 2001 – ou seja, logo no início – deu o seu contributo para a cozinha desta casa.
Por isso, considera este retorno “uma honra e uma responsabilidade” que partilha com o, também, chef lisboeta Pedro Rezende com quem se reencontra pela quarta vez, desta feita, para acalentar estômagos e apaziguar a alma com “sabores familiares”. A afirmação é de Henrique Mouro, para quem é igualmente importante “termos em conta o percurso da casa e a história da casa”.
Terrina de bochecha de novilho, foie, nabo e pêra seca
A carta começa com quatro propostas de petiscos, além das duas tábuas – uma de queijos e outra de enchidos –, o prego da vazia, o cheeseburger e as três saladas. Para quem não dispensa de uma refeição mais “a sério” pode começar pelas entradas. São cinco. A terrina de bochecha de novilho, foie, nabo e pêra seca, confitada e cozida, é um bom começo para uma repasto mais prolongado.
O figo e o queijo de Azeitão é uma das entradas da carta da Bica do Sapato
Figos assados com queijo de Azeitão servidos numa fatia de pão levemente tostado: a entrada é provocadora, mas a doçura do fruto da figueira é contrabalançada com o sabor do queijo, tradicionalmente, feito a partir do leite de ovelha português na referida freguesia do concelho de Setúbal.
O caldo verde dos chefs Henrique Mouro e Pedro Rezende
O “caldo verde” está bem diferente do convencional. A couve frita, a broa de milho e o carapau fumado fazem parte da sua composição cuja união de sabores se assemelha a este prato tradicionalmente português.
Pregado com paio alentejano e xarém que nos faz viajar pelo sul do país
Das cinco sugestões de peixe, destacamos o deleitoso pregado no forno com paio alentejano e xarém – ou xerém – de amêijoa à Bulhão Pato. Descansem, porém, os habitués, uma vez que o bacalhau fresco escalfado em azeite virgem com à Brás e azeitona preta – o irónico prato do chef Fausto Airoldi – perdura na carta.
Leitão assado com laranja, esparregado e batata a murro
Do quinteto das carnes, fiquemos pelo leitão assado com laranja servido com esparregado e batata a murro. Sobre este prato, Henrique Mouro confessa que o leitão “é um produto que gosto de trabalhar”.
Sericaia de baunilha com ervas do nosso quintal, flores e gelado de pimenta timut, uma falsa pimenta na qual predominam os sabores cítricos
Para o fim ficou a sericaia de baunilha com ervas do nosso quintal, flores e gelado de pimenta timut. Há mais cinco na carta de pastelaria, assim como os queijos portugueses, a fruta, os gelados e os sorvetes caseiros.
Se tivermos em conta que o queijo de Azeitão é proveniente da Península de Setúbal e o leitão assado é uma receita da Bairrada, região localizada na região centro. O xarém, legado mourisco feito com farinha de milho, permanece no receituário algarvio. Já o paio utilizado no prato do pregado é do Alentejo, assim como a sericaia – ou sericá –, receita defendida por muitos como sendo conventual e tipicamente alentejana.
“Se temos produtos de qualidade a ser produzidos, é importante que o reconheçamos e dêmos o devido valor.” Chef Henrique Mouro
Podemos dizer, então, que esta amostra da cozinha praticada pela dupla Henrique Mouro – de 43 anos e com raízes alentejanas – e Pedro Rezende – de 37 anos e cuja família é proveniente de Trás-os-Montes – é uma confortável viagem pelo nosso país. Ao contrário do que acontecia há cerca de duas décadas: “nessa altura, em termos genéricos, estávamos mais voltados para fora.” Agora “estamos mais focados no nosso país, nas tradições”, analisa o chef Henrique Mouro. Por isso, os produtos utilizados na actual cozinha do Bica do Sapato são maioritariamente portugueses, “mas não obrigatoriamente”, sublinha. Mesmo assim, faz questão de frisar: “se temos produtos de qualidade a ser produzidos, é importante que o reconheçamos e dêmos o devido valor.”
O melhor é ir e desfrutar. Bom apetite! •