Há um ancoradouro gastronómico na foz do Douro

O norte é mais conhecido pelas águas frias e agitadas do Atlântico mas na Foz encontramos um porto seguro à mesa.

A poucos metros da foz do Douro, um dos rios mais irrequietos da Península Ibérica, atualmente mais domado pelas barragens, no número 236 da avenida Montevideu, entramos na Casa Palaciana. Lá dentro no antigo salão de baile, deixamo-nos embalar pelos cheiros da maresia e viajamos pelos sabores da cozinha portuguesa. O timoneiro chama-se Arnaldo Azevedo, o mesmo que no final de 2014 nos dizia que “Cozinheiros seremos toda a vida, chefs podemos vir a sê-lo ou não”.

Habituado a estas andanças desde sempre, nasceu dois anos depois dos pais terem aberto o restaurante de família e por lá deu os primeiros passos. “Comecei muito cedo a servir às mesas nas férias da escola, no verão.” Ajudava a mãe, enquanto o pai cozinhava. Da sala para a cozinha foi um salto. Mais tarde, conciliou a experiência empírica com um curso de cozinha de três anos na Escola de Hotelaria e Turismo de Santa Maria da Feira.

Depois de várias viagens entre o Algarve e o Porto – Hotel Sheraton Pine Cliffs, em Albufeira, Mesa, no Porto, Amadeus, em Almancil e Palco, restaurante do antigo Hotel Teatro, no centro do Porto, atraca em 2019, no Vila Foz, mesmo em frente ao mar.

Sanduíche de rabo de boi

As boas-vindas são uma introdução ao que vamos encontrar num menu de homenagem ao mar, com sabores da costa bem vincados, como no tártaro de atum com caviar, no lagostim, no lírio dos Açores curado e, em particular, no berbigão à Bulhão Pato intercalados com incursões da terra na sanduíche de rabo de boi e na terrina de foie-gras com enguia fumada.

Lírio dos Açores curado

Os snacks tiveram como companhia o espumante Chardonnay Colinas Cuvée Brut Mature 2016, da Bairrada, e Santiago na Ânfora do Rocim 2021, um Alvarinho da Quinta de Santiago, da Região Demarcada dos Vinhos Verdes.

O objetivo é homenagear o mar

Aqui, no restaurante Vila Foz, podemos encontrar dois menus anuais: o Maresia e o Novo Mundo, um menu vegetariano. Disponíveis de fevereiro a dezembro, são objeto de ajustes pontuais, com a mudança de alguns ingredientes ao longo ao ano. Na carta de vinhos as alterações são mais frequentes.

Ostra
Carabineiro
Linguado

No menu Maresia, como o nome indica, prevalecem os sabores do mar. A ostra, o carabineiro – Giz Vinhas Velhas branco 2021, Bical e Maria Gomes da Bairrada para ambos – e o linguado – Quinta do Monte D’Oiro Reserva branco 2021, um Viogner da região dos Vinhos de Lisboa – compõem o trio inicial. Acompanhados de legumes e com molhos que vão do aipo ao caril, mas sempre com aromas e sabores marítimos intensos.

Feijoada de lulas e bivalves


Seguiu-se o momento em as sensações gustativas estiveram mais alinhadas, no que diz respeito à unanimidade da mesa, com os sabores da lula e dos bivalves envolvidas no molho de feijoada e a casarem na perfeição com O Fugitivo Bastardo 2019, da Casa da Passarella, vinho da Região Demarcada do Dão. Incrível a transformação do Bastardo com o prato!

Polvo, alho francês, batata doce e molho bordalês


Inspirado na cataplana de polvo de Aljezur, o polvo com batata doce da mesma terra e molho bordalês, feito com base de carne e vinho tinto. Este prato é uma novidade que veio substituir um dos pratos de carne da ementa do restaurante. Acompanhou com o mesmo Fugitivo.

Wagyu, couve flor, miso e cogumelos


Para terminar os principais, o único prato de carne, Wagyu A5 apresentada no ponto certo e com um molho extraordinário. Acompanhou com Vinha dos Amores Touriga Nacional 2017, da Casa de Santar, também da Região Demarcada do Dão, que podia estar com os taninos um pouco mais aveludados, para ser sublime a combinação.

Chocolate, caramelo, café e especiarias


O pospasto, precedido de uma “folha” de maçã verde em água de pepino, é um algodão doce com chocolate, caramelo, café e especiarias. Combinou com um Tawny Colheita 1998, da Kopke.

Para aqueles que estão bem familiarizados com os aromas e sabores da cozinha de tacho portuguesa é este o fio condutor deste menu sem grandes agitações. Para os menos acostumados é uma excelente oportunidade de sentir a diversidade da cozinha da nossa costa. 

Uma nota para o espaço, de pé direito bastante elevado é um imponente salão de baile que deve ter assistido a grandes festas da alta burguesia portuense. De traça original, mantém luxuosos pormenores arquitetónicos e decorativos do século XIX. Sala confortável, mas que poderia ser um pouco mais intimista com uma iluminação mais focada nas mesas.

Vale a viagem. Aproveite para relaxar num dos quartos e acordar com o mar à vista. O Vila Foz Hotel & SPA é membro da Design Hotels e o restaurante conquistou, pela primeira vez, uma Estrela Michelin em 2021, a qual tem vindo a conquistar, pelo menos, até 2023. O design de interiores é de Nini Andrade Silva, com quem conversámos há uns anos, e que poderá ler aqui.

+ Vila Foz
© Fotografia João Pedro Rato

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