Quem o diz é Nuno Mendes. O chef português e o autor deste livro cheio de receitas que nos convidam para um saboroso roteiro pelas cozinhas reunidas à(s) mesa(s) da capital do nosso país.
Nascido em Lisboa, em 1973, Nuno Mendes apresenta uma Lisboa muito diferente daquela que deixou aos 19 anos. Na altura, o sonho de se tornar Biólogo Marinho levou-o a viajar até ao outro lado do Atlântico, onde acabou por descobrir a sua verdadeira vocação: ser cozinheiro.
A súmula deste início de vida pode ser lida aqui para, depois saltar, novamente, para este texto sobre o “Lisboeta”. O livro que “começou com uns rissóis de camarão” cuja confecção partilhava, no momento, com a mulher, Clarisse. Ao fazê-los pensou na avó, “na cozinha da minha avó”. Ao comê-los decidiu mostrar ao mundo o património que temos à nossa mesa.
“Lisboeta é uma carta de amor a Lisboa”, começa Nuno Mendes. “As receitas não são tradicionais, porque não tenho a capacidade para ter esse papel”, reforça o autor aquando da apresentação, na Livraria Leya na Buchholz, na capital portuguesa. Mesmo assim, não deixa de conter um receituário de tempos idos marcadamente presente nesta dedicatória à sua cidade-berço, onde “a maior inspiração são, na realidade, as minhas memórias e um pouco o meu passado. Por isso, quis visitar as pastelarias, as tascas, os restaurantes que conhecia. “Quis matar saudades.” Objectivo do livro? Despertar as nossas memórias e levar a sua para Londres.
Após a introdução histórica e pessoal sobre a cidade, Nuno Mendes reparte as Notas dos Cozinheiros pelos ingredientes – com destaque para o Queijo da Ilha, que pode ser produzido em qualquer uma das ilhas do arquipélago dos Açores, sendo o Queijo de São Jorge produzido na Região Demarcada do Queijo de São Jorge de acordo com a regulamentação do registo de Denominação de Origem Protegida (DOP) – e as técnicas.
Agora, sim, viajemos com o chef. Comecemos com os pastéis, os hábitos associados a tão doce companhia de um café matinal, por exemplo. Seguem-se as oito receitas, com especial destaque para o Jesuíta, o preferido de Nuno Mendes, e o pastel de nata, o ex-líbris de Lisboa.
Os salgados também obedecem a critérios de gosto muito à conta de quem os elege em detrimento dos doces. Neste compêndio cabem 11 acepipes, entre pastéis de bacalhau, peixinhos da horta, croquetes de carne, pastéis de massa tenra e rissóis de camarão, para forrar o estômago entre a primeira refeição do dia e a seguinte.
O almoço continua a ser, por sua vez, a hora sagrada do dia, para dar ao dente. No entanto, os hábitos de antigamente foram-se perdendo na história de uma Lisboa repleta de tascas. Aos nosso olhos sobressaíram a sopa de cebola à antiga portuguesa e o caldo verde, só para começar! O polvo à lagareiro com batata a murro, a meia-desfeita, o bacalhau à Gomes de Sá, o bife à café ou a feijoada à transmontana são alguns dos 20 pratos a (re)fazer.
A meio da tarde já apetece um petisco, “comida de convívio” preparada para partilhar. Do arroz de grelos à salada de orelha de porco, ficam o atum de cebolada, a salada de polvo com tomate, o pica-pau ou a sapateira recheada, além dos 14 em falta. São “petiscos ligeiramente mais requintados do que o que poderá encontrar numa tasca normal” estes que o chef português propõem no seu livro.
A vintena de pratos continua na secção do jantar. Aqui, Nuno Mendes escreve acerca deste momento do dia, dos pratos adoptados – e adaptados – pelos chefs de cozinha portugueses, com particular ênfase nas regiões de Trás-os-Montes e do Alentejo. Esta última influencia bastante a cozinha do autor do livro ou não fosse a sua família proveniente de terras além Tejo. “Há duas gerações atrás ninguém era de Lisboa”, afirma. Assim, a viagem torna-se ainda mais rica, com o arroz de marisco, o bacalhau à Brás, a caldeirada, a chanfana, o arroz de pato ou o frango na púcara. Um regalo para os apreciadores de comida de tacho.
Vamos à sobremesa? Os ovos são, salvo raras excepções, o principal ingrediente de tão gulosa parte das nossas refeições. Deixamos alguns dos 11 doces exemplares da nossa infância para acicatar o palato, como o arroz doce, o pão de ló, as farófias ou o bolo de bolacha.
Mas o “Lisboeta” não termina aqui. Há ainda uma lista e nove propostas de sandes para preparar e comer sempre que o corpo pedir, inclusive o bolo do caco e a tão apreciada broa.
No fim, os leitores são presenteados com um mapa de Lisboa, onde estão localizados os cafés, as tascas, os restaurantes, as mercearias e os bares preferidos do chef Nuno Mendes. Pelo meio há estórias para explorar.
Relembramos que o chef português radicado, há 15 anos, em Londres – onde começou com o The Loft Project e o restaurante Viajante, prosseguiu com a Taberna do Mercado e tem o Chiltern Firehouse e, o mais recente, Mãos –, está prestes a concretizar aquilo que, talvez, pudéssemos chamar de sonho: regressar à sua cidade-natal.
Se regressar aqui , no final pode ler “Adoraria fazer qualquer coisa em Portugal até certo ponto… O projecto certo, no sítio certo e na altura certa.” Desta feita, Nuno Mendes será o chef criativo do BAHR, o novo restaurante do Bairro Alto Hotel, com inauguração prevista para Abril de 2019.
Só para fechar, fica o desafio aos leitores deste “Lisboeta”: “Quero que as pessoas levem este livro para a cozinha”.
Bom trabalho e bom apetite! •