Tertúlia é sinónimo de cozinha de matriz regional, ponto de partida para uma viagem por outros cantos do mundo, mas que depressa regressa a casa, para gáudio dos demais apreciadores da comida de conforto.

O chef Henrique Ferreira e o escanção José Cardoso são os pilares do restaurante Tertúlia, localizado em Nelas, na Região Demarcada do Dão
“Trabalhamos para uma comunidade, para uma região”, diz-nos Henrique Ferreira, chef do Tertúlia, restaurante instalado no Puro Dão Hotel & Spa, localizado em Nelas, e cuja responsabilidade é partilhada pelo escanção José Cardoso. De portas abertas desde agosto de 2023, este espaço recebe produtos comprados “o mais localmente possível”, continua o nosso anfitrião. Fala ainda sobre os carolos de milho, utilizados na culinária deste território beirão, as plantações deste cereal e “as pessoas que estão a recuperar moinhos de água no rio Mondego”, para se voltar a dar utilidade às mós. “Em Santar há três fornos comunitários, dos quais um está a funcionar”, acrescenta, no qual é feita broa de milho, pão de mistura e pão de centeio.
Da ementa do Tertúlia, Henrique Ferreira destaca o coelho à Mirra, o recheio das chamuças, uma das sugestões de entrada da referida lista. É uma receita das freguesias de Santar e Casal Sancho, ambas pertencentes ao concelho de Nelas. A confecção deve-se ao Sr. Mirra, “um bom caçador da região”, declara o chef, que, de certa forma, iniciou este percurso na cozinha no início da juventude. Deve esta missão ao avô, proprietário da Quinta das Mestras, onde tinha um espaço privado, reservado apenas a amigos, a que chamava de Tertúlia.
O coelho à Mirra vem desse tempo de partilha à mesa, o qual era marginado em vinho tinto, cominhos, cravinho, tomilho, e não só, submetido a um estufado, ao qual o avô acrescentava a água onde tinha sido cozido o feijão frade. Mas outros pratos preenchem as memórias beirãs, com ligeiros desvios para outras latitudes, ou não fosse este um restaurante frequentado pelos locais.
Sem mais delongas, foram servidas as croquetas de vitela e maionese de trufa, seguindo-se a massada de garoupa, amêijoa e coentros. Em substituição do arroz carolino do Baixo Mondego, míscaros, vitela Arouquesa e agrião, prato confecionado para o almoço de 12 de novembro, na Quinta dos Carvalhais, o chef Henrique Ferreira optou por vazia de Black Angus, risotto de cogumelos selvagens e alecrim. O prato e peixe e o de carne tiveram a casta Encruzado como companhia, a qual se expressou de formas diferentes no copo – seja pela elegância do Quinta dos Carvalhais Encruzado 2022, seja pela maior complexidade sentida no Quinta dos Carvalhais Especial branco Edição n.º 7.
Comida à parte, o vinho detém igual importância no Tertúlia. Há mais de 300 referências, algumas das quais estão expostas na garrafeira disposta no lado oposto da escadaria de acesso ao restaurante. No fundo, é palco dos vinhos da região vitivinícola do Dão, trabalho desenvolvido pelo escanção José Cardoso.
Bom apetite!