De armazém datado do século XVIII e de casa senhorial da Taylor’s passou a um hotel icónico, tal como o Vinho do Porto Vintage, no coração do Douro vinhateiro.
De olhos postos no rio Douro, o Hotel Vintage House, no Pinhão, concelho de Alijó, é uma verdadeira alusão a uma colheita de qualidade excecional, requisito primário para a escolha do lote com que é feito um Vinho do Porto da categoria Vintage e, em simultâneo, a jóia da mais antiga região demarcada do mundo dotada ainda do traço de uma casa senhorial de tempos que já lá vão.
Apesar da reconstrução e remodelação da casa ter sido iniciada em 1996, o hotel foi inaugurado a 4 de julho de 1998 e, um ano após aquele que foi um dos melhores anos da Taylor’s, com o Vintage clássico de 1997 envelhecido em garrafa, ou o ano sobre o qual há registo do Vintage 1998 Quinta de Vargellas, a qual pertence à Taylor’s entre 1893 e 1896 (leia a reportagem sobre a Quinta das Vargellas aqui).
Cerca de duas décadas após o erigir deste oásis no Douro, o Hotel Vintage House regressa, em outubro de 2015, à The Fladgate Partnership (leia tudo sobre este grupo aqui), empresa familiar detentora da Taylor’s (leia sobre o Centro de Visitas da Taylor’s aqui), Croft, Fonseca e Krohn. Cinco meses passaram e eis que o emblemático hotel vínico reabriu as portas em março do presente ano.
Testemunho de que o tempo é o melhor aliado para um estágio que muito bem poderia ser em garrafa, esta unidade hoteleira é uma constante homenagem ao “ouro do Douro” – numa alusão às palavras de Adrian Bridge (leia a entrevista aqui), CEO da The Fladgate Partnership, quando se refere ao Vinho do Porto –, mas também a muito do legado de Baco produzido nesta região vinhateira, o qual está inscrita na carta que se encontra sob a responsabilidade de Beatriz Machado, a diretora de vinhos dos agora três hotéis do grupo – The Yeatman, em Vila Nova de Gaia, Infante Sagres, na cidade do Porto, e Hotel Vintage House.
A receção, assim como todas divisões do hotel, é privilegiada com a vista para o Douro
Mas antes de passarmos à mesa do Rabelo, comecemos pela receção. Outrora disposto a meio do hotel, o espaço onde os hóspedes eram recebidos é, hoje, na antiga loja, então ornamentada por três tonéis e outros dois incrustados na parede. Da totalidade destas imperiosas vasilhas de aduelas onde repousara o Vinho do Porto sobra a dupla que ornamenta a parede oposta à entrada tendo, o trio já inexistente, dado lugar a quatro varandas com os olhos postos no rio Douro e, ao mesmo tempo, concedem a luz natural às quatro paredes revestidas de azul cobalto ornamentadas de vetustos quadros da família. Na decoração, as peças decorativas e de mobliário dispostas minuciosamente em cada lugar conferem a categoria vintage a que se circunscreve mui elegante espaço, dando as boas vindas a quem anseia por umas tão merecidas férias, quer para descansar, quer para tomar este como o ponto de partida para uma aventura vínica pela região vinhateira.
Subamos. Sobre a receção, onde antes eram as salas de reuniões e conferências do hotel, hoje são enormes suites que, à semelhança dos demais aposentos, têm vista rasgada para o rio e são dominadas pela luz do sol e pelos tons suaves, assim como pelo décor clássico típico de uma casa senhorial, mas refrescante, e requintado, como um Vintage.
O pequeno-almoço quer-se revigorante e aconchegante logo pela manhã
Se o mote é o pequeno-almoço, desçamos da receção para o piso mais abaixo, o Salão Rio, amplo e delicado. Num buffet são escolhidos os produtos a compor o primeiro repasto da manhã, a degustar no interior da sala ou ao ar livre, na varanda corrida em frente ao rio que passeia, sereno nestes dias de estio, entre montes a emergir de repente quão gigantes são. Eis o momento perfeito para contemplar uma paisagem fora de série, ornamentada pelos socalcos cuidados nas linhas traçadas em redor de cada monte e pelas curvas sinuosas de um rio, em tempos tido como feio e apressado demais, e brindada pelo sol e pelo silêncio.
Os recantos sombreados convidam à preguiça nos dias soalheiros
E é o silêncio que remete para o descanso no jardim, também ele intervencionado aquando a recente remodelação a que o Vintage House foi submetido, o qual se encontra predominantemente verde e nos encaminha à piscina, ora pela escadaria do terraço em frente ao restaurante do hotel, ora pelo caminho aberto entre as viçosas palmeiras que preenchem este recanto de um exotismo especial.
O Library Bar conjuga a bebida à leitura num espaço revisitado
Mergulhemos, pois banhar os pés na água não chega nos verões abrasadores típicos do Douro para, depois, preguiçar nas preguiçadeiras dispostas em redor da piscina e refrescar com um cocktail do bar junto à mesma. Ou jogar ténis no campo contíguo a este espaço, ou pôr a leitura em dia, ação benfeitora para a alma, até porque são muitos os recantos com sombra que preenchem o jardim e o terraço contíguo à parte da casa que acolhe o Rabelo e o Library, o bar cuja decoração testemunha o alinhamento vintage do hotel, com peças de mobiliário antigas e outras recuperadas, uma lareira adormecida, a aguardar a chegada dos dias frios do Douro, e um fresco pintado na parede onde, antes, estivera uma escada em forma de espiral, com acesso ao primeiro piso, e onde permanecem duas colunas de granito possantes, testemunhos do passado que rimam com os barrotes de madeira que atravessam o teto de lés a lés.
Do lado de lá, ao fundo, está a sala de estar perfeita para dois dedos de conversa.
Em troca do livro e do descanso há a Academia do Vinho, com cursos de vinho, a experiência do Vinho do Porto, com reserva na sala de estar da receção ou no Library Bar, e provas de degustação, as quais desafiam a experienciar combinações entre produtos e vários tipos de Vinho do Porto. Mas não só. Há, por exemplo, a Quinta da Roêda, a cerca de 15 minutos de distância, um passeio aprazível nos dias amenos, razão pela qual obriga a uma ida de automóvel sempre que os termómetros teimam a passar os limites do “quente”, a qual faz parte da Croft – uma das marcas que a The Fladgate Partnership detém (leia a reportagem sobre a quinta aqui) – e poussi um Centro de Visitas que vale a pena descobrir – e que já tem traçados planos para um futuro próximo.
Com a cozinha na proa
As paredes do restaurante Rabelo contam as histórias do Douro vinhateiro
Chegada a hora do repasto, o terraço é o lugar eleito para desfrutar, em simultâneo, da comida e da paisagem traçada pela natureza, e pelos homens e pelas mulheres do Douro. Sob um teto dominado pelo verde da planta trepadeira, é servido o almoço e o jantar trazidos da cozinha contígua ao restaurante Rabelo, nome alusivo ao barco que, no passado, transportava as pipas de Vinho do Porto pelo rio, desde as quintas durienses aos armazéns, em Vila Nova de Gaia, momentos retratados nos frescos originais que ornamentam as paredes deste espaço.
O bacalhau sob um preparado à Gomes de Sá e uma capa de pimentos assados
Com uma cozinha que se quer mais portuguesa, o restaurante está nas mãos de João Santos, nascido em Trás-os-Montes e que, desde 1998, desempenha as funções de chef no Rabelo. Desde as sete entradas – com o creme de couve-flor e azeite de de coentros ou o lombo de atum grelhado com carpaccio de mão de vaca – às sobremesas assinadas, por sua vez, pelo chef pasteleiro Paulo Lopes Rodrigues – com o Douro velvet e gelado de baunilha (uma recriação do borrachão, bolo típico do Pinhão), a tarte de amêndoa com guimauve de menta e refresco de limão ou pudim abade de Priscos com granizado de frutos vermelhos.
Pelo meio, o chef João Santos sugere dois pratos vegetarianos – risotto de tomate e manjericão e salada de frutos e legumes –, os pratos de peixe (quatro ao todo), com o bacalhau sob um preparado à Gomes de Sá e uma capa de pimentos assados ou o robalo em ratatouille de gambas, legumes baby crocantes e creme de amêndoa.
O cordeiro de leite com batata ralada, feijão verde e molho de lentilhas e anis
Na carne, uma lista composta por quatro pratos, destacamos o peito de pato com risotto de cenoura e rebentos de verduras ou o carré de cordeiro de leite com batata ralada, feijão verde e molho de lentilhas e anis.
A recriação do borrachão, o bolo típico do Pinhão, acompanhado com gelado de baunilha
Terminado o repasto, nada melhor que uma revigorante sesta após o almoço, mas não sem antes traçar um roteiro pelo Douro vinhateiro com tanto para explorar; ou um passeio noturno pelas redondezas do hotel, na pacatez do Pinhão.
Boa viagem! Até porque para rumar ao Pinhão pode fazê-lo de automóvel, de barco ou de comboio. Afinal, o acesso à estação local é feito a partir de pequeno terraço do Hotel Vintage House. •